A História se Repete

Lições do Grand Prix

Estão de parabéns as moças americanas e a sua equipe técnica. Às brasileiras, o consolo de um bonito trabalho e algumas lições a serem feitas em casa. Afinal, por que perdemos? (perdôem-me o trocadilho) Poucas pessoas viram o jogo no Brasil devido ao fuso horário, então ficamos à mercê da interpretação da equipe técnica (leia-se J. Roberto) e de uma ou outra atleta mais esclarecida. Em ambos os casos, e como sempre, os principais interessados – treinadores brasileiros – nunca vão saber os detalhes. Uma das causas é o hermetismo do treinador e sua atual distância das quadras brasileiras e, consequentemente, o diálogo com os técnicos daquelas atletas. Lembrem-se que qualquer deficiência em uma competição inexoravelmente é atribuída à FORMAÇÃO que teve o(a) atleta, ou ainda, a este ou aquele fator circunstancial.

Assim, caberia à entidade nacional que emprega o profissional, tornar público aos principais interessados um relatório (mesa redonda) sobre o desempenho da equipe. Espero que algum dia os dirigentes de outros países aprendam a lição e contribuam para a melhora do voleibol nas suas fronteiras. Alguém acredita nisto?

Thaísa foi um dos grandes destaques do Brasil no Grand Prix, sendo eleita a melhor sacadora da competição. Foto Fivb/Divulgação.

As estrelas do Grand Prix. Uma nova maneira de “ver o jogo”, ou melhor, analisando as famigeradas estatísticas do Sr. H. Baacke. Como o espaço é pequeno sintetizo algumas considerações para os treinadores da FORMAÇÃO pensarem: 1) Por que a russa foi a melhor líbero? 2) Como anular a melhor atacante? 3) Qual o segredo da melhor sacadora (serviço)? 4) Por que uma atleta se destaca na recepção?

 

 

 

Algumas explicações.  (deu no Terra)

No desembarque da delegação brasileira em São Paulo as atletas lamentaram o rendimento abaixo do esperado na decisão, mas exaltaram a campanha no torneio e o aprendizado obtido com o revés. “Logo depois da partida, sabíamos que não jogamos em bom nível e elas atuaram muitíssimo bem. Não jogamos tudo que somos capazes, foi um dia atípico da competição inteira, que a gente jogou muito bem”, avaliou a central Thaísa, dona do melhor saque do Grand Prix. “Fizemos um excelente campeonato, não perdemos para ninguém. Ganhamos inclusive dos Estados Unidos. Foi um jogo infeliz, em que todo mundo jogou mal”, acrescentou.

Quem também lamentou a fraca atuação na final foi a ponteira Fernanda Garay: “É difícil, principalmente pela campanha que fizemos. Falhamos na final, que é quando isso não poderia ter acontecido”, disse. O discurso das atletas é parecido com o do técnico José Roberto Guimarães, que parabenizou suas comandadas pelo desempenho na competição e ressaltou a alta qualidade da seleção americana. No Grand Prix, o Brasil disputou 14 partidas e saiu de quadra com a vitória em 13 oportunidades. “Precisamos reconhecer a superioridade americana no momento e aprender, pois temos mais coisa pela frente e vamos encontrar mais vezes os Estados Unidos. Jogamos contra um time que a base está junta há muitos anos e tem uma grande experiência internacional”, afirmou.

Tanto as jogadoras como o técnico da seleção apontaram que a experiência da disputa do Grand Prix será importante para as futuras pretensões do Brasil. Nessa temporada, a equipe ainda disputa a Copa do Mundo, classificatória para os Jogos Olímpicos de Londres de 2012, em que o Brasil tentará defender o ouro conquistado em na última edição dos Jogos Olímpicos, em Pequim, 2008. “Tem muita coisa pela frente, principalmente a Copa do Mundo no fim do ano, que classifica para os Jogos Olímpicos. Temos que tirar proveito desse campeonato, do que aconteceu nesse jogo”, completou Thaísa.

Recordo-me que em 1984, nos Jogos Olímpicos de Los Angeles (EUA), a equipe masculina de voleibol do Brasil levou de vencida a equipe americana ainda nas meias-finais. Nas finais defrontaram-se de novo e desta feita a vitória coube ao time da casa. Surpresa, destino, maldição? Nada disso, o Dr. Victor Matsudo (*), presente ao Congresso Técnico conta-nos uma história (revista Placar, 7.9.1984) que parece ter-se repetido uma vez mais:

– No vôlei, os EUA entregaram o primeiro jogo contra o Brasil por decisão de um psicólogo. Mas este é apenas um dos segredos que a Olimpíada esconde. O senhor esteve hospedado na casa do psicólogo-chefe da equipe americana. Descobriu algum segredo de Estado?

– O Professor Briant Cratty é o maior autor americano na área de psicologia do esporte e teve sob sua orientação a maioria dos profissionais que trabalhavam diretamente com as equipes americanas. Então vou contar algo que soube ali sobre o jogo de vôlei contra os brasileiros. A assessoria psicológica americana sabe que o atleta latino reage de forma diferente diante de um confronto altamente difícil e de outro apenas pouco difícil. Um dos maiores problemas que nós, brasileiros, enfrentamos são as decepções que sofremos nas quadras ou nos campos de futebol, quando enfrentamos equipes reconhecidamente inferiores, ou quando poderíamos opor maior resistência numa partida e misteriosamente jogamos mal e somos derrotados. Então, em função de terem perdido os dois primeiros sets por 15×10 e 15×11, numa noite em que o Brasil apresentou uma de suas melhores atuações, os psicólogos sugeriram que os Estados Unidos entregassem o terceiro set para que, numa possível final, os brasileiros estimassem que as dificuldades para ganhar a medalha de ouro fossem menores que as reais. Nesta final, o Brasil acabou enfrentando um Estados Unidos bem mais forte que o esperado e que apresentou muitas jogadas que antes procuraram esconder dos brasileiros. Eles, ao contrário, conheciam todas as nossas bolas e o nosso potencial. Depois dizem que nós somos os reis da malandragem”.

Conclusão. Certamente, após uma derrota em final de torneio, mais o desgaste da viagem, não é para se dar grandes explicações técnicas. Contudo, esta não é a primeira vez e, quase todos procedem da mesma maneira, ano após ano, independente de pessoa. Mas se tiram alguma conclusão, estas morrem com eles.  E o pior é quando os fatos se repetem o discurso já está preparado. Na sabedoria oriental as derrotas nos embates são vistas como algo produtivo, pois indicam caminhos a serem trilhados para aperfeiçoamento. Com certeza a equipe americana soube tirar proveito quando derrotada pelas brasileiras.

1) “O técnico brasileiro reconhece a superioridade americana no momento…” Em que momento? Quando perdeu? E quando ganhou dos EUA, quem era superior? Como será que ele avalia as equipes? Pelos resultados ou pelo conjunto da obra? Neste caso imagino que o Brasil seria superior. 

2) Será que o time americano tem mais experiência do que o brasileiro?

3) “Falhamos na final, quando não poderia ter acontecido…” Quem consegue dizer em que falhamos? Por que falhamos? Será que as estatísticas dizem algo? Eu, particularmente, gostaria muito de saber, pois contribuiria com subsídios para treinamentos futuros não só dessas, como de outras atletas em Formação.

4) Espera-se que atletas de ponta tenham tido uma boa Formação, que poderá ser usada em todos os momentos, embora saibamos todos que estamos muito longe disso. E, se concordam o quê fazer a seguir? Repetir, repetir… e tornar a repetir? Ou, então, a pergunta que desagrada a muita gente: “Como treinar”?

5) Todos já perceberam o cacoete que o José Roberto possui: em dificuldade, coça a cabeça. Isto e peculiar a muita gente, inclusive atletas de outros desportos: ao falharem num dado instante, instintivamente coçam a cabeça. Creio que existam muitos outros que denotam o comportamento do indivíduo em certas circunstâncias e um bom jogador de pôquer saberá analisar e tirar partido da situação. É por essas e outras que convém a um treinador conhecer a personalidade não só de suas atletas, mas também das adversárias e, principalmente, do seu técnico.

6) Seria o caso de consultarmos um psicólogo americano sobrevivente de 1984? 

Para tanto, sobra-me recomendar aos meus leitores acompanharem com muita atenção as postagens relativas ao tema Como Treinar e, melhor ainda, intervirem sempre com suas opiniões e comentários, pois é a razão de ser de um blogue. Se permanecerem calados perderão uma ótima oportunidade de desenvolvimento social e cultural, talvez mais marcante do que o simplesmente técnico. A formação integral de um atleta pressupõe a sua formação concomitante como indivíduo consciente.

Boas leituras…

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 (*) Dr. Victor Matsudo, diretor-geral do vanguardista Laboratório de Aptidão Física de São Caetano do Sul, em São Paulo, e assessor internacional do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte (3.000 membros), foi um dos 2.400 cientistas, médicos, psicólogos e pesquisadores de 140 países a participar do Congresso Olímpico de Los Angeles.

Jogando com o Regulamento

O brasileiro é esperto ou malandro?

Alguns dirão que é normal neste país as pessoas deixarem as coisas para a última hora e, como o serviço público é burocrático ao extremo e muito lento, com isso abrem-se as “oportunidades” àqueles que querem “vender facilidades”. Outros vão dizer que o brasileiro gosta de se mostrar “esperto” e conseguir mostrar a todos que tem “bons contatos” para conseguir resolver os diversos problemas relacionados à área pública. Neste caso, ser “esperto” é ser “in”. E não pagar intermediários é ser “out”. 

Entendo o seguinte: só existe o corrupto se existir o corruptor ou alguém interessado em fazer as coisas de outra forma, que não de acordo com os passos legais e corretos. Mas, será que isso é apenas uma ilusão? Será que as pessoas trocariam a comodidade e a rapidez de pagar um intermediário para darem exemplos para nós mesmos e para os nossos filhos de como este país poderia e deveria ser? Será que somos tão individualistas a este ponto e será que a sociedade do “levar vantagem em tudo” já não permite que existam gestos como estes?  

O rancor dos brasileiros não era apenas contra a arbitragem polêmica do duelo. O ponteiro Murilo ainda guardava na memória as críticas do povo italiano contra a forma que a Seleção perdeu para a Bulgária, quando poupou alguns jogadores importantes como ele próprio e o levantador Bruno, que teve de ser substituído pelo oposto Théo, já que Marlon ainda se recuperava de uma doença no intestino. “Não foi apenas a nossa justiça, mas a de todo mundo. A imprensa italiana falou que a Rússia foi alvo da justiça por ficar fora da briga pelo título porque escolheram o caminho mais fácil. E o que foi hoje? Se não foi justiça, eu não sei o que é. Porque teve alteração nos grupos, no ranking e eles tiveram o caminho mais fácil. Eu acho que, se realmente foi feita justiça, fizemos por todo mundo”. O meio de rede Rodrigão preferiu amenizar o fato. “Eles não tiveram culpa não são eles que escolhem isso aí, são os dirigentes. Os jogadores não têm culpa do que aconteceu. A gente jogou para ir para final. Passou, importante é que cumpriu nosso primeiro objetivo”. 

Geração de Prata. Resultados do Brasil nas Olimpíadas de 1984, Los Angeles (EUA). Considere-se que houve boicote dos países socialistas liderados pela Rússia. 

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Brasil x Argentina     3x1 15x8  15x8  16x18 15x13
Brasil x Tunísia       3x0 15x5  15x9  15x2
Coreia do Sul x Brasil 1x3 4x15  13x15 15x13 8x15
Brasil x EUA           3x0 15x10 15x11 15x2
Brasil x Itália        3x1 12x15 15x2  15x3  15x5
EUA x Brasil (final)   3x0 15x6  15x6  15x7
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Noticiário jornalístico. Depois da derrota inesperada contra a Coreia do Sul, o Brasil voltava à quadra com a obrigação de vencer os Estados Unidos para poder passar para as semifinais. Veja relato jornalístico brasileiro da época:

“Quando pisou a quadra, o sexteto brasileiro sabia que precisaria jogar tudo o que sabia e, ainda recorrer à garra para obter a vitória obrigatória. O Brasil ganhou por 3 a 0, com parciais de 15×10, 15×11 e 15×2. O segundo set foi o mais longo disputado pelo Brasil em Los Angeles: durou 46 min. Surpreendentemente, o terceiro set foi o mais fácil de toda a Olimpíada para o Brasil, que repetiu o 15 a 2 que impôs à fraca Tunísia. Os Estados Unidos não esboçaram qualquer reação diante da superioridade brasileira. Este set durou 24 min. Foi uma partida perfeita e que levantou o moral dos brasileiros para a fase semifinal. Era a decisão da medalha. Passando pela Itália, o Brasil teria garantido uma medalha: de prata ou de ouro. O time ganhou de 3×1, com parciais de 12×15, 15×2, 15×3 e 15×5. A derrota para os Estados Unidos por 3×0, com parciais de 6×15, 6×15 e 7×15, não refletiu a realidade do atual estágio do vôlei masculino brasileiro. Sem tirar o mérito dos campeões, o fato é que o Brasil jogou mal e, normalmente, não perderia com tanta facilidade para a equipe norte-americana ou qualquer outro adversário, como aconteceu na final de dia 11 de agosto, pela decisão da medalha de ouro. Nesta partida, a seleção dos EUA devolveu a derrota sofrida na fase inicial dos Jogos. Nada deu certo para os brasileiros, enquanto os norte-americanos estiveram sempre muito bem”. 

Malandragem Brasileira. E agora, atente para um breve comentário sobre essas duas partidas entre Brasil e Estados Unidos, contada pelo Dr. Victor Matsudo ao repórter Zuba Coutinho em entrevista à revista Placar, de 7.9.84, pág. 37-40:  

– “No vôlei, os EUA entregaram o primeiro jogo contra o Brasil por decisão de um psicólogo. Mas este é apenas um dos segredos que a Olimpíada esconde”. O senhor esteve hospedado na casa do psicólogo-chefe da equipe americana. Descobriu algum “segredo de Estado?”
– O Professor Briant Cratty é o maior autor americano na área de Psicologia do Esporte e teve sob sua orientação a maioria dos profissionais que trabalhavam diretamente com as equipes americanas. Então vou contar algo que soube ali sobre o jogo de vôlei contra os brasileiros. A assessoria psicológica americana sabe que o atleta latino reage de forma diferente diante de um confronto altamente difícil e de outro apenas pouco difícil. Um dos maiores problemas que nós, brasileiros, enfrentamos são as decepções que sofremos nas quadras ou nos campos de futebol, quando diante de equipes reconhecidamente inferiores, ou quando poderíamos opor maior resistência numa partida e misteriosamente jogamos mal e somos derrotados. Então, em função de terem perdido os dois primeiros sets por 15×10 e 15×11, numa noite em que o Brasil apresentou uma de suas melhores atuações, os psicólogos sugeriram que os Estados Unidos entregassem o terceiro set para que, numa possível final, os brasileiros estimassem que as dificuldades para ganhar a medalha de ouro fossem menores que as reais. Nesta final, o Brasil acabou enfrentando um Estados Unidos bem mais forte que o esperado e que apresentou muitas jogadas que antes procuraram esconder dos brasileiros. Eles, ao contrário, conheciam todas as nossas bolas e o nosso potencial. Depois dizem que nós somos os reis da malandragem”.