Melhores Professores, Mais Talentos – Parte 2

O Método de John Wooden

Conforme prometêramos, estamos de volta acrescentando mais experiências ao nosso estudo na prática de teorias metodológicas iniciado com Daniel Coyle (O código do talento).

 

 

M+ M- M+

À medida que as semanas e os meses foram passando, o método de Wooden foi ficando mais claro para eles. Os observadores registraram e codificaram 2.326 atos de ensino distintos. Desses, meros 7% eram elogios. Apenas 6,6% eram expressões de insatisfação. E 75% eram pura informação: o que fazer, como fazer, quando intensificar uma atividade. Uma das formas de ensinar mais utilizadas por ele era uma instrução dividida em três partes: primeiro ele mostrava a maneira certa de fazer alguma coisa; em seguida, a maneira errada; por fim, voltava a mostrar a maneira certa, sequência didática essa que foi resumida nas anotações como M+, M-, M+.

Comentário do Procrie. Normalmente, um treinador menos experiente e com pouco conhecimento pedagógico, cai na armadilha de querer demonstrar e dissertar em alguns instantes sobre determinado erro de seus pupilos. E, aí, perde-se no emaranhado das elucubrações e confunde mais os espectadores do que ensina, e ao mesmo tempo quebra o ritmo das ações. Observei muitas dessas ações nas aulas de natação de minha neta (6 anos): o professor enuncia o gesto com demonstração (M+); por fim acentua o que não deve ser feito (M-). Assim, a derradeira demonstração é exatamente aquela que fica no imaginário da criança. Falta-lhe o M+. Em outros momentos, percebia em treinos tanto na escola quanto em clubes, nas aulas de basquete ou de voleibol. Ao final do ano letivo, eram poucos os alunos que suportavam tamanha chatice. Entre adultos, um treinador que não parava um instante de falar e a desenhar na sua prancheta esquemas e chaves a serem empregadas em segundos por seus pupilos em plena partida. É natural que os indivíduos se cansem e desloquem o foco de sua atenção para outro lado ou se dispersem, dada a quantidade de palavras ao vento. Em suma, trata-se de um treinador absorvente, isto é, ele sabe tudo e somente ele tem as soluções, do tipo “venham a mim e eu lhes direi o que fazer!” Há tempos ouvi uma preciosidade de um treinador de infantis feminino: “Elas sabem onde está a luz”! Vejam alguns dos conselhos de Wooden nas linhas seguintes.

Suas demonstrações dificilmente duravam mais que três segundos, mas são tão claras que deixam na memória uma imagem muito semelhante a um desenho de manual. A informação não retardava o treino; ao contrário, Wooden a combinava com o que ele chamava de condicionamento mental e emocional, isto é, fazer todos correrem mais do que corriam nos jogos, o tempo todo. Os treinos eram ininterruptos, elétricos, cheios de emoção, intensos, exigentes. Embora não parecessem seguir um planejamento, eram tudo, menos improvisados. O técnico escrevia a programação em pequenas fichas. Costumava arquivar essas fichas a fim de poder comparar e ajustar os treinos. Nenhum detalhe era insignificante demais para não ser levado em conta. Uma série de exercícios aparentemente criada na hora, era na verdade tão bem estruturada quando um libreto de ópera. “Quando parecia falar espontaneamente, Wooden na realidade tocava em temas de conversa planejados”.

— Comentário do Procrie

Não perca demasiado tempo em demonstrações, os indivíduos têm um breve tempo para assimilar o que seja dito ou exibido. Se você ultrapassar esse tempo, suas palavras ou gestos cairão no vazio. Nunca é demais lembrar que é sempre de bom alvitre colocar uma pitada de graça, alegria e surpresa nos treinos. Isto torna o ambiente propício à concentração e ao desempenho, deixando de ser repetitivo e enfadonho, do tipo que inspira pensamentos nos atletas como “aposto que já sei o que vem mais adiante!” Neste particular coleciono alguns depoimentos de ex-atletas – quadra e praia – dos quais muito me orgulho por ter-lhes oferecido o melhor que pude. Nos treinos em ginásio (3 vezes/semana), conseguia programá-los algumas horas antes, o que me facultava não pensar na sequência. Esta era muito bem assimilada pelo grupo a ponto de realizarem treinamento sem a (minha) presença do treinador. Inclusive, imprimiu-se um ritmo bastante forte a ponto de às vezes lhes ser pedido comedimento e cuidados nas intervenções. Quanto ao aspecto psicológico e emocional, creio que chegamos ao máximo: perfeita união, unidade de propósitos e incentivo e apoio ao próximo, tanto no erro como nas boas ações. Na praia não foi diferente, guardadas as características da competição. Eram seis os atletas em treinos diários de 3h durante nove meses. Dois deles alcançaram o estrelato mais à frente: Márcio Araújo, cearense, canhoto, medalhista olímpico; e Frederico (Fred), niteroiense, Rei da Praia em 2000. E pelo que os próprios propalam, foi uma felicidade terem começado sua carreira com um treinador que (eles e outros dizem) muito competente. E por isto acarinhado com o chamamento de Mestre.

Um derradeiro detalhe que justifica minha admiração por Coyle: só vim a conhecer sua obra “O código do talento” em novembro/2011, por ocasião de meu aniversário. Até então tudo o que realizava era pura intuição e criatividade, e acima de tudo, nenhum medo de errar. Por que não tentar? Antes de eleger o próximo artigo, que tal sugerirem algo? Não demorem.

—————————— Pensando em voz alta… Que acham da ideia abaixo?

Sabem em que estou pensando há dias? Alugar um ginásio, ou mesmo na praia, e começar a treinar moças e rapazes “baixinhos”. Isto mesmo, creio que vou ficar rico! Com a ideia bastante difundida de que só vence no voleibol indivíduos altos, uma multidão está alijada de realizar bons treinamentos para a prática de puro lazer. E, quem sabe, especializar os treinamentos para apurar futuros(as) atletas na função de LÍBERO. Para quem ainda não sabe, durante 4-5 anos realizei projetos em praias – Icaraí, Copacabana – com frequência invejável às aulas (duas, semanais) para 300 e até 400 crianças (8-13 anos). Além disso, posso transformar este meu projeto em uma ação comunitária e criar uma LIGA para administrar jogos em fins de semana para as crianças e, muito além, para seus irmãos, jovens e responsáveis, especialmente as mamães.

Concernente ao meu histórico na cidade em que nasci e vivo – Niterói -, creio que teria um grande problema: o espaço para conter a quantidade de alunos desejosos de um ensino de qualidade e descompromissado de competições oficiais, que lhes tolhem o acesso ao jogo, isto é, somente alguns poucos são os escolhidos. E os outros? Pensando nisso, por que não me dedicar então a esses “outros” dispensados? Um segundo problema a conciliar com um treinamento profundo e duradouro, seria “Como manter tantos alunos em atividade ao mesmo tempo? Qual seria o limite de indivíduos em cada turma? De que mais eu precisaria? É certo que vamos fazê-lo e depois levar para a sua cidade; nesse caso como você planejaria o projeto?

4 comentários em “Melhores Professores, Mais Talentos – Parte 2

  1. Roberto,
    Aqui no Japão estou envolvido num projeto que visa ensinar futebol para crianças do colegial (15 a 17 anos) que não conseguem fazer parte dos seus respectivos times. Eles ficam praticamente ao “escanteio” dos treinamentos nas respectivas escolas. Pensando na quantidade de garotos nessa situação é que tivemos a idéia de acolhê-los. As aulas são bem livres, sem o peso da melhor performance, sem uniformes iguais, etc. Acho que é mais ou menos o que você pensa em fazer com os baixinhos no vôlei. Falando nisso, acompanhei ao vivo todos os jogos do torneio de vôlei de onde saíram quatro classificados para Londres: Russia, Coréia, Japão e Servia. A altura das russas impressionam. Pecam um pouco no fundamento da recepção, mas no bloqueio não ótimas. Continuo acompanhando as suas aulas. Abraços.

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    1. Edison, você poderá ter surpresas muito agradáveis se colocar em prática o que ainda está por ler no Procrie. Aproveite as circunstâncias favoráveis para motivá-las sem nada impor com a produção de um clima de camaradagem entre os jovens e sua comunidade. O que está a produzir é extremamente generoso, pois trata-se de um prcesso de inclusão, mais grandioso do que a descoberta de talentos. Estará oferecendo oportunidades aos “rejeitados”. Afinal, será que a simples prática do esporte educa? Veja como é imprescindível a boa formação do professor, que pode marcar para a eternidade a personalidade de um individuo (ou gupo). Há vários artigos que coloco para informação e discussão sobre o tema. Estou vivamente impressionado com seu interesse, parabéns e futuramente diga-me como vem procedendo (métodos/pedagogia) e envie-me foto; com sua permissão estarei produzindo um texto no Procrie.

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  2. Roberto,
    Gosto muito de competição e aprecio o esporte de alto nível. Confesso que tenho perfil competitivo, desde os tempos escolares. Mas, com o passar do tempo e dos anos, e vendo o que acontecia com os “rejeitados” comecei a mudar meus conceitos. Marcar positivamente a vida de um ser humano é realmente uma coisa fantástica. Melhor que uma medalha de ouro. rsrss… Assim que tiver respostas mais conclusivas sobre tudo o que tenho feito, enviarei para o Procrie juntamente com as fotos.

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    1. Edison,
      Grato por seu depoimento e espero tornar públicas suas experiências pedagógicas. Lembrei-me do que disse Henry B. Adams: “Um professor afeta a eternidade, ele nunca sabe em que ponto cessa sua influência”. Imagino que será merecedor de muito mais do que medalhas, pois estará no coração de quantos contribuir para uma boa educação. Quando for o caso, avise-me para aquilatarmos a melhor forma de remessa do material. Sucesso!

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