Aspectos Técnicos e Táticos – Evolução do Jogo – Melhor Atleta – Mulher no Esporte
No dia 14 do corrente (ver Comentários), uma internauta indagou-me: “Quais foram os jogadores de voleibol mais importantes em cada década no Brasil”? O que você responderia? Provavelmente recorreríamos à memória e depois ao Google para renovarmos a listagem dos atletas de seleção e, dali realizarmos a escolha que, provavelmente, recairia no nome mais badalado pela mídia, ou o jogador mais bonito, mais forte, mais sexy etc. Além disso, em “jogadores” estariam embutidos homens e mulheres? E aí a resposta estaria complicadérrima. No que se refere às mulheres, alguns sites e imprensa inventaram eleger a mais bonita e as musas. Estariam se tornando “atleta-objeto”? Percebam a influência da própria Fivb ao determinar o modelito de uniforme das equipes, especialmente femininas, inclusive no vôlei de praia.
Conceituar o que vem a ser um bom jogador de voleibol é tarefa bastante árdua e talvez não se chegue à conclusão alguma. Mas alguns parâmetros, determinados pelas respectivas épocas em que atuaram possam nos conduzir por um caminho razoavelmente inteligente. Percebam que não estaremos nomeando, personificando um atleta, mas esboçar o que poderia vir a ser um “bom jogador de voleibol”. Para fazer´nos entender, certamente precisaria de muito mais tempo e espaço dada a profundidade do tema. Mas vamos conduzindo esse nosso bate-papo devagar, sem pressa, e colocando na tela o que nos vem à cabeça.
Para começar, vou tirar alguns exemplos da partida que assisti pela TV nesse último dia de fevereiro entre as equipes femininas do Bergamo e do Villa Cortese pela Final Four da Liga dos Campeões 2012 CEV, em que o Villa venceu no golden set, após ter perdido a partida por 3×2. Este “set de ouro” faz parte do regulamento dos campeonatos promovidos pela CEV no caso de empate nos dois jogos do torneio classificatório.
Guardadas as devidas proporções, cito um exemplo muito nítido em minha mente, quando no início dos anos 1970 era treinador da equipe feminina do Tijuca T. C., no Rio de Janeiro. Nesse período, as mesmas atletas disputavam os campeonatos juvenis (até 18 anos) e de 1ª divisão. Como se pode aquilatar será muito difícil e audacioso compará-las com as atletas das equipes italianas, recheadas de atletas também de outras nacionalidades. Enfim, são profissionais do ramo e com um lastro invejável de experiência internacional, bem como seus técnicos.
Todavia, será que muitos treinos e jogos internacionais, equipamentos, bolas, uniformes, equipe técnica e médica, fazem muita diferença na concepção de um treinador no que diz respeito ao lado técnico? Se ele influenciasse na Formação de suas atletas como procederia? Digo isto porque vi o técnico do Villa se esgoelar nos tempos técnicos a dizer para uma das suas atletas – a ponteira na posição IV – que se esforçasse para pelo menos colocar a bola dentro da quadra adversária e não no bloqueio duplo que insistentemente impedia seus ataques. Em outras situações, sempre produzidas pelo mau passe, as bolas eram levantadas (ou lançadas para o alto) de manchete, prejudicando tudo o que fora treinado “em casa”. E, nessas situações o que fazer? Quase sempre os erros se sucedem de maneira já agora aceitável, pois as duas equipes se equivalem em ambas as concepções. Por isto, relembro – 1963 – o querido e já falecido Zoulo Rabello a nos ensinar: “Ganha quem erra menos”! Dessas colocações podemos abstrair o seguinte: “Por que erram tanto as atletas atuais, com tantos recursos técnicos e materiais à disposição, com treinadores capazes e estudiosos?
Um exemplo de acuidade técnica passamos a ensinar àquelas meninas, tendo iniciado pela levantadora – na foto, nº 2, – que passou a ser minha demonstradora para as demais e, logo a seguir, para a equipe masculina do mesmo clube que também treinava. Nessa época, o voleibol no Rio de Janeiro era jogado somente às terças e quintas-feiras, não comportando mais do que 2 horas de treinamento para uma equipe. Mostrei-lhe que em todos os jogos, não importa que equipes, a incidência de recepções mal realizadas quase sempre implicavam em devolução da bola à quadra adversária por manchete. E sempre lançando a bola o mais alto possível; será que acreditam que a altura prejudica a recepção? É bem possível, pois até nossos dias o fato se repete em grande intensidade. O que fazer?
Orientei-a no sentido do que eu já fazia em jogos oficiais e na praia: lançava a bola de toque, buscando os claros ou vazios, e principalmente, nas proximidades do levantador adversário, nunca sobre ele. Nessa época também existia uma máxima entre os atletas de que “a segunda bola é do levantador”, exaustivamente repetida até hoje. Dessa forma, qualquer lançamento com altura mínima nas imediações daquele atleta envolvia um grave problema a ser resolvido: quem deve defender (tocar) em primeiro lugar, o levantador ou um outro atleta? Assim, com um ataque tão singelo, criávamos um problema de difícil solução, e quase sempre tínhamos a bola de volta sem ataque. Percebam que se o levantador assumisse a recepção, para onde remeteria a bola? Quem levantaria a seguir? Quase sempre tentavam o atacante mais próximo – meio de rede, III – ou lançavam a bola para o alto contando que algum companheiro de defesa infiltrasse e efetuasse o levantamento. Certamente, a pior solução. Se o meio de rede recebesse o levantamento jamais teria condições facilitadas de ataque, uma vez que são jogadores mais lentos e adestrados para ataque com corrida, isto é, precisam de espaço e tempo já incorporados à sua técnica de ataque. Não tendo condições de ataque, tentariam um levantamento para um outro companheiro, o que sabemos todos, seria sempre uma lástima e, se bem sucedido, torna-se presa fácil para os bloqueadores.
Depois dela, passamos esse aprendizado para as demais e, como seus jogos eram preliminares da equipe masculina, também para eles, com excelentes demonstrações práticas. Nunca vi outra equipe fazer o mesmo e, até hoje, uma raridade em nível internacional. No jogo em questão – Bergamo vs. Villa Cortese – em três sets que pude ver, foram perto de dez devoluções por manchete e nenhum ataque à levantadora. Essa atleta tijucana tornou-se professora de Ed. Física e, imagino, jamais esqueceu daqueles ensinamentos que, ao longo de sua vida profissional devem ter sido enriquecidos com suas contribuições inteligentes.
Para não nos alongarmos demasiadamente pois, como dissemos no início, a evolução técnica e tática do voleibol tem suas épocas bem definidas, devolvo a questão: Quem é a melhor jogadora na sua época? Seriam somente as selecionáveis? Além disso, será que os dois técnicos italianos sabem disso? Imagino que sim, apenas não houve tempo para treinar. E vocês, o que acham?


Parabéns Roberto por esse fantástico site. Vou divulgar. Essa matéria ficou sensacional. A melhor jogadora da minha época, sem dúvida alguma, era eu…. rsrsrsr…. brincadeirinha. Éramos uma EQUIPE que jogávamos com prazer, sem estrelismo e máscaras, com disciplina, respeito e vontade de jogar. E termino dizendo com toda certeza do mundo: FORAM OS MELHORES DIAS DA MINHA VIDA. Obrigada pelo carinho de sempre.
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Que bom que você gostou! Tomara que também suas amigas do Tijuca (e outras) venham a apreciar esses escritos de um velhinho que ainda se sente atualizado. Como disse uma delas, era um “vanguardista”. Traduzindo para a nova geração, sentia-me um atleta bastante técnico e, cedo, passei a retransmitir aos meus treinandos tudo aquilo que pensava, e não o que via ao redor. Pode-se dizer até criativo ou intuitivo. Poderão todos constatar essa posição nas dezenas de textos desse Procrie. Dêem uma olhadinha em “Novo Sumário”. E, não me esqueci, figuram também no meu livro “História do Voleibol no Brasil” (2vol.,1.100pág.), uma homenagem ao Tijuca T. C. e a todos que por ali passaram. No volume I, constam aproximadamente 3 mil nomes, e quem atuou em 1960 e 1970 está relacionado junto ao seu respectivo clube. Uma verdadeira obra memorialista e enciclopédica que, enfim, poderemos dizer que o Brasil já tem memória, pelo menos no voleibol. E ela recua além de 1984 – marco ditado pela mídia -, e nos remete a 1939, inclusive com foto e comentários da equipe do IPC, Niterói, campeã do II Torneio da ACM, no Rio.
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8.3.2012, Suzie – Este é realmente um assunto fascinante; sou muito sortuda por ter encontrado o seu blog e vou adicionar aos meus favoritos para voltar mais vezes.
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Achei muito legal esse site, com muitas saudades relembrei desse tempo tão glorioso e feliz. Faço das palavras da Marina Linhares as minhas. Um super beijo a todas as pessoas que tão bem fizeram uma bela história.
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Tornando a ouvi-las sinto que estou atrasado para o próximo treino, ávido por trazer-lhes uma novidade. Imagino pelos comentários que não tenha falhado na missão no breve instante do Tijuca. Vocês entraram para a História do Voleibol no Brasil, documentada na minha obra mais recente. Tomara que gostem e tenham tempo de contar para seus filhos e netos. Ou até para mim mesmo,pois algo deve ter-me escapado.
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