Futuro do Voleibol em Portugal – Parte II

Valor da Formação

Percebam que no âmago da questão – a Formação – está a solução para todos os problemas. desde que me conheço, em qualquer desporto no Brasil, os técnicos de seleções sempre reclamaram que não lhes competia treinar fundamentos em regime de treinos das seleções do país: imagina-se que já os possuam desde a Base (Formação). Assim, perdia-se tempo em corrigir este ou aquele fundamento na maioria dos atletas. Verdadeiro absurdo, mas que se perpetua especialmente no voleibol brasileiro. Ocorre que as universidades e os cursos oferecidos pelas respectivas Federações permanecem repetitivos, isto é, pouco acrescentam. Em suma, alguma coisa que leve os professores a serem construtores do próprio saber, que os instigue a pensar e a decidir o que fazer em cada circunstância, com este ou aquele indivíduo e o grupo em geral. Mas não, repetem e repetem as mesmas coisas e, pelo que imagino, no mundo inteiro. Conhece alguém em Portugal que o faça? Infelizmente, no Brasil não conheço. Ou, então, conheço pouca gente e não sei o que andam fazendo! Todavia, é fácil reconhecer o trabalho na Base avaliando os novos valores quando. e se é que surgem. Luís Melo, construtor do site português Sovolei, comenta com muita propriedade e destaca a “Formação nos clubes” e coloca em dúvida o esquema de treinamento de alguns atletas em permanente estágio. Nesta segunda colocação, alguns poucos jogadores estarão a treinar sob uma nova ótica, em um outro regime e sujeitos a algum tipo de cobrança (e competição), o que não é agradável para aspirantes à qualquer seleção. A espontaneidade fica prejudicada e impede uma plena realização do indivíduo, além do que, imagino eu, o treinamento deve estar voltado para um adestramento. Repetem-se os mesmos movimentos à exaustão e recebem um afago pelos acertos e um puxão de orelhas pelos erros. A criatividade jamais será estimulada dessa forma. Daí a importância de os treinadores dos clubes e até nas escolas, adotarem métodos adequados que despertem nos aprendizes condições de auto-aprendizagem e desenvolvimento. Por outro lado, estarão na posição de facilitadores nas correções e aconselhamentos para que obtenham uma técnica perfeita em TODOS os movimentos. Isto é fácil de realizar, mas não está nas cartilhas e manuais. Como fazer? Alguém teria interesse em fazê-lo com suas equipes em Formação? Destaco, ainda, o aspecto dos treinamentos para equipes femininas, reféns de muitos mitos e preconceitos.

A partir da esquerda, Marcelo Cândido, Roberto Pimentel e Santa Cruz, na arena de Fortaleza (CE).

Um breve exemplo prático do que realizamos na Praia de Icaraí, Niterói, tendo ao fundo dois cartões postais do Rio de Janeiro, o Pão de Açúcar e o Cristo Redentor. Durante nove meses treinei graciosamente dois rapazes que me solicitaram apoio técnico para suas investidas no Circuito de Vôlei de Praia do Banco do Brasil. Independentemente do calendário do Circuito, dispuseram-se a treinar 6 vezes na semana, das 9h às 12h nas areias e, por conta de cada um, à tarde fariam o reforço físico em academia. Foi minha primeira experiência e, portanto, um grande aprendizado, pois mantive diálogo aberto com todos. Ocorre que (nenhum treinador fazia) convenci-os de que precisaríamos de quatro outros atletas para compor e auxiliarem nos ensaios. Concordaram e fizemos as escolhas em conjunto. Um deles, de elevada estatura (2,03m) era completamente descoordenado e desastrado em todos os fundamentos. Queria muito também se iniciar no Circuito e estava muito incentivado pelo pai, um ex-atleta da seleção brasileira. Todavia, não conseguia um parceiro para formar dupla, mas, mesmo enquanto buscava alguém, treinava com muito afinco. Resumindo, treinamos durante longos nove meses, o que me tornou um professor enriquecido com tudo o que aprendi. Não vou dizer sobre a dupla principal que enveredou pelos jogos Brasil afora, mas destacar o que ocorreu com o Frederico (Fred), o rapaz que tinha dificuldade em conseguir um parceiro. Na primeira instância em que poderia atuar no Circuito foi na cidade de Fortaleza (CE), onde os portugueses atualmente estão se estabelecendo em férias. Frederico conseguiu convencer um colega a participar com ele (suas idades seriam próximas dos 19 anos) e não lograram êxito nos jogos. Retornando aos treinos, pouco tempo depois o pai solicitou-me a inserção de um novo companheiro para o filho, que estaria hospedado em sua casa e comporia uma nova dupla. Acedi e no dia seguinte, lá estava o rapazinho, muito simpático como todo cearense, magro, franzino e canhoto. Tratava-se do Márcio Araújo, atualmente um campeoníssimo, inclusive com medalha olímpica. Não me recordo quanto tempo ficou por ali treinando, mas se perguntarem a ele sobre sua estada em Niterói, dirá que foi inesquecível e marcante para ele. Retornou ao Ceará e compôs dupla com o Reis, hoje treinador da dupla Juliana e Larissa, campeãs mundiais. Quanto ao Fred, só não foi mais longe porque se perdeu na busca de um novo treinador. Contudo, chegou a conquistar o título de “Rei da Praia – 2000”, torneio anual na Praia de Ipanema, Rio, com todos os ases do voleibol de praia. Mais à frente tornou-se o melhor sacador do Brasil. Esteve ainda a treinar comigo por algum tempo numa segunda fase pela qual enveredei com outro grupo de atletas.

  • Será que os treinos realizados nessa fase de Formação contribuíram para o desenvolvimento do Márcio e do Fred?

Creio que ninguém melhor do que eles para responder. Entrem nos respectivos sites e eles lhes responderão. Tenho algumas outras experiências nesse sentido que estão descritas no Procrie; acentuo possibilidades de treinamento voltadas para a formação técnica, mesmo em se tratando de adultos e as dificuldades inerentes à prática do voleibol no Brasil.

Não deixem de navegar literalmente nas “nuvens” em http://prezi.com/9nhuhq5t7coh/procrie/  Estou colhendo sugestões!

(continua…)

Futebol e Voleibol na Praia

Foto: Wallace Teixeira/Photocamera/Divulgação.

Com desfalques, Flu treina na praia e ganha apoio de multidão
Rodrigo Viga, 12 de outubro de 2010.       

Deu no Terra. “Apoiado por quase 500 torcedores, o Fluminense treinou nesta terça-feira na Praia do Leme, zona sul do Rio de Janeiro, em busca da reação no Campeonato Brasileiro. Os fãs que compareceram à atividade tietaram os jogadores e manifestaram palavras de apoio, apesar de o time perdido a liderança para o Cruzeiro”.   

Futebol vs. Voleibol.  Teria eu ficado louco ou muito distraído para vincular a notícia acima num site de voleibol? O que estaria acontecendo? Qual a relação entre a preparação física de uma equipe de futebol profissional e o voleibol?  Inicialmente podemos pensar em “esporte, exercícios, areia, voleibol de praia.” Mas o que de fato quero destacar é a importância da presença do público aos treinos e o que representa para o atleta.          

Treinamento do Vôlei na Praia. Tive a oportunidade de ser um dos chamados “Rato de Praia”, uma bem conceituada e carinhosa indicação para o indivíduo que tem intimidade com a areia por frequentá-la a todo instante, isto é, estar sempre na praia a praticar o voleibol. Não confundir com os novos frequentadores, profissionais do ramo, que só o fazem motivados pelos prêmios em dinheiro que o patrocinador oferece. Não. Antes de o Banco do Brasil dar os primeiros passos no final de 1991, há muito se jogava na praia com outra motivação e “espírito”. Jogava-se por puro divertimento, descompromissadamente, com alegria. Tenho registros de jogos na praia que datam de 1939 e o leitor poderá ver em “História do Voleibol, Voleibol de Praia.”            

Situação dos atletas. No Brasil, e até na Suécia, os novos profissionais das areias já foram confundidos pela comunidade a que pertencem como vagabundos, no sentido de que largam estudos e trabalho para se dedicarem exclusivamente à nova profissão. Vejam o texto extraído do noticiário jornalístico por volta de 1999: “O sueco Tom Englen, originário do vôlei de quadra como a maioria dos jogadores, acredita que a possibilidade de ser um bom atleta com estatura mediana ajuda a aumentar o interesse pelo vôlei de praia. O Roberto Lopes é um dos melhores do mundo e tem 1,85m. No vôlei tradicional isso seria impossível, compara. Mas ele e seu parceiro, Petersen, ainda lutam para tirar do esporte o estigma de jogo de vagabundos, que insistem em lhes dar na Suécia”.           

Ana Paula salta enquanto Shelda observa. Foto: Fivb Beach Volleyball Partinership Opportunities 2010.

Treinamento com público. Tenho certeza de que não há maior motivação para um atleta do que estar sendo visto por outros olhos quando está a se exercitar. Em academias há o recurso perigoso dos espelhos e a companhia de outros clientes. No voleibol indoor, dificilmente alguém se detém para assistir aos treinos de uma equipe. E se colhermos a opinião dos atletas, todos concordarão que a monotonia é um fator psicológico a ser vencido. Os  treinadores mais antigos possivelmente não consideravam esse fator, até mesmo porque não tinham o famoso “tempo” (serve como desculpas até hoje) e tão pouco recursos. Certa feita, foi antes de um Sul-Americano juvenil no Chile, a equipe nacional era treinada pelo Jorge Bettencourt (Jorginho), meu amigo do Botafogo. Pedi-lhe para realizar um treino demonstração em um educandário de Niterói. Nesta época lembro que faziam parte da equipe Renato Villarinho, Xandó e Renam. Foi uma demonstração de como treinava uma equipe de alto nível e, em seguida, distribui entre os alunos papel e caneta para que, quando autorizados, colhessem autógrafos dos jogadores. Foi uma verdadeira festa para a criançada e, tenho certeza, uma quebra da monotonia de tantos treinos do selecionado. Houve uma mudança de ambiente e uma novidade para todos – atletas e alunos.      

Muitos anos se passaram para que me dispusesse a realizar treinos com duplas de praia em Icaraí, onde resido. Considerei o desgaste nervoso como um dos obstáculos a vencer, pois as sessões eram diárias (6 vezes na semana) e com horários bem sacrificantes (9h às 12h). A parte física era à tarde, em academias, por conta exclusiva dos atletas. A escolha do local também favoreceu ao que tinha em mente, isto é, aproximar os atletas do público passante no calçadão da praia, por onde sempre desfilam milhares de pessoas realizando suas caminhadas matinais. Fora o fluxo de veículos, descomunal.     

Meus objetivos foram atingidos, não só porque me utilizava de uma série de equipamentos não convencionais, como também tornei a pequena arena em um ponto de atração diário. Os passantes reduziam o seu ritmo de caminhada, ou até mesmo paravam por instantes para apreciarem o que se desenrolava. Vez por outra me consultavam sobre a possibilidade de inscrever um novo candidato. Interessante notar que, anos a seguir, quando inclui duas moças aos treinos, a procura pelo ingresso foi bem maior. Em resumo, fui pioneiro ali de um Centro de Treinamento de Duplas de Praia que mais tarde e até hoje, inspirou outros professores e treinadores.       

Voltarei ao assunto após obter depoimentos daqueles atletas que estiveram comigo durante um bom tempo. Veremos como após tantos anos aqueles nossos encontros contribuíram para a edificação de suas vidas. Como sabem, minha preocupação maior sempre foi Educar e não o treinamento – adestramento – do voleibol. Até lá e aguardem!