Aprender a pensar
“Preocupo-me com a matemática nos currículos do secundário e tenho uma idéia ‘fora de moda’ acerca do seu objetivo; primeiro, e acima de tudo, ela deveria ensinar os jovens a PENSAR”. (Pólya)
Recordo-me do Bené (Benedito Silva), um pequeno grande apologista do voleibol arte, treinador de crianças do Fluminense F. C., iletrado, que dizia referindo-se a um de seus pequenos atletas: “Para ele temos que dar alguma inteligência”. Podem não concordar inteiramente, mas presumo que concordarão com isto até certo ponto: seria o equivalente aos postulados de Vigotski quanto à “zona de desenvolvimento proximal”. Se não consideram que ensinar a pensar é um objetivo prioritário, podem encará-lo como um objetivo secundário e teremos pontos comuns suficientes para a discussão seguinte. São famosas as queixas a respeito da falta de uma base sólida de ensino no país quando uma equipe não obtém sucesso em competições internacionais. Dizem os técnicos: “Como é possível realizar um trabalho de alto nível se os atletas ainda apresentam deficiências técnicas elementares”?
Em 2003, constatei algo similar ao visitar o centro de treinamento de uma de nossas seleções. Agendei o encontro com o treinador para discutirmos a respeito do aproveitamento do único atleta canhoto. Tinha para mim que ele poderia desenvolver-se mais ainda, apesar de sua condição de titular absoluto e um dos melhores atletas mundiais. À primeira vista poderia parecer muita pretensão, mas tinha convicção e pleno conhecimento de causa, pois fui considerado um dos melhores atacantes canhotos de minha época, muito embora não fosse sinistro. Do diálogo com o treinador resultou na afirmação: “Não há tempo para fazer qualquer reparo técnico na sua formação”. Traduzindo: Deixa como está! Confesso que saí de lá frustrado, pois não pude colocar minhas considerações. Por outro lado, muito feliz por ter-me esforçado, sem medo de errar e escoimar-me do assunto. Por fim, seis anos depois, tomara que o atleta tenha mantido pelo menos a sua performance costumeira (não melhorou) e que os adversários contribuam para tal. Este fato me despertou a atenção para a seguinte indagação: “Será que sabemos transmitir a melhor técnica de ataque para um atleta sinistro”? Veja a historinha a seguir.
Há muitos anos – início de 1992 –, durante a realização do I Circuito de Vôlei de Praia do Banco do Brasil realizado em Niterói, encontrei-me com um ex-atleta de seleção brasileira, mineiro, ligado à direção do Minas Tênis Clube, de Belo Horizonte (MG). Como atuamos na mesma época, conhecia-me profundamente, inclusive considerava-me um atleta versátil e técnico. Como todos, achava também que era canhoto. A certa altura da conversa, indagou-me: “Você não poderia dizer-me como treinar um canhoto”? E explicou: “Trata-se de um rapaz ainda juvenil no Minas, com 2m de altura e bastante potencial a ser desenvolvido”. Disse-lhe que nunca encontrei quem efetivamente soubesse treinar um canhoto e que, eu mesmo me treinara. Assim, só haveria uma resposta: “Leve-me até ele ou traga-o para cá”. E mais não foi dito. Tratava-se de André Nascimento, que viria a se tornar um dos mais eficientes atacantes do voleibol internacional. O mesmo a quem me reporto no texto anterior. Não me recordo se em 2006 ou 2007, passeando pelo Shopping Beira Mar, em Florianópolis (SC), encontrei este atleta com a namorada e não me furtei em apresentar-me e dizer-lhe: “Parabenizo-o por suas performances, mas acho que poderia melhor se aprimorar”. Deve ter-me achado um louco. Contudo, pouco tempo depois, visitando o centro de treinamento em Saquarema, pudemos dar boas gargalhadas a este respeito.
Ainda sobre a formação técnica de um atleta canhoto, tive uma experiência bastante proveitosa em 1970, quando dirigi a equipe masculina do Tijuca Tênis Clube, do Rio de Janeiro. Nesta época, treinávamos somente as terças e quintas-feiras, das 20h às 22h. Após dois ou três treinos, apresentou-se-me um atleta que já atuara no clube em outra ocasião, talvez na divisão juvenil. Tinha estatura mediana – talvez 1,80m – forte, com excelente impulsão e… canhoto. Disseram-me seus colegas tratar-se de um atleta “meio-maluco”, isto é, tanto podia realizar portentosos arremates certeiros, como finalizações medíocres; simplesmente, ninguém sabia o que poderia acontecer quando era solicitado numa partida. Tecnicamente, era inconfiável. Nos primeiros ensaios deixei-o à vontade, procurando esmiuçar seu comportamento, dando-me a conhecer e buscando ainda a credibilidade do grupo. Quando julguei oportuno, aproveitei a oportunidade para insinuar-me mais concretamente sobre sua técnica de arremate. Realizávamos um coletivo quando ele não teve sucesso num ataque; neste momento, interrompi o ensaio e disse-lhe porque errara e como deveria proceder. Incontinente, retrucou com autoridade: “Você esqueceu que sou canhoto”? Como se me dissesse “Para me corrigir há que saber fazê-lo (com a mão esquerda)”! Este era o momento que esperava. Pedi-lhe que se afastasse da quadra e olhasse com atenção o que eu faria. Mandei que reiniciassem o coletivo e que a bola me fosse lançada, como no lance em que participou. E assim, pude mostrar-lhe na prática como proceder e ter sucesso, uma vez que sempre realizei ataques preferencialmente de esquerda, embora não seja sinistro. A partir dali estreitamos nosso relacionamento e conseguimos o que parecia impossível: o seu aprimoramento técnico. Mais adiante, numa partida contra o Fluminense, no seu ginásio nas Laranjeiras, vencemos de 3 sets a 2. Este rapaz atuou primorosamente, só tendo errado um ataque, ainda assim porque a bola não estava adequada ao arremate com a esquerda e, ao tentar com o outro braço, conduziu-a. Imagino que ele também jamais tenha esquecido esta façanha e, espero, tenha aproveitado a lição para aplicá-la no seu dia-a-dia.


Bom dia mestre. Nos idos de 97 estivemos juntos em Niterói durante bons meses de treinamento. Naquela época, devido a uma abrupta interrupção dos treinamentos que tive que fazer para atender longa viagem a trabalho, não pude prosseguir no aprendizado do vôlei de praia (minha paixão). E que aprendizado!!!
Assim, naquela época, não exploramos os aspectos da dinâmica do movimento do ataque (cortada). Bom, hoje mais velho, convidado a integrar a equipe de um grande time do Rio de Janeiro, sinto falta de treinamento específico para canhotos e, em especial, do movimento de ataque. Falo agora de vôlei de quadra (indoor).
Devido à melhora significativa da minha performance neste último ano que integro a equipe, novas demandas do técnico e levantadores vem surgindo (para mim) além do já tradicional ataque pela saída de rede (meia bola), a saber: 1) ataque da linha dos 3m pela saída (bola alta); 2) ataque de meio de rede (bola de tempo); 3) ataque com bola chutada na saída.
Tenho boa impulsão, 1,90m de altura e boa visão de quadra, mas essas últimas bolas que me pediram para atacar porque acreditam ser possível, eu confesso que fico meio perdido.
O que percebi: 1) Não consigo me posicionar para atacar bola de tempo (cabeçaa) junto ao levantador (voltado para entrada de rede), apesar de bater excelente bola de tempo (atrás); 2) Não consigo atacar a bola chutada na saída por achá-la por vezes baixa ou rápida demais; 3) ataques atrás da linha dos 3m é aonde me saio melhor com 50% de acertos.
Perguntas: 1) Que orientacão pode ser dada a um canhoto para posicionamento em quadra, visando melhor deslocamento para o ataque das diversas bolas lancadas que citei? 2) que orientação posso passar aos levantadores para lançamento dessas bolas diferentes para mim?
Agradeco antecipadamente.
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Olá meu bom amigo Floriano, vejo que não me esqueceu e de nossas façanhas quando treinávamos em Icaraí, minha praia. Você sempre foi muito inteligente, aplicado e profundamente interessado em aprender. Certamente é assim em sua vida, tenho certeza, pois seus dizeres refletem essa ansiedade em aprimorar-se no que faz. Parabéns, não me decepcionou. Estarei sempre perto de você para auxiliá-lo com todo o prazer. Peço um pouco de paciência já que terei muita coisa a transmitir-lhe e a todos que se encaixem nesse perfil – treinadores ou atletas. Espero que “tenham tempo” para ler… e aplicar. Contudo, quero e preciso que me dêem retorno com suas observações, uma vez que elas estarão balizando-me nesse mister. E me enriquecendo! Aguardem-me.
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17.7.2012 – (Tera gold)… Você tem observado pontos muito interessantes! PS bom site de internet.
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