Experiência em trabalhos ativos: originalidade e liberdade
No final da década de 80 sugeri à coordenação do colégio Salesianos, de Niterói, a implantação do minivoleibol no recreio e horas vagas de seus alunos. Foram instaladas treze pequenas quadras que permaneceram até nossos dias, sempre disponíveis para a prática livre, fora do horário de aula e sem a presença de qualquer professor. Após breve período de adaptação com a novidade e a consequente aceitação, a Coordenação de Educação Física houve por bem definir a disponibilidade dos campos por séries, de forma a atender a demanda democraticamente. Mais adiante, foi-lhes sugerido organizarem torneios, que se tornaram um acontecimento inédito. E, ainda, sem a participação dos docentes. Regras, tabelas de jogos, tudo orquestrado pelos alunos. Promovi também uma reportagem inédita com a TV – Educativa no intuito de divulgar a metodologia e suas inerentes vantagens. Foi vinculada para todo o País.
Com o passar do tempo, registrou-se um fato concreto, comentado pelo experiente professor das equipes de voleibol do educandário: “A partir da instalação dos pequenos campos, os candidatos a integrarem nossas equipes já chegam jogando voleibol”.
Exemplos dessa natureza observei igualmente em clube da Zona Sul do Rio de Janeiro, onde instalei alguns campos para a prática do mini voleibol: as crianças, por si só desenvolviam destreza e habilidade no manejo da bola, raciocínio rápido e, ainda, uma inteligência tática muito aprimorada, capaz de encantar qualquer observador mais atento. Em suma, “aprendem sozinhos”, sem a presença do professor.
Estas são formas de como solucionar dificuldades para aplicação do ensino de um desporto – despertar o interesse e disponibilizar instalações e equipamento – a custo baixo. Basta ao professor, mesmo generalista ou com pouco conhecimento do voleibol, que indique aos seus alunos alguns dispositivos básicos – como organizar um torneio – para que adquiram a capacidade de se desenvolverem por conta própria.
Detalhes que fazem a diferença
Numa das aulas de apresentação da metodologia que emprego em outro educandário, observei alguns pequenos detalhes que revelam quase sempre a conduta pedagógica do estabelecimento. Nos momentos que antecederam a apresentação da classe, reparei o deslocamento quase militar dos 24 alunos sob a batuta de um dos professores de educação física. Até a entrega do grupo no ginásio onde realizaríamos a apresentação foi um silêncio constrangedor, em se tratando de crianças de 12-13 anos de idade. Após as devidas apresentações e com a presença da diretora iniciamos a aula.
Procedeu-se uma mudança brutal de comportamento, uma vez que os concitei a produzirem uma pequena algazarra com movimentos livres com a bola que cada um recebeu. Aos gritos, lançavam-nas ao alto, deixavam quicar no solo, entreolhavam-se sorrindo; dando sequência, sugeria outros movimentos buscando a espontaneidade de gestos, o que lhes parecia o paraíso. A seguir ia introduzindo novos elementos e exercícios. No entanto, não pude deixar de notar, havia uma única menina na arquibancada, muito agasalhada para o calor reinante. Inicialmente, sentara-se distante (5-6 degraus acima). Convidei-a a participar, mesmo sem o uniforme de ginástica, mas declinou gentilmente. A aula continuava agitadíssima e em dado momento pude ouvir um dos maiores elogios que um professor poderia receber por seu trabalho, ainda mais vindo de aluno que conhecera naquele instante. En passant, disse um para o outro: “Puxa, assim que tinha que ser as aulas de educação física do colégio!”. Sem perder a pose continuei meu trabalho e, mais uma vez, meu olhar posou na mesma menina da arquibancada que, agora, estava à beira da quadra e pude observar seu semblante de alegria e fervorosa vontade de estar ali brincando com os demais. Diante de novo convite discreto, disse-me: “Não posso participar, estou sem uniforme do colégio” (por isso o casaco). Ao que retruquei: “Venha assim mesmo”! Não resistiu e imiscuiu-se entre os colegas, divertindo-se a valer.
Um lembrete
“O sucesso individual é determinado pelo seu desejo (interesse), capacidade de ser ensinável e vontade de trabalhar”.
Uma regra escolar para favorecer o crescimento do aluno e sua liberdade (relativa) deveria ser a execução de uma atividade envolvente, o que o torna automaticamente disciplinado. Esta liberdade pode ser vista como a possibilidade do ser humano vencer obstáculos. Buscam-se técnicas pedagógicas que possam atrair TODAS as crianças no processo de aprendizagem, independentemente da diferença de caráter, inteligência ou meio social, lembrando que o conteúdo estudado no meio escolar deverá estar relacionado às condições reais de seus alunos e sua importância nas relações aluno-escola. Por ironia do destino, foi este mesmo colégio que freqüentei aos 11-12 anos de idade (1951-52) e, conforme relato na crônica anterior, foi ali que participei de torneios internos de basquetebol e dos Jogos Infantis. Embora a diretora seja a mesma daqueles momentos, quero crer que muita coisa mudou no educandário – para pior, infelizmente.
Dessa forma, propõe-se aos professores idealistas que estudem as condições concretas que estejam impedindo a realização de seus projetos. Uma proposta seria reinventar antigas formas de associação de alunos – o Centro Acadêmico, a Associação Atlética – que persistiram em alguns educandários até o final da década de 50. Seria uma solução para a falta de tempo dos docentes e economia para a instituição, uma vez que os próprios alunos poderiam se conduzir. E, como vimos no depoimento bem piagetiano do professor, “as crianças aprendem sozinhas”.
E você, tem alguma experiência neste sentido. Gostaria de tentar? Não conheço professor que tenha reclamado.

