Aspectos Legais – II

Erro de Direito e Erro de Fato – II

Decorridos 24 anos, e sem entrar no mérito do julgamento, vejam como procedeu e julgou o Tribunal de Justiça Desportiva caso similar de W. O. constante da Nota Oficial nº34/84, de 22.5.1984.

Processo nº 32/84 – Acórdão. “Rigidez no cumprimento das normas legais pode evidenciar, quando muito, excesso de zelo, mas nunca erro de direito. A faculdade do (de o) árbitro em retardar uma partida é condição essencialmente subjetiva, cabendo a ele avaliar e decidir”.

Do Relatório. Atlântica Esporte Clube e Botafogo F. R. cumprindo a tabela pelo campeonato Estadual Juvenil masculino, deveriam competir em rodada dupla, sendo o mando de campo da primeira. Terminado o jogo preliminar que reuniu a equipe da própria Atlântica, o primeiro árbitro foi informado por dirigentes do clube local que o jogo seria realizado em outra quadra, junto à anterior. Dirigiu-se à quadra objeto da mudança em companhia dos atletas do Botafogo e alertou dirigentes da Atlântica que o tempo corria desde o término da partida anterior. Aguardou os 15’ (quinze minutos) regulamentares contados do término da preliminar e constatando a impossibilidade de iniciar o jogo pela ausência da relação e súmula, obrigações de fornecimento pela Atlântica que tinha o mando de campo, aplicou o W.O. à mesma, quando então, logo após, compareceram os atletas da Atlântica em uniforme ainda de aquecimento e fizeram-lhe chegar às mãos a relação e a súmula. Inconformada com o resultado decorrente da aplicação do WO, a Atlântica intentou recurso que foi apreciado pelo Tribunal, tendo havido, ainda, a intervenção requerida pelo Botafogo, como terceiro interessado, entendido na lide como litisconsorte no polo passivo.

Da Decisão. Vistos e relatados os autos, após o depoimento do primeiro árbitro e os debates orais, houve o Tribunal manter o W.O. por maioria de seus membros, negando provimento ao recurso (5×2). Assim agindo, entendeu esta Corte, em analisando a documentação acostada aos autos, a douta argumentação dos ilustres patronos das entidades e o depoimento do primeiro árbitro, que o mesmo agira estritamente dentro dos preceitos emergentes do Regulamento da FVR, de forma rígida, mas jamais desprovida de legalidade. Comprovada em audiência que a comunicação da mudança de quadra foi oficialmente solicitada pelo Clube que tinha o mando de campo, caberia a ele oferecer condições dentro do prazo estatuído no Regulamento, para que o jogo se iniciasse, fazendo chegar às mãos da autoridade e representante da FVR naquele ato – o primeiro árbitro – o material, bem como a presença de seus atletas, o que efetivamente só ocorreu após esgotar-se o tempo previsto. Inflexível no cumprimento ao que dispõe a legislação esportiva, seguiu o primeiro árbitro o axioma ita lex dicit, fato inclusive confessado oficialmente pela própria Atlântica, conforme declaração expressa às fls.2/3 nos autos, in verbis: “Não alertou ninguém quanto ao fato de ter passado a contar, com inexorável rigidez, o tempo decorrido entre o fim da preliminar e o horário britânico para o início do segundo jogo” (grifo nosso). Retardar ou não uma partida constitui faculdade do primeiro árbitro, e in casu, decidiu cumprir apenas o Regulamento, vez que dera ciência àquela filiada, alertando-a inclusive de que o tempo corria para que oferecesse condições de início de jogo.

Desta forma, comprovado que a Atlântica por sua exclusiva culpa e risco, deu causa ao resultado (W.O.), tornar-se-ia, mesmo, um contra-senso jurídico, beneficiar-se, através do recurso, de sua própria desídia no cumprimento dos preceitos constantes no Regulamento Geral da FVR.

P. R. I. – Rio de Janeiro, 18 de maio 1984

ass.)      Dr. José Humberto Mendes Barbosa – Presidente   –   Dr. Jacob Zajdhaft – Juiz Relator.

Aspectos Legais – I

Erro de Direito e Erro de Fato – I

Assunto palpitante há algum tempo, as análises e julgamentos a respeito do que seria erro de direito e erro de fato nunca foram suficientemente explicadas. Mesmo para treinadores e atletas mais esclarecidos o assunto era deixado de lado, cabendo tão somente ao Departamento Jurídico do filiado se pronunciar a respeito. Tão logo fosse julgada a questão, seria fato passado. Todavia, conforme o Relator que expôs o Acórdão a seguir, presume-se que o árbitro de uma partida desportiva saiba discernir e interpretar a lei constante das Regras e Regulamentos. O caso que se apresenta ocorreu numa partida pelo campeonato da FMV entre dois filiados. Ocorre que por algum motivo o árbitro só deu início ao jogo após alguns minutos além do tempo regulamentar. Terminada a partida, a equipe perdedora fez consignar na súmula protesto pela validade daquele resultado. O caso, então, foi encaminhado ao Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Metropolitana de Volley-Ball (FMV) que, em reunião de 11 de maio de 1960, analisou e julgou matéria analisada no Processo nº 12, em que o filiado América F. C. protestou contra a validade do jogo realizado em 27 de abril de 1960 com o Botafogo de Futebol e Regatas, 1ºs Quadros Femininos.

Em Nota Oficial nº 55, de 14/5/1960, a FMV dá conhecimento do resultado da decisão do Tribunal de Justiça.

Acórdão. Proc. Nº 12, de 1960.

Ementa: A realização de uma competição desportiva fora da hora regulamentar não constitui erro de direito, capaz de invalidá-la. O próprio erro de fato, para efeitos de direito penal, só é de ser tomado em consideração, como argumento, quando relevante. O hecho desnudo, como advertem os tratadistas, é sempre irrelevante, até mesmo para o Direito Penal Disciplinar, ou Desportivo.

Vistos etc.

Acórda, por maioria de votos, o Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Metropolitana de Volley-Ball em negar provimento ao recurso manifestado a fls., por falta de fundamento legal. Alega o Recorrente que o fato de um árbitro dar início a uma partida depois da hora regulamentar constitui erro de direito, que anula o resultado daquela, tal como se ela não tivesse sido realizada. Nada mais inexato em matéria de direito.

De erro de direito dá-nos perfeito exemplo, em acórdão memorável, o Supremo Tribunal Federal, através do voto proferido pelo saudoso Ministro Hermenegildo de Barros: – “Dá-se o erro de direito, por exemplo, quando a lei proíbe que um menor de 18 anos faça testamento e, apesar disto, o testamento é feito”. No caso dos autos, se se pudesse falar em erro de fato, tal erro, na verdade, seria até irrelevante. Nem, portanto, como erro de fato a matéria, para os fins previstos, poderia ser levada em consideração, dada a sua irrelevância evidente. Se se pudesse anular uma partida realizada simplesmente porque um árbitro determinou que ela se iniciasse fora do horário pré-estabelecido, então chegaríamos por via de consequência, a anular os julgamentos do Tribunal, todas as vezes que estes não fossem realizados no dia marcado. A lei, realmente, prevê que, com o pedido de vista de um processo, por um juiz, o julgamento se realizará na sessão imediata. Haveria, porventura, erro de direito se o tal julgamento não se efetuasse como manda a lei? Não se leve ao exagero a teoria do erro de direito. Há muita diferença entre ignorância da lei e má ou errônea interpretação da lei. No caso, ocorre até que o juiz tem o “arbítrio de apreciar outras causas” não previstas em lei, para a apreciação da possibilidade ou não da realização dos jogos. Houve no caso, um corriqueiro erro irrelevante, que NÃO PODE, DATA VENIA, TORNAR SEM EFEITO UMA PARTIDA REGULAR, COM RESULTADO REGULAR. Se o Recorrente saísse vitorioso do campo, alegaria ERRO DE DIREITO, para anular sua vitória? Parece-nos que não.

Erro de direito, para que se fixe uma noção norteadora, no campo desportivo, é, por exemplo, o seguinte: – Um jogador, dentro das regras do futebol, bate um penalte e consegue fazer o tento. Mas vem o juiz e o anula, porque o jogador chutou com o pé esquerdo. Aí está o erro de direito. O juiz desconhecia, por completo, a lei e anulou, por ignorância, um gol legítimo. Mas, quando o juiz não ignora a lei, mas APENAS A INTERPRETA, mal ou bem, não se pode falar em erro de direito, mas apenas, em erro de fato. E, no caso, esse fato seria até irrelevante. Mas é sabido que “un error com relevância para el derecho solo puede estribar en un hecho de transcendência jurídica”. “El error sobre los hechos desnudos es un error que juridicamente no tiene importancia alguna”. – sustenta Jimenez de Asua, com remissão a Savinghy, Franz Von Liszt e Binding.

Por estes motivos, negando provimento ao recurso, para proclamar a validade da partida impugnada, o Tribunal resolve ainda determinar que nova vista do processo seja aberta ao Dr. Auditor, face ao seu requerimento final, no parecer de fls.

Rio de Janeiro, 12 de maio de 1960.

a) SERRANO NEVES – Relator.