Intercâmbio Lusófono

Foto: CEV

Trata-se de um texto dirigido a todos, mas no meu coração veio-me a vontade de escrever às jovens atletas lusitanas (foto) que representaram o seu país em mais uma jornada europeia entre seleções. Sinto-me profundamente tocado em prestar-lhes algum serviço, por mais insignificante que seja. Isto me conforta e anima em minha missão.  

Já não mais consigo ver uma partida de voleibol ou fotos sem que procure descortinar uma lição. Lembram-se do joguinho dos 7 erros? Dessa forma, tenho uma galeria alentada com corpos atléticos, bronzeados, na quadra ou na areia, buscando tocar na bola em defesas incríveis e, às vezes, impossíveis. Mas, por que impossíveis? Não seria o caso de uma vez que não conseguimos levar a efeito uma defesa por que não incrementarmos nossos treinos na busca da perfeição, o gesto técnico perfeito? O que nos falta neste momento para conseguirmos nossos objetivos? Nesse instante acabo de assitir à partida entre o Cruzeiro e o Vôlei Futuro pela excelente Liga Nacional brasileira e constato que a visão dos treinadores está exclusivamente voltada para as formas de ataque; falar em treinar defesa parece ser algo do outro mundo. A justificativa, nada racional, reside em treinar bloqueios e “forçar” os saques para desestabilizar o passe adversário. No entanto, por que se erra tanto em tais fundamentos? 

O primeiro caminho, necessariamente, deveria passar por uma conversa com o seu treinador. Se ele não conseguir ajudá-la nas suas conquistas individuais, faça você mesma. Aprofunde-se em estudos e observações, consulte outras pessoas mais experientes e, por sua conta e empenho, desenvolva os exercícios que a levarão a um talento muito mais refinado em pouco tempo. Acredite, já o fizemos e fomos felizes quanto aos resultados. Lembre-se do Oscar (basquete), do Zico (futebol) e tantos outros, que ficavam horas após os treinos a se exercitarem repetitivamente várias horas, dia após dia. O talento não surge sem muito suor, ele pode ser conquistado e você certamente é um deles. Uma dica importante é “você tem que aprender a pensar”. Quanto ao seu professor ou treinador, disse Henry B. Adams, “Um professor afeta a eternidade, ele nunca sabe em que ponto cessa a sua influência”. Por essas e outras, aprenda a ser uma crítica do seu próprio fazer. Perceba que atualmente é dificílimo realizar esse feito, uma vez que desde a Formação os treinadores “especializam” seus jovens atletas, obedecendo a cartilhas ou receitas técnicas. Infelizmente, a conduta (metodologia) desses treinadores é referida tão somente para “vencer”, pois garante o seu emprego e acrescenta uma estrela no seu currículo. Assim, cuidado na escolha de seu condutor: o mais capaz ou o que tem melhor currículo? Normalmente, o melhor deles não se preocupa com as vitórias, mas com o indivíduo que está a aprender.   

Venho acompanhando o voleibol em Portugal – vejam “Formação de Treinadores em Portugal” – há algum tempo através do site sovolei, do qual sou um modesto colaborador para assuntos técnicos. Realmente é difícil ter a compreensão do que ali se passa, mas percebe-se que é chegado o momento de possíveis mudanças no setor técnico. E, nessa oportunidade, estou a oferecer-lhes algum conteúdo para o que se poderia chamar um Olhar Pedagógico, especialmente para aqueles que entenderem que qualquer renovação há que passar obrigatoriamente pelos jovens aspirantes a atletas de ponta. E, naturalmente, pelos seus treinadores e professores colegiais, responsáveis pelo planejamento metodológico que vão contribuir para o bem ou para o mal, isto é, para que se interessem pela matéria, ou deixem-na de lado para sempre.  

Você se torna inteligente graças aos seus erros (provérbio alemão) 

Com efeito, compus pela vez primeira um exercício pedagógico, para a qual convido-os todos a participar – treinadores, observadores, curiosos, interessados, atletas, especialmente as jogadoras da equipe portuguesa em destaque na partida que realizaram há pouco contra a Grécia. Estariam interessados? Bem, se somente um de vocês conseguir romper essa verdadeira barreira cultural, estarei realizado e dou-me por satisfeito. Vamos tentar? Que tal se agruparem e fazer o “dever de casa”, isto sem dúvida contribuirá para o seu desenvolvimento de forma inimaginável, isto é, estaremos todos aprendendo a ver e a pensar sobre aquilo em que estamos atuando diariamente.  Aliás, não pensem que sei, pois este exercício é também para mim muito mais do que possam imaginar… Assim, passemos então a descobrir na foto os detalhes – certos ou errados – que devem estar presentes na cabecinha de cada atleta diante de uma situação de jogo. Para facilitar nossa comunicação, numerem as seis fotos de cima para baixo, da esquerda para a direita e descrevam (o quanto for necessário) o que vêem e o que sugerem para treinar. 

Foto 1 – ……………………………….   Foto 2 – ………………………………   

Foto 3 – ………………………………    Foto 4 – ……………………………..

Foto 5 – ………………………………    Foto 6 – ……………………………..

 Em outra oportunidade falarei sobre minha primeira (e frustrada) tentativa de aproximar brasileiras e portuguesas em idade da Formação com uma Faculdade (e colégio) ligada ou mantida pela Lusófona em São Gonçalo, região metropolitana do Grande Rio. Enquanto isto, percebam os professores/treinadores o alcance desse intercâmbio. Por este motivo, não desistirei tão facilmente. Aguardem.

Olhar Pedagógico

O Olhar Pedagógico de José Saramago 

Atleta defende ataque adversário. Nota-se: 1) altura que elegeu para tocar na bola; 2) o toque usando o punho e o antebraço; 3) fez a opção de se lançar à frente antes do toque. Foto Fivb/Divulgação.

(…) “Olhar, ver e reparar são maneiras distintas de usar o órgão da vista, cada qual com a sua intensidade própria, até nas degenerações, por exemplo, olhar sem ver, quando uma pessoa se encontra ensimesmada, situação comum nos antigos romances, ou ver e não dar por isso, se os olhos por cansaço ou fastio se defendem de sobrecargas incômodas. Só o reparar pode chegar a ser visão plena, quando num ponto determinado ou sucessivamente a atenção se concentra, o que tanto sucederá por efeito duma deliberação da vontade quanto por uma espécie de estado sinestésico involuntário em que o visto solicita ser visto novamente, assim se passando de uma sensação a outra, retendo, arrastando o olhar, como se a imagem tivesse de produzir-se em dois lugares distintos do cérebro com diferença temporal de um centésimo de segundo, primeiro o sinal simplificado, depois o desenho rigoroso, a definição nítida…” (Walter Lúcio de Alencar Praxedes)

Verdade

A nossa forma de apreender e pensar o mundo até hoje continua a ser, em grande medida, pelas leis da lógica clássica, também denominada lógica aristotélica. “A verdade de um nem sempre é a verdade do outro, por isso verdade não é realidade, mas sim como uma pessoa vê o mundo”. Esta é considerada uma verdade subjetiva, ou também chamada verdade individual.  Como objeto de estudo, somente a verdade objetiva e universalmente aceita é válida. É controversa a ideia de que não exista uma verdade objetiva. A ideia de sua não existência é um princípio filosófico chamado solipsismo. (Wikipédia)

Olhos de ver e olhos de enxergar.  Estive apreciando pela televisão as duas partidas em que o Brasil enfrentou Porto Rico pela Liga Mundial em nosso solo. Uma transmissão excelente quanto ao equipamento técnico da emissora, inclusive com as novas câmeras com imagens ultra lentas e muitas repetições. Através delas, olhos pouco acostumados com o jogo podem ter uma aula do que acontece ao vivo, isto é, erros e acertos dos intervenientes. De certa forma, permite aguçar o olhar com os repetidos zoons das lentes. Todavia, ao se apreciar qualquer partida transmitida pela televisão existem alguns aspectos que podem comprometer ou alterar a observação dos fatos, independentemente do fator emocional, a “torcida”: o locutor, o comentarista e o próprio espectador e, mais importante, a posição do “olho da câmera”.

Locutor – Invariavelmente é um indivíduo comprometido com a audiência e a emissora e, portanto, deve se esmerar em gentilezas e simpatias no trato com a informação e, principalmente, com os seus comentários. 

Comentarista – Convidado, quase sempre ex-atleta da modalidade, acostumado a ver o jogo de forma pragmática (não confundir pragmatismo com linguagem pragmática, ou seja, o estudo da linguagem pela forma que ela é interpretada em contextos práticos e levando em conta o contexto), certamente também comprometido com a linha traçada pela emissora. Noto ao longo do tempo que é instruído a elogiar, medindo as palavras, pois caso contrário a audiência pode ficar comprometida e, consequentemente, prejudicando os anunciantes que patrocinam as transmissões. 

Espectador – Este é variado, mas a grande maioria é daqueles que nunca jogaram voleibol (“eu era muito pequeno”) ou poucas vezes ousou praticar na escola, com certeza desanimados pelo próprio professor, especialmente as meninas, algo que perdura até hoje por incrível que pareça. Logo, é o que se pode chamar de “espectador de poltrona” que aguarda este ou aquele comentário para se iniciar nos próprios dizeres. São atletas passivos e eventuais, como grande maioria dos que se deslocam aos ginásios, especialmente a juventude, somente para “torcer” por seus ídolos. Daí o número de mulheres espectadoras.

O olhar dos espectadores: um mesmo lance com várias interpretações. Brasil vs. EUA, Liga Mundial; Foto: Fivb/Divulgação.

É óbvio, todos vêem qualquer jogo segundo sua ótica, ou interesse momentâneo. Se indagarmos a inúmeros espectadores presentes ao espetáculo sobre a exatidão de determinado lance que deixou alguma dúvida à arbitragem, inevitavelmente serão muitas as “verdades” de cada um, ou verdades subjetivas. Para prevenir ou atenuar erros, o árbitro de uma partida tem a seu serviço vários auxiliares: o 2º árbitro e 4 fiscais de linha, os bandeirinhas. E por que dissemos tudo isto?

Continuaremos a analisar determinados lances de uma partida de voleibol ainda que distantes do tempo, isto é, através de fotografias. É evidente que alguns descontos e cuidados serão considerados, pois não temos as cenas completas como num vídeo, além de perdermos a noção global, isto é, o ambiente. Estaremos, então, focando nosso olhar em um instantâneo. Reparem que as fotos se referem ao chamado alto nível, tendo sido clicados atletas campeões mundiais e olímpicos. Estaremos prejudicados na análise de ataques, pois seriam necessárias cenas em movimento. Assim, o enfoque vai para a parte mais negligenciada nos treinamentos e pouco prestigiada pelos brasileiros (e outros): a defesa. Relembro que já estivemos tratando do assunto á época dos Jogos Mundiais de 2010, no Japão e na Itália.

E dois lembretes: 1) quem quiser ver um jogo tecnicamente, deve postar-se atrás e não no meio (lado) do campo de jogo. Isto é válido para todos os desportos (se não estou enganado). No caso do voleibol, há lugares – cabeceiras da quadra – previamente reservados para os “espiões”: indivíduos previamente credenciados que efetuam filmagens e comentários para os técnicos. 2) em alguns momentos é interessante que os jogadores deixem momentaneamente a visão da bola e “vejam” a posição da equipe adversária, especialmente os atacantes. Somente os mais técnicos conseguem fazê-lo.