Evolução Tática no Voleibol (II)

Brincadeira ou Negócio?

Inicialmente, e segundo a idéia de seu criador, o vôlei consistia em lançar a bola por sobre a rede, de um lado para o outro e tentar fazer com que ela não caísse no seu próprio campo. Não importavam quantos jogadores tivessem as equipes. As bolas eram, então, arremessadas com ambas as mãos.

O esporte evoluiu e, com as novidades técnicas surgiram as modificações no regulamento e o implemento de alterações táticas, agora visando a superar a defesa adversária. Os sistemas empregados nas diversas épocas custaram muito a ser assimilados e por isto perduraram por muito tempo. Foi o caso do sistema 3 x 3 (com três levantadores), que evoluiu para o 4 x 2 e, atualmente, o 5 x 1, consagrado por todas as equipes de ponta. O sistema 5 x 1, como vimos, já era utilizado pela equipe russa no mundial de 60, no Rio, mas só tomou vulto com a equipe japonesa e o seu levantador Nekoda, o melhor de sua posição no mundo. Inicialmente, justificava-se pela necessidade das combinações de ataque – fintas – que os chineses criaram (Mundial de 56) e os japoneses aperfeiçoaram sob o comando de Matsudaira (final da década de 60). Passou a ser o melhor sistema porque centraliza as jogadas num só levantador que percebe e desenvolve todas as características de seus companheiros. Cada um tem o seu jeito pessoal e o levantador se apercebe disto. A situação só era atenuada pela circunstância de que, também a equipe adversária usava o 5 x 1 e, por coincidências táticas e naturalmente, os levantadores coincidiam na rede, com ligeira diferença de um rodízio. A posição inicial – ordem de saque – em cada set sistematicamente era semelhante, apenas variando a posição do levantador, dependendo se o saque inicial pertencia ou não à sua equipe. Com direito ao saque, o levantador ocupava a posição (I ) defesa-direito, enquanto que o levantador adversário, a posição (II) ataque-direito.

Apesar dessa vantagem, existe um ponto fraco: na sua passagem pela rede – são três posições – o time fica somente com dois atacantes. O adversário obtém vantagem porque tem três jogadores no bloqueio contra apenas dois no ataque. Daí a necessidade de encontrar uma solução para atacar com, pelo menos, três jogadores e conseguir equilibrar a situação.

Ataque de fundo. Desenvolveram-se, então, as jogadas de ataque com um jogador que vem do fundo da quadra – o jogador apenas não pode pisar na linha dos três metros, mas pode saltar sobre ela para atacar. No Mundial da Itália, em 78, a Polônia começou a executar esta jogada com Tomasz. Só que era uma bola muito alta que, inicialmente, resolveu o problema, mas começou a ser anulada a seguir. Bebeto deu início ao treinamento e a execução das jogadas de velocidade de fundo de quadra em 1981, no Mundial juvenil, com Xandó. Então, passamos a atacar com três também nas posições em que o levantador estivesse na rede. No Brasil, denominava-se “líbero” (livre) o jogador com esta missão. Ele já sabia que ia atacar e, por isto, ficava fora da recepção do saque, invariavelmente, próximo à linha demarcatória da quadra. Muitos países passaram a adotar esta jogada, destacando-se: Cuba… Joel Despaigne, inclusive durante o Mundial do Rio, em 90; Itália… Zorzi, campeão mundial em 90 e destaque da sua equipe; Holanda… Zwetzer, também o maior destaque holandês nos anos 90; Brasil… Marcelo Negrão, Xandó e Renan.

O mais impressionante ataque de trás era feito por Giovane, em bolas praticamente chutadas, pelo meio da rede logo após as Olimpíadas de 92. Infelizmente, essa jogada não tinha a frequência que merecia ter, só alcançando efetividade no final do século. Era perfeita e de muita precisão. Somente muitos anos depois teve início o mesmo tipo de jogada – ataques de fundo – com equipes femininas. No Brasil, Isabel talvez tenha sido a pioneira, nos idos de 1983, na Universíade do Canadá, segundo declaração de Ênio Figueiredo ao Autor no MAM – Museu de Arte Moderna, durante coquetel de lançamento do jogo Brasil x Rússia (Maracanã). Atualmente, a seleção feminina realiza com eficiência todas essas variações. A linha de ataque foi ampliada em razão desse tipo de ataque: linhas tracejadas (1,75m) que facilitam a visão da arbitragem nos ataques realizados pela lateral da quadra.

Influência japonesa. Quando de sua estada no Brasil, em 1975, Matsudaira deixou como legado um filme em cores (16 mm, de aproximadamente 20 min), que a Federação japonesa produziu e distribuiu ao mundo. Trata-se de uma excelente produção, que resume o trabalho realizado ao longo dos oito anos de preparação, rico em aspectos marqueteiros e comerciais, pois “vendiam” cursos e davam aulas ao mundo. Vários brasileiros fizeram estágio no Japão – Paulo Márcio, Bebeto, Sérgio Pinto, José Roberto, entre outros. Este único exemplar é da CBV, mas o Autor (Roberto Pimentel), com autorização da entidade, produziu duas cópias telecinadas (vídeo).

Detalhe marcante dessa influência foi o cumprimento entre os atletas a cada jogada. Transformado em incentivo, mesmo quando falhava, o jogador era estimulado pela sua participação no lance. Entre os homens consagrou-se o simples tapinha de mãos por todos os seis atletas em quadra. Entre as mulheres, além daquele toque de mãos, um grande abraço estimulante e cativante. Atualmente, também os homens se abraçam a cada ponto a favor. Finalmente, também foram os japoneses que contribuíram para o entendimento entre o único levantador e os cinco possíveis atacantes: as jogadas ensaiadas em exaustivos treinos são “decodificadas” por sinais realizados com as mãos momentos antes do saque adversário.

Jogadas de defesa. Embora tenha sediado o I Campeonato Sul-Americano em 1951 e participado dos II Jogos Pan-Americanos (1955) no México, o Brasil realmente deu início ao seu intercâmbio esportivo quando de sua participação no III Mundial (1956), em Paris e, a seguir, em 1960, no Rio de Janeiro. Apesar disto, permanecemos durante longos anos – até o início da década de 80 – bastante distantes dos grandes centros do voleibol – países socialistas – e, assim, ressentidos de técnicas mais refinadas para alavancar o pretendido desenvolvimento. A este respeito, nosso querido e saudoso Adolfo Guilherme, mineiro, dez vezes técnico de seleções brasileiras se ufanava de ser o “introdutor no Brasil de todas as inovações do voleibol europeu” (Volibol, à Beira da Quadra).

Bloqueio duplo. A partir de 1938 os tchecos introduziram os bloqueios nas regras baseados no conceito de “bloquear com um ou dois jogadores adjacentes”. Por quase 20 anos o bloqueio foi uma parte do jogo NÃO incluído nas regras. Foram imediatamente seguidos pelos russos, uma vez que o novo invento facilitava sobremaneira a tarefa dos defensores e, por isso, aceito por todos como “jogada de defesa”. Também foi destaque na imprensa carioca a “descoberta” da nova Chave (nova técnica, terminologia empregada pelos atletas de basquete na época) de bloqueio no campeonato carioca de 1946. Veja a seguir reportagem vinculada na imprensa: “Chave inédita. Como noticiado pela imprensa, fazendo jus à foto, os atletas do Fluminense empregaram uma nova chave de bloqueio: o bloqueio duplo. A chave parece ter dado certo ao longo de todos esses anos”.

Manchete. Outra invenção tcheca de 1958, considerado um excelente golpe de defesa e denominado inicialmente de bagger. Quando empregado inicialmente, assombrou os espectadores no Campeonato Europeu, em Praga. Logo foram copiados pelos russos, aperfeiçoado pelos japoneses e consagrado seu uso internacionalmente nas Olimpíadas de Tóquio, em 1964. O atraso no Brasil uma vez mais se pronunciou quando da realização dos primeiros jogos do campeonato carioca após as olimpíadas: as arbitragens cobravam dos atletas um fundamento que jamais tinham visto. Foi um desastre! Felizmente, o brasileiro logo assimilou a sua técnica de execução, assim mesmo, os mais novos. Dos antigos jogadores, mesmo os da seleção presentes no Japão, nenhum deles incorporou a sua técnica.

Peixinhos. Quanto aos saltos, quando bem executados, careciam de maior proteção ao atleta – joelheiras e piso – já que o atleta toma uma posição de mata-borrão, isto é, desliza no solo com a barriga, tendo tronco e pernas estendidas para o alto e para trás. Tentou-se sua introdução no Brasil, mas logo rejeitada inclusive por uma série de acidentes, uma vez que os pisos de madeira ofereciam perigos constantes. Somente com o piso emborrachado retornaram ao seu uso, mesmo assim, sem muita eficiência prática.

Jogadas de ataque. Definir em palavras as jogadas de ataque de um time de vôlei é tarefa praticamente impossível. Por isso, são utilizados gráficos que mostram as suas principais jogadas. Para acompanhar os gráficos acompanhe o pequeno glossário abaixo. Cada gráfico indica a possibilidade de jogadas para aquele momento, cabendo ao levantador fazer a escolha. Importante lembrar que os jogadores de primeira bola não batem, apenas fazem fintas, enquanto os jogadores assinalados com um círculo não recepcionam o saque e realizam o ataque do fundo de quadra:

Entrada de rede – posição do jogador que sai do fundo da quadra (V) e vai para a rede (IV) quando o time roda no saque; visto do fundo da quadra, é o lado esquerdo da rede.

Saída de rede – posição do jogador que, quando o time roda, vai para o saque. Visto do fundo da quadra, é o lado direito da rede.

Primeira bola – é a bola, nas jogadas de finta, em que o jogador engana o bloqueio ao simular bater e deixa para um companheiro.

Bola de tempo – o cortador salta antes da bola chegar às mãos do levantador, que a lança (levanta) para o ponto em que o braço do cortador está passando. A rapidez com que é executada dificulta o bloqueio, que tem que subir junto com o atacante.

Bola chutada no meio – bola de tempo executada não muito próxima ao levantador.

Bola chutada na ponta – é uma bola rápida, mas não é de tempo. Executada na entrada ou saída da rede.

Bola se segurança – a bola é levantada alta na ponta. Ocorre normalmente quando o passe recebido pelo levantador não é bom, isto é, não chega à posição do levantador.

Dismico – a segunda bola é levantada logo atrás do jogador que vai na primeira bola.

Dismico da chutada – quando é executada com uma bola chutada.

Aquela – o jogador que vai na primeira bola como se fosse bater chutada no meio. Outro jogador (da 2ª bola) bate entre o da primeira bola e o levantador.

Terminologia

Finta – corresponde, no vôlei, ao drible no futebol. A intenção é a mesma: enganar o adversário. Só que, no caso, simulando os movimentos de pernas e braços preparatórios para a impulsão, para que o bloqueio adversário salte. Fintar, na linguagem dos jogadores atuais é também “dar um tempo”, no sentido de aguardar o tempo que o adversário gasta ao subir para fazer o bloqueio e,  só então, pular para atacar num tempo diferente e posterior ao adversário.

Bola de tempo ou mexicana – jogada rápida, na qual o atacante já se encontra no ar quando a bola chega às mãos do levantador. Este arremessa uma bola chutada – com relativa força, em trajetória quase reta, para encontrar o atacante em posição de cortar. Atacante e levantador se colocam bem próximos para executar esta jogada. Basicamente, a bola é levantada de baixo para cima, numa vertical. Utilizada quase sempre com o atacante de meio de rede.

Bola de fundo – ataca um dos jogadores que se encontra na zona de defesa. Jogada utilizada geralmente quando o levantador está na rede (posições II, III e IV do rodízio) e, em conseqüência, só tem dois outros atacantes ao seu lado como opção para a jogada. O jogador que está na defesa é obrigado a pular de trás da linha de três metros que separa as zonas de ataque e defesa.

Dismico –  um atacante, geralmente o meio de rede, puxa o tempo (salta e faz a finta, atraindo o bloqueio), enquanto outro, quase simultaneamente, vem por trás e bate na bola, pegando o bloqueio já caindo.

Aquela, ou between – o jogador do meio da rede pula para atacar a bola chutada, mas quem conclui o ataque é o jogador da entrada (posição IV), que se desloca e bate entre o levantador e o atacante do meio. O bloqueio normalmente acompanha a finta do jogador de meio e o outro bate sem marcação.