Mudanças Experimentais na Regra

EvoluçãoRegraIVFonteSet de 21 pontos (deu no Terra, 27/11/2013)

Para a temporada 2013/2014 da Superliga, a Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) anunciou mudanças no intuito de melhorar a exposição e a receptividade desta competição ao público. A principal alteração é polêmica: jogos com sets de 21 pontos.

A decisão foi tomada com a anuência da Federação Internacional de Vôlei (FIVB) – há interesse da entidade em transformar essa experiência em regra em um futuro próximo. O objetivo é reduzir o tempo de jogo, o que facilitaria a inserção da modalidade nas mais variadas mídias – principalmente a televisão. O assunto divide opiniões entre atletas e treinadores, o que ficou claro no evento de lançamento da Superliga, na quinta-feira, em São Paulo. Bernardinho, por exemplo, atual campeão da Superliga feminina como técnico do Unilever, propôs que haja limitação do tempo entre o final das jogadas e o saque seguinte – tempo usado para comemoração, reclamação, limpeza de quadra e ações que não fazem parte do jogo efetivamente. A fórmula foi testada recentemente no Campeonato Paulista, mas a CBV não se pronunciou oficialmente com avaliação do ocorrido.

Superliga tem set de 21 pontos

A temporada 2013/2014 da Superliga de Vôlei chega à sua 20ª edição. São 7 meses e 20 dias de disputas com muitas novidades: equipes que deixaram de existir dão lugar a clubes recém-criados, antigos ídolos que voltam ao Brasil tomarão parte na disputa e, principalmente, a existência de sets de 21 pontos.

Comentários

  • Quebrou a estrutura do jogo, e eu particularmente estou tendo muita dificuldade para me adaptar a isso. (Marcos Pacheco, técnico do time masculino do Sesi)
  • Não sabemos ainda como vai ser, se bom ou ruim, estão todos esperando. Preferimos esperar o campeonato começar para opinar melhor (Gabi, ponteira do Unilever)
  • Há uma disputa muito grande para outros eventos esportivos nas grades de programação das televisões. Estamos em um caminho de manter o que já se conquistou, mas certamente é um passo importante para obter mais espaço ainda, uma vez que estamos nos adaptando às necessidades dos veículos de comunicação. (Renato D’Ávila, superintendente da CBV)

Além desses, inúmeros internautas se manifestaram no sítio do Terra revelando suas opiniões e sugestões. Quanto à sugestão do Bernardo de encurtar o tempo entre o término de um lance e o saque seguinte, há que se considerar que é um tempo inclusive sugerido pela Tv para que o público seja esclarecido ou reveja o lance precedente ou qualquer outro que tenha gerado dúvidas. Durante os pedidos de tempo, as orientações passadas aos atletas, ou até mesmo caras bonitas e feias, gestos estapafúrdios desse ou daquele indivíduo presente ao espetáculo. Tudo para emprestar ao jogo uma visibilidade alegre e descontraída e, claro, reter a audiência do público da poltrona. E, especialmente para que o atleta que se dirige para efetuar o saque tenha algum tempo de recuperação física para concentrar-se e efetuar o saque. Creio que de posse da bola, a Regra permite seis segundos para a sua efetivação.

Valor da Tv… Para aqueles que fazem restrição ao televisionamento das partidas, lembro a verdadeira batalha que Carlos A. Nuzman empreendeu nos anos 1980 para efetivar a Tv junto ao voleibol. Dizia para um desafeto que se manifestou contra o horário de jogo de sua equipe (Flamengo) colocado para as 22 horas com o argumento que poucos estariam presentes. Disse-lhe Nuzman: “A transmissão da Tv é para um número incalculável de espectadores”! Além disso, e principalmente, a garantia para os patrocinadores verem suas marcas divulgadas pelo mundo. Já houve tempo em que a própria CBV bancava o televisionamento das partidas. O público presente, muito pouco, talvez amigos, namorados(as), parentes. Após o acerto com a Tv Globo, as coisas mudaram para melhor, com melhores espetáculos. Não se entende como alguns se colocam contra!

História do Voleibol no Brasil

 a) Um dos comentários de internauta no Terra sugeria que o set tivesse uma medida de tempo. Lembro que houve experiência no vôlei de quadra denominada tentativas de saque: o atleta tinha duas oportunidades para a realização do serviço; se lançasse a bola ao alto de forma equivocada poderia interromper o movimento e realizar a segunda e derradeira tentativa. Não logrou êxito. Até mesmo havia medida de tempo para os sets e os jogadores utilizavam as tentativas de saque estrategicamente para passar o tempo, além de lançar as bolas exageradamente altas. (extinção em 1988).

b) No vôlei de praia a CBV experimentou sets por tempo, inclusive exibindo um relógio que cronometrava imperturbável todas as partidas. A Regra dizia que o jogo terminava em determinado número de pontos ou em tantos minutos, aquele que ocorresse primeiro. Não aprovada.

Comentário do Procrie

Por ser o fato mais importante, vamos nos ater ao aspecto principal, ou seja, set de 21 pontos.

A FIVB constantemente promove estudos na mudança das Regras sempre no sentido de tornar o jogo mais atraente para o público, além de preservar a integridade física dos competidores. Inadvertidamente, alguns internautas não leram com atenção a íntegra do texto, exatamente no que diz: (…) há interesse da entidade em transformar essa experiência em regra em um futuro próximo. Dessa forma, trata-se de uma experiência que, examinados e considerados prós e contras, poderá vir a ser ou não concretizada. Como a entidade internacional tem por norma somente alterar as Regras do jogo quando do encerramento do ciclo olímpico, não há motivo imediato para pânico ou apreensões por parte de técnicos e jogadores. Observa-se, em geral, que a preocupação recai na novidade e, portanto, os testes domésticos ditarão os próximos comportamentos.

Chamo a atenção para detalhes preciosíssimos: o tempo de duração da partida e a preparação técnica e tática dos jogadores. O primeiro deles com ênfase na integridade física dos atletas. O outro, despertando a necessidade de melhor apuro nos treinamentos, pois afinal não se diz que ganha quem erra menos? De que forma, então, estes aspectos se revestem de importância? Não nos envolveremos em considerações científicas, mas somente em generalidades que possam realçar os aspectos a seguir.

1. Físico – Seria racional supor-se que tendo o placar encurtado, o tempo de duração das partidas também será diminuído. Exceto, e isto poderá ser revisto e levado em consideração, nos casos de igualdades no marcador e a consequente necessidade imposta pela Regra de dois pontos de diferença para vencer um set. E muito mais importante, são 7 meses e 20 dias de disputas. Acrescente-se a isto as interrupções para participação em compromissos internacionais de nossas seleções. Haja fôlego! Não é à toa que as meninas estão chiando pelo excesso de jogos, viagens internacionais, poltronas em avião etc., a exemplo dos rapazes do futebol.

História do Voleibol no Brasil

c) Em 1992, nas Olimpíadas de Barcelona, a partida válida pelas semifinais masculina entre Holanda e Itália foi decidida no quinto set com o placar de 17 a 16 em favor dos holandeses. Os italianos entraram com uma representação junto à Fivb para alterar a Regra que naquele tempo limitava os sets em 17 pontos (foi criada após as Olimpíadas de Seul, 1988). Acrescente-se que graças ao desgaste físico e emocional dos holandeses não foi tão difícil no dia seguinte a equipe brasileira sagrar-se pela vez primeira campeã olímpica. Vale dizer também que em ambas não fora implantada a Regra de pontos por raly, muito embora os sets fossem disputados em 15 pontos.

d) A partir de 1995 – Nos quatro primeiros sets foram criados dois tempos comerciais (para Tv): no 8° e 16° pontos, só contando efetivamente das Regras em 1999 . 

e) Em 1976, nos Jogos Olímpicos de Montreal, Polônia e URSS realizaram o jogo mais longo na história do voleibol – 4h 36min – com a vitória sorrindo aos poloneses. (sets em 15 pontos e dois pontos de diferença, não havendo limites)

f) A partir de 1997 – A partir desse ano foi testado o jogo com o líbero; sua aprovação e inclusão nas Regras deu-se somente em 1999.

g) A partir de 1999 –  Têm início as experiências com o sétimo jogador, o líbero, um jogador especial.

 2. Apuro no treinamento – Para um observador desapaixonado que assiste a uma partida com olhos de ver, o voleibol não parece muito atraente quando confrontado especialmente com o futebol. Estaria mais para o basquete. Lembro-me de um cronista que revelou sua impressão de forma categórica: “Deveriam mudar a regra do basquete; as equipes jogariam somente um minuto e o placar inicial seria de 100 a 100”. Torna-se fácil concluir que o jornalista não encontrava motivos para assistir toda a partida, mas somente o minuto final, que se reveste de emoções e cenas inusitadas. No voleibol moderno não é diferente, especialmente para quem presenciou o único momento histórico de sua maior evolução com o Espetáculo de Matsudaira no apogeu do Japão, que teve início no setor feminino durante o Mundial do Brasil em 1960 (vice-campeãs), quatro anos após com o pódio mais alto nas Olimpíadas de Tóquio, e a consagração dos rapazes em 1972, em Munique. Esta olimpíada marca também um fato que interessa a todos os atletas: processou-se a estreia do Sistema Olímpico no voleibol: chaves de classificação com cruzamento dos vencedores para a fase final. Sacrifica menos os atletas, pois diminui o número de jogos entre os participantes. Para se ter uma ideia, no Mundial de Paris (1956) o Brasil foi o 11º colocado no masculino, só tendo perdido uma única partida, para a China, ainda na fase classificatória (História do Voleibol no Brasil, 2º vol.). Atualmente, o calendário internacional que só afeta atletas selecionáveis, é estafante, pois impõe períodos de treinamento, longas viagens por diversos países, jogos quase que diários, fusos horários, afastamento de familiares etc.  

3. Líbero e o atacante de meio – Por que o líbero, invariavelmente, entra no jogo sempre no lugar dos atacantes de meio? Por que ele, o líbero, é um jogador especial? Sua gênese recai na necessidade percebida pelos responsáveis técnicos da Fivb de tentar dar equilíbrio ao jogo, isto é, uma tentativa de ampliar as condições de defesa e assim nivelar as ações de ataque e defesa. Que consequências emocionais e físicas pode-se arrolar sobre o comportamento do atleta atacante dado o tempo em que está fora do jogo? Dado que o líbero é um jogador especial, é de se supor que seja excelente passador (recepção de saque) e não menos perito em defesas. Ele é normalmente a antítese do central a quem substitui sistematicamente na posição de saque (I), pois ao contrário, o central é falho em defesas e recepção, prejudicado por sua altura, quase sempre acima dos 2m. O atual gigante russo Dmitriy Muserskiv, p.ex., tem 2,18m.

O leitor certamente entenderá que os jogos se processam da mesma forma em qualquer parte do mundo – as Tvs nos mostram a todo instante – inclusive onde se disputam os campeonatos mais caros do planeta, na Itália. Isto é bastante significativo para que os experientes técnicos da Fivb sejam concitados a mudar algo para manter o público cativo e as mídias interessadas. Se for interessante para a Tv, que cria fonte de receitas, mais ainda será para o grande público muitas vezes impossibilitado de frequentar os ginásios e, principalmente, para os patrocinadores das equipes. Chegou-se a um ponto que qualquer desporto profissional para ser bem organizado não pode prescindir das transmissões televisivas. E as receitas que geram, que justificam certas alterações nas Regras.  

Comparativamente ao futebol, o vôlei tem contra dois aspectos para os quais chamo atenção: é mais pobre em combinações táticas, por isto é repetitivo e não uma caixinha de surpresas; e não possui a tradição e carisma dos tradicionais clubes, haja vista o que se contém lá acima: “as novidades são as equipes que deixaram de existir dando lugar a clubes recém-criados e antigos ídolos (provavelmente às vésperas da aposentadoria) que voltam ao Brasil”. Isto faz com que os dirigentes se esmerem em criar atrações paralelas que mantenham o interesse do público presente aos ginásios e nas poltronas de suas casas. 

Como NÃO errar!

Uma providência que se percebe é referente ao emprego do saque violento com salto. Como todos jogam da mesma forma, a tendência é que os possíveis efeitos de má recepção sejam atenuados, ou mesmo, passaria a tratar-se de uma questão de “custo x benefício”, isto é, vale à pena sacar dessa forma? Até que ponto? Em que circunstâncias? Pelo que estamos assistindo recentemente nos jogos masculinos a tendência é de em alguns momentos da partida o emprego do chamado saque tático (ou chapado, ou balanceado), quase sempre curto, i.e., entre o adversário e a rede. Já vimos a seleção brasileira (creio que na Itália) atuar durante todo o 4º set sacando dessa forma, tal o número de erros nos sets anteriores. E deu certo!

Saque beneditino

Esta é somente para os mais velhos, que conheceram Benedito Silva, o Bené. Ele jogou em uma época que ainda não se sacava por cima, isto é, tipo tênis, que só teve larga difusão no Brasil a partir da década de 50. Em relação ao saque tático, este era empregado em duas situações: provocar o erro do adversário que tinha maiores dificuldades na recepção (por toque), e criar um problema de ataque quando efetuado na chamada zona morta da quadra, ou seja, na posição II, de saída de rede. No Brasil, os paulistas deram verdadeira aula durante um campeonato brasileiro. Vale lembrar aos mais novos que, à época as equipes atuavam no sistema 3 x 3, três levantadores e três cortadores, considerando-se ainda, que não havia a troca de posições dos atletas na rede.

Saque-CANHOTO E DESTRO
Ilustração: Beto Pimentel.

Em relação aos dias atuais, o saque tático não importa como seja efetuado, existe para nós uma característica fundamental: quanto mais próximo da linha central a bola decaia, mais dificuldade gera para o adversário, se possível, o mais próximo das antenas. E mais problemas vai gerar na equipe adversária na posição em que o seu levantador esteja entrando na rede (posição IV) ou mesmo na saída (em II). O difícil é sacar junto à rede para que a bola caia o mais próximo da linha central, sacando tipo tênis, chapado, pulando ou de qualquer forma. Só conseguimos ter eficiência nesse mister sacando por baixo (como nos primórdios do vôlei) e, ainda assim, tocando a bola por baixo, nunca em seu ponto médio. Explica-se: a trajetória da bola deve ser um pouco mais alta do que a rede, com leve curvatura em ascensão e pouca força para que caia praticamente na vertical, coisa que não se consegue com qualquer outra forma de sacar. 

Conclusão

Após esse passeio pelo história despertando curiosidades sobre fatos que marcaram muitos momentos, percebemos  que o esporte não deve permanecer estático, mas evoluir no sentido de torná-lo mais agradável e ser consumido pelo grande público, inclusive motivando-o para a sua prática desde cedo. A competição é contra o futebol, o primeiro no Brasil, mas considere-se que as mulheres praticantes tendem a amenizar essa grande diferença, além de embelezar e tornar agradável seus espetáculos.

2 comentários em “Mudanças Experimentais na Regra

    1. Prezado internauta,
      Gostaria muito de ter uma versão em inglês para este Procrie. Inclusive, uma versão também do livro História do Voleibol no Brasil, inédito, sugerida por um amigo residente nos Estados Unidos. Contudo, sou analfabeto em inglês e já me disseram que o Google Translate não satisfaz. Assim, estou ao aguardo de um patrocinador que queira anunciar ou arcar com as despesas de um tradutor confiável. Se tiver alguma ideia, estou propenso a ouvi-lo. Muito obrigado por seu interesse, no qual percebo a validade de meus escritos. Até breve!

      Curtir

Deixar mensagem para Roberto A. Pimentel Cancelar resposta