Antigamente…é o Tempo a Brincar com a Gente

 

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Acervo família de Bernard Armin Wohrle (Berne).

Antigamente vs. Atualmente

Na medida do possível estaremos brincando com o tempo, a memória e contando histórias. Além de ajudar a passar o tempo nessa época de férias, certamente estaremos passando algumas experiências para os professores mais argutos e curiosos, além é claro, de críticos.  Antes convém ilustrarmo-nos com alguns conceitos sobre aquela trilogia – Tempo, Memória, História. Tenham redobrada atenção e jamais desconsiderem a história e o tempo, ambos são nossos aliados. Lembrando Santo Agostinho:

Se nada sobrevivesse, não haveria o tempo futuro, e se agora nada houvesse, não existiria o tempo presente.

Portanto, não fiquemos parados, e esforcemo-nos para tirar bom proveito do tempo!

Memória e História 

Qual a relação entre História e Memória? Possivelmente o alcance da História seja muito superior ao da Memória. Por isto, quase sempre tenhamos a pretensão de construir nossa própria história através da memória e concluirmos que é a verdadeira. Ocorre que à história de cada um acrescentam-se muitas outras, e aí vamos unindo os retalhos, os fragmentos e compondo a História. O questionamento continua com a lembrança de uma afirmação de Henry James, datada do fim do século XIX:

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Ilustração: Beto Pimentel.

Representar e ilustrar o passado, as ações do homem são tarefas tanto de historiador como do romancista; a única diferença que posso ver é totalmente favorável a esse último (à proporção, é claro, do seu êxito) e consiste na maior dificuldade que ele encontra para reunir as provas que estão longe de ser puramente literárias.

O melhor caminho seria unir com ponderação provas e possibilidades, erudição e imaginação. Enquanto isto tentemos fazer um elo entre passado e futuro, entre o indivíduo e o seu grupo social.

Deu no Terra (5/jul./2013) – Murilo e sua recuperação.

Brasil Polônia indoor
Foto: Fivb/ Divulgação.

“Ainda sem clube para a próxima edição da Superliga, o ponteiro Murilo foi liberado para iniciar seu fortalecimento muscular após cirurgia no ombro direito realizada no início de maio. Agora, o jogador irá conciliar a fisioterapia com exercícios leves em uma academia”.

A notícia evocou-me certa lembrança em que passei por situação similar logo no início de minhas tentativas de me afirmar como atleta de voleibol no início da década de 60. Tive uma lesão no ombro esquerdo (possivelmente no tendão supra- espinhoso) que me impedia de erguer o braço. Como minhas cortadas eram realizadas somente com o braço esquerdo, o que me valeu um apelido de Roberto canhoto, estaria prejudicado de jogar por um bom tempo, a exemplo do Murilo. Acrescento que era de família pobre e não tinha qualquer recurso para frequentar um consultório médico. Então, o tratamento se resumiu em poupar aquele ombro e esperar que a natureza agisse. Mas a vontade de afirmação era imensa e me sufocava. Então, idealizei uma forma de treinar em que não solicitasse a articulação prejudicada e inventei formas de aprender a atacar com o braço direito. Treinando sozinho três vezes por semana com uma única bola (drible G-18, usada), após 2-3 meses conseguia jogar normalmente contra atletas até de seleção brasileira, somente usando o braço direito. Ao final, a recompensa: era o único atleta atacando bolas alternadamente com ambos os braços.

Gostaria de treinar o Murilo nesse período, pois sendo ele um profissional e com tanta assistência, teria sua recuperação garantida e de quebra, pouparia seu ombro acrescentando o outro em seu labor! Estou à disposição e até mesmo para atletas sinistros que queiram enveredar pelo meu exemplo ainda único, mas de fácil aprendizagem. Façam contato pelo Procrie, estarei sempre receptivo. Lembro aos mais novos que aquela circunstância fez-me autodidata, consequentemente, um atleta reconhecido como bastante técnico e perito para treinamento de canhotos, um nicho excelente para quem entende no Brasil da matéria. Quantos vocês conhecem que saberiam treinar um atleta com tal característica?

Voleibol de Antigamente…!

Indagaram-me por diversas vezes como era o voleibol antigamente, para logo afirmarem que o voleibol moderno é incrivelmente melhor e muito mais agradável de ser visto. Ora, se queriam declarar suas impressões, por que provocar quem está quieto? Reparem que é muito difícil, e talvez impossível, alguém discorrer sobre algo que não viu e tão pouco conhece: o tal do antigamente…! Além disso, o antigamente para uns é bastante diferenciado para outros, dependendo de tempo a que se reportam. Por exemplo, uma conversa entre um avô e o seu neto já rapaz, caso este último se exprima relatando suas experiências, o antigamente dele é consideravelmente diferente (muito mais próximo) do seu interlocutor, no caso, o seu avô. Por outro lado, cometem-se erros históricos ao compararmos fatos remotos à luz da memória, desprezando conceitos sociológicos contemplados na História. Outro, indagaria, “Qual seria a melhor seleção de futebol do Brasil, a de 1970 ou a atual, campeã da Taça das Nações?” Para analisarmos ou compararmos situações temporais devemos estar prevenidos quanto às verdadeiras armadilhas que nossa mente nos prega e para as quais pesquisas psicológicas nos fazem compreender e a adotarmos comportamentos condizentes. Uma delas é a nossa capacidade de raramente ficarmos perplexos. Se uma resposta satisfatória para uma pergunta difícil não é rapidamente encontrada, um dos nossos sistemas mentais encontrará uma pergunta relacionada que é mais fácil e que vai responder a ela.  Veja por quê!

Heurística (do livro Rápido e Devagar, Daniel Kahneman)

Tecnicamente, heurística é definida como um procedimento simples que ajuda a encontrar respostas adequadas, ainda que geralmente imperfeitas, para perguntas difíceis. A palavra vem da mesma raiz que heureca”. Quanto ao conceito: “O estado normal de nossa mente é que dispomos de sentimentos e opiniões intuitivos sobre quase tudo que surge em nosso caminho. Simpatizamos ou antipatizamos com uma pessoa bem antes de saber muita coisa sobre ela; mostramos confiança ou desconfiança em relação a estranhos sem saber por quê; sentimos que um empreendimento está fadado ao sucesso sem fazer uma análise. Quer afirmemos, quer não, muitas vezes temos respostas para perguntas que não compreendemos completamente, apoiando-nos em evidências que não somos capazes de explicar ou defender. (…) Substituir uma pergunta por outra pode ser uma boa estratégia para resolver problemas difíceis, e George Pólya (matemático húngaro, falecido), incluiu a substituição em seu clássico A arte de resolver problemas:

Se você não consegue resolver um problema, então há um problema mais fácil que você pode resolver: encontre-o.

Seleção Masculina de Voleibol

Como atua? Obviamente, é um indicador de como treina. As estatísticas devem (ou deveriam) indicar não só erros, mas também situações embaraçosas para o atleta e, então, avaliar sua atitude ou intervenção. Não creio no que os estatísticos de plantão realizam. Trabalham em um sistema graduado de 0 a 5, em que sua participação é julgar rapidamente e dar nota à intervenção do(s) atletas sob a sua atenção. Ou pelo menos, penso que é assim! Se não for, que me digam os próprios executantes. Aliás, vou consultar um deles.

Nota: soube por uma professora que trabalha em estatística, que é possível que as equipes tenham seus próprios estatísticos que forneceriam mais detalhes aos respectivos treinadores, inclusive das equipes adversárias.

Ocorre que o olhar humano permeado pela capacidade individual de observação de cada indivíduo, felizmente faz a diferença no momento da interpretação do que foi vivenciado em dado momento. O mesmo fato ocorrido em dado instante é visto de formas diferentes entre um grupo de indivíduos. Assim, p.ex., um locutor e um comentarista de Tv ao narrar ou comentar uma partida de voleibol terão sensações diversas sobre um determinado lance, até mesmo porque diferem em vivências anteriores. Como dizia o Padre António Vieira: Há olhos de ver e olhos de enxergar.

Lapsos de Memória 

Pode-se dizer que nossos processos de memória são análogos à forma como os computadores armazenam imagens, só que nossas lembranças têm a complexidade de fazer com que os dados da memória que armazenamos mudem com o tempo. Em síntese, consiste em lembrar a essência, preencher os detalhes, acreditar no resultado. Quando somos pressionados pelos repetidos pedidos de que nos lembremos de eventos, ou quando nos pedem muito para recriar uma lembrança, nós a reforçamos a cada vez, de modo que nos lembraremos da memória, não do evento. Como a memória muda com o tempo? Como se desenvolve a “memória grupal”, ou a “cultura”? Nessas histórias que a própria vida me contou sobressai uma relação que deve ser explorada na medida em que os documentos e relatos assim o permitam. Parece-me que o melhor caminho seria unir com ponderação provas e possibilidades, além é claro, de imaginação.

Em outra oportunidade, apresentaremos nova teoria sobre o envolvimento da Memória e a História, pinçado do livro Subliminar, como o inconsciente influencia nossas vidas, de Leonar Mlodinow. E para quem imagina seja uma leitura desagradável veja o que consignou Stephen Hawking a respeito: “Mlodinow é sempre feliz em seu esforço de tornar a ciência acessível e divertida”.

 

 

Memória e História

Foto: Fivb/Divulgação.

Valor da História… quando a história de um se soma a de tantos outros!

Uma notícia no site do Terra despertou-me a atenção para o tema à epigrafe. A reportagem tinha como título “Octacampeão sul-americano, Giba lembra primeira edição” e a foto reproduzida ao lado.

Recordo-me ter estado com o Giba – foi a primeira vez que nos falamos – em um jantar no salão do Hotel Evereste, em Ipanema, Rio, onde estava hospedada a delegação nacional. Era véspera dos jogos contra a Polônia pela Liga Mundial deste ano. Na ocasião apresentei ao Bernardo e a ele, Giba, um dos exemplares do livro que compus, “História do Voleibol no Brasil”. De ambos colhi palavras elogiosas e de incentivo e mais não poderia esperar, uma vez que o momento não comportava análises mais detalhadas. Como se diz, “dei o meu recado” e, agora, mais gente já sabe que o voleibol no Brasil transcende 1984, 1964 e recua pelo menos até 1939, por coincidência, o ano em que nasci. Estaria eu predestinado a escrever tais histórias? Devo confessar que quando adolescente, tive brigas com as professoras de História, pois não encontrava sentido prático no seu ensino.

Da reportagem, saliento o tópico que motivou tal crônica: “Capitão da Seleção Brasileira, o ponta Giba nem sempre teve tanta moral no time nacional. Em 1995, ele era apenas um jovem ao lado de ídolos como Marcelo Negrão, Giovane, Maurício, Tande, Carlão e Nalbert na disputa de seu primeiro Campeonato Sul-Americano. Nesta segunda-feira, aos 34 anos, ele começa a sua nona participação no torneio, em Cuiabá, já com oito títulos na bagagem. E diz ele: Ainda me lembro do primeiro, novinho, com 18 anos, jogando ao lado de grandes ídolos da geração de 92. Foi especial. Com certeza nunca vou esquecer deste Sul-americano. Lembro tudo, as pessoas, o ginásio em Porto Alegre, foi tudo muito bom”, declarou. Giba foi campeão no Rio Grande do Sul, da mesma forma como foi em 1997, na Venezuela, e a cada dois anos, na Argentina, Colômbia, Rio de Janeiro, Lages, Chile e novamente em solo colombiano. Nesse tempo todo, a forma como encaramos o Sul-Americano muda um pouco. No primeiro, lembro que era uma ansiedade enorme por estar ao lado dos meus ídolos e, com o nome já feito, depois de tantos anos, é natural que isso mude”.

Giba e Roberto Pimentel conversam sobre a História do Voleibol.

Decorridos muitos anos, revejo minha posição ao ter concluído duas obras de caráter histórico. A primeira, editada em 2008, conta como era a “Villa Pereira Carneiro”, seus costumes e detalhes das numerosas famílias da primeira metade do século passado. Foi ali que nasci e iniciei-me em vários esportes. Narro, inclusive, meu primeiro encontro com o Bené, que já realizava treinos aos sábados numa pequena quadra improvisada. E, já agora, esta verdadeira obra em dois volumes sobre a História do Voleibol no Brasil,  com pouco mais de mil páginas, fartamente ilustrada com fotos. Arlindo Lopes Correa, que me brindou com a sua apresentação, adjetiva a obra como enciclopédica e memorialista.

Por que teria eu mudado o meu modo de pensar a História?  Qual a relação entre História e Memória? Possivelmente o alcance da História seja muito superior ao da Memória. Por isto, quase sempre tenhamos todos a pretensão de construir nossa própria história através da memória e concluirmos que é a verdadeira. Ocorre que à história de cada um acrescentam-se muitas outras, e aí vamos unindo os retalhos, os fragmentos e compondo a História. Para entender um pouco mais fui buscar subsídios no historiador italiano Carlo Ginzburg, que transcrevo a seguir, e deixo a critério de cada um se devem se aprofundar no assunto. Enquanto isto estarei tentando fazer um elo entre passado e futuro, entre o indivíduo e o seu grupo social.

História, memória da humanidade?

Existe uma tendência entre confundir memória com história. Todas as sociedades possuem uma forma de relação com o passado e, por sua vez, possuem suas regras e técnicas. E estas precisam ser colocadas à prova de quando em quando para que se possa sempre distinguir o verdadeiro do falso. Esta é uma conquista da qual não devemos abrir mão. Um dos desafios da história é acertar sua relação com a literatura? A relação entre ambas é muito próxima. Os historiadores também são contadores de histórias, mas tentam contar histórias verdadeiras. É a relação entre o verdadeiro e o falso.

  • A escrita serve como suporte para a memória coletiva. O que fazer, quando a memória erra, confundindo pensamentos e gerando a contradição?
  • Na memória podem ser insinuados erros e o mesmo pode acontecer na história. É importante procurar corrigir esses erros, mas é importante também entender por que eles ocorrem. É preciso aprender a decifrar o erro e a verdade mais profunda que pode estar por trás desse erro.

Em que ponto podemos dizer que uma afirmação histórica está refutada? E o que significa dizer que algo está historicamente provado? Qualquer afirmação sobre a realidade histórica – mesmo a que diz que Napoleão Bonaparte existiu – vale até que alguém prove o contrário. Se aquelas afirmações não fossem sujeitas a falsificações (em linha de princípio teórico), seriam dogmas. Como considerar hoje essa ambição de retratar os indivíduos esquecidos pela história? Hoje eu insistiria ainda mais no estudo da relação entre o indivíduo e o grupo social ao qual ele pertence; uma relação que deve ser explorada concretamente na medida em que os documentos assim o permitem. Por que história é tão aborrecida? O questionamento continua com a lembrança de uma afirmação de Henry James, datada do fim do século XIX: “Representar e ilustrar o passado, as ações do homem são tarefas tanto de historiador como do romancista; a única diferença que posso ver é totalmente favorável a esse último (à proporção, é claro, do seu êxito) e consiste na maior dificuldade que ele encontra para reunir as provas que estão longe de ser puramente literárias”.  O melhor caminho seria unir com ponderação provas e possibilidades, erudição e imaginação.

Animou-me o desejo de retratar os indivíduos esquecidos pela história e o seu grupo social. Nessas histórias que a própria vida me contou sobressai uma relação que deve ser explorada na medida em que os documentos e relatos assim o permitam. Parece-me que o melhor caminho seria unir com ponderação provas e possibilidades, além é claro, de imaginação. Por fim, hoje vejo que encontrei resposta à indagação: “Por que estudar História”? Esclareço que não sou escritor e muito menos historiador. Apenas conto histórias…

Recomendo de forma carinhosa aos internautas e, particularmente ao Giba, retribuindo a gentileza que prestou à minha neta (foto), que façam uma visita neste Procrie à Categoria de História do Voleibol – “Primeira Participação Internacional”, “Origem do Voleibol na América do Sul”, “Intercâmbio na América do Sul” –  e percebam como teve início esse intercâmbio e os campeonatos sul-americanos. Não é muito, mas foi o que pude apurar para deixar registrado na memória e na história. Tomara que a CBV leve avante o projeto de criação de um Museu do Voleibol, a exemplo de alguns outros países.

Giba conduz a menina nos seus primeiros passos. Brasil e Coreia, 2010.

No futuro a menina da foto, então com 4 anos de idade, haverá de se lembrar desse momento. Assim, presto uma homenagem aos novos e aos antigos atletas que construíram o voleibol brasileiro, medalhistas ou não.