
Psicologia no Esporte
Conforme o prometido, aqui está parte da entrevista do Dr. Victor Matsudo, um dos 2.400 médicos, psicólogos e pesquisadores de 140 países presentes ao Congresso Olímpico de Los Angeles, em 1984 (Zuba Coutinho, revista Placar, 7.9.84, pág.37-40).
– A psicologia esportiva conheceu grandes avanços nos últimos anos?
Quando o nível técnico é muito elevado, como acontece, por exemplo, numa Olimpíada, é que todos os atletas evidentemente são pessoas favorecidas geneticamente e devem ter também técnicos altamente capazes que as fizeram chegar a esse nível. De maneira que a decisão de quem vai ganhar a prova fica dependendo não de fatores orgânicos ou técnicos – todos são de alto nível – mas dos fatores psicológicos. Numa competição comum, é provável que uma pessoa que não esteja bem psicologicamente consiga se sobressair, mas em alto nível a condição psicológica acaba sendo um fator importante. O trabalho feito pelos psicólogos das equipes americanas era o mais democrático possível. Eles ficavam à disposição dos atletas e, quando havia o contato, faziam um serviço de apoio e não uma psicologia intervencionista, dessas que querem mudar a personalidade do atleta e são responsáveis pela má acolhida que os psicólogos têm no esporte. Uma novidade foi também o trabalho de abordagem dos psicólogos, que procuravam trabalhar em cima de suas falhas. Outra coisa muito utilizada foram as técnicas de autorrelaxamento, técnicas de ioga.
– Moses foi visto deitado na pista, momentos antes de uma largada.
Este é um bom exemplo. Ricardo Prado também possui uma técnica de relaxamento muito adequada. A máxima performance de um indivíduo só é conseguida na medida em que ele se abstrair ao máximo e se concentrar ao máximo no ato motor que está programado para executar, especialmente em esportes individuais. Atletas que não possuem o poder de concentração, nessas modalidades, não têm a menor chance de ser bons atletas a nível internacional.
– Mary Lou Retton teve algum trabalho especial de psicólogos?
Até a Olimpíada, ela teve o trabalho normal do grupo que assessorou todas as equipes americanas. Agora, um psicólogo irá trabalhar com ela, especialmente para combater a fobia do sucesso – que é um dos maiores problemas das performances de alto nível. Após um estrondoso sucesso, a pessoa sempre se pergunta: “E agora, será que nas próximas vezes chego lá?” Além disso, surgirão problemas com uma menina que passará a ganhar mais que toda a família junta.
– O psicólogo passou a ser mais aceito, a ter mais poder nas comissões técnicas?
A imagem do psicólogo maluco que quer mudar o comportamento do atleta provocou muitas rejeições nos meios esportivos, mas agora está mudando. O novo psicólogo ajuda o atleta a modular sua energia, suas reações, a enfrentar arbitragens, longos períodos de concentração fora de casa, plateias hostis, ou a expectativa da torcida, como aconteceu com os norte-americanos.
– O senhor esteve hospedado na casa do psicólogo-chefe da equipe americana. Descobriu algum “segredo de Estado”?
O professor Briant Cratty é o maior autor americano na área de psicologia do esporte e teve sob sua orientação a maioria dos profissionais que trabalhavam diretamente com as equipes americanas. Então vou contar algo que soube ali sobre o jogo de vôlei contra os brasileiros. A assessoria psicológica americana sabe que o atleta latino reage de forma diferente diante de um confronto altamente difícil e de outro apenas pouco difícil. Um dos maiores problemas que nós, brasileiros enfrentamos são as decepções que sofremos nas quadras ou nos campos de futebol, quando enfrentamos equipes reconhecidamente inferiores, ou quando poderíamos opor maior resistência numa partida e misteriosamente jogamos mal e somos derrotados. Então, em função de terem perdido os dois primeiros sets por 15×10, numa noite em que o Brasil apresentou uma de suas melhores atuações, os psicólogos sugeriram que os Estados Unidos entregassem o terceiro set para que, numa possível final, os brasileiros estimassem que as dificuldades para ganhar a medalha de ouro fossem menores que as reais. Nesta final, o Brasil acabou enfrentando um Estados Unidos bem mais forte que o esperado e que apresentou muitas jogadas que antes procuraram esconder dos brasileiros. Eles, ao contrário, conheciam todas as nossas bolas e o nosso potencial.
