O Bom Professor – Parte II

Para tornar as aulas mais atraentes e convidativas vale até o uso de pára-quedas.

Observações esparsas de leituras e práticas me levaram a pretender discutir com vocês algo que não consigo entender por que não colocam em prática? Uma dessas coisas refere-se à teatralidade durante as aulas ou treinamentos. A maioria dos treinadores ainda não descobriu esse efeito fantástico que mexe com o ânimo dos alunos e, por isto, uma das melhores ferramentas para produzir um bom ensino. Como dizem, “Ensinar é uma Arte”, imagino que tanto o professor quanto o treinador devam ser mestres na Arte Teatral. E isto tem a ver com o Método empregado na sua tarefa educacional. 

Mudar os professores ou mudar de professores? (do livro “O Código do Talento”, Daniel Coyle)

Alguns apresentam uma teatralidade sutil. Expressões passam de um olhar fulminante a um sorriso doce num segundo. O treinador poderá ser um fingido, representar o tempo todo: “Falo mais alto ou mais baixo, faço perguntas, avalio como reagem. Faço uma porção de coisas, às vezes sou duro e cruel, às vezes calmo e acessível. Dependo do que funciona melhor com cada garoto”. Seria fácil concluir que grandes treinadores só fazem blefar. No entanto, o teatro e as máscaras não passam de instrumentos utilizados por eles para transmitir ao aluno a verdade sobre o seu desempenho. “A integridade moral é imprescindível ao exercício da função”. Há uma empatia, um altruísmo, porque o professor não está tentando dizer ao aluno algo que sabe, mas tentando descobrir, no esforço feito pelo pupilo, um ponto mediante o qual possa estabelecer uma verdadeira relação.

Historinha rápida. Certa feita realizei aulas para professores (talvez 30) de Educação Física na Universidade Estácio de Sá, Rio. O tema era a iniciação ao voleibol e como dividia com outro professor (auxiliar de ensino), coube-me o ensino para crianças escolares. Como me apoio no “Aprender Brincando”, esmerei-me em torná-los crianças enquanto ali participavam das práticas. A um sinal, transportávamo-nos à realidade como adultos quando transmitia considerações pedagógicas pertinentes. E assim transcorria a aula, mas ainda não atingira o que desejava, isto é, fazer a turma de professores se sentirem como crianças, soltas e brincalhonas. Foi quando tive um estalo: vi uma pequena janela um pouco distante situada na parte mais alta do ginásio. Imaginei que deveria ter ali uma sala e que talvez houvesse ocupantes, uma vez que outros cursos se desenvolviam na universidade. Criei, então, um exercício simples de locomoção com bolas de um lado a outro da quadra, sendo que ao ultrapassar a rede os alunos deveriam arremessá-la para cima e recolhê-la a seguir até a entrega a um novo companheiro. E assim procederam numa competição entre dois grupos. Ocorre que as “crianças” pouco ruído faziam, comportando-se como “professores”. Foi aí que intervi: “Crianças, descobri que o professor de matemática de vocês está dando aula lá em cima, vêem a janela fechada? Pois bem, como ele anda reprovando alguns de vocês, vamos atrapalhar a aula dele em represália; então, quem tiver mais coragem e for mais esperto, que faça mais barulho e bagunça aqui. E vamos ver quem vence, ele ou nós”! Não é difícil adivinhar o que se sucedeu a seguir. Abriram a janela e de lá uma pessoa gritou: “Professor, por favor, estamos em aula também”! Juntei o grupo, agora de “crianças felizes” e disse-lhes: “Estamos vingados, conseguimos atrapalhar a aula dele”! E todos sorriram e entenderam a mensagem.    

Erros, como e quando intervir? A qualidade mais decisiva é quando professores estão desempenhando sua mais importante função: apontar erros. Eis o que disse uma professora de matemática: “Consigo estabelecer uma relação com eles porque conheço bem a situação que vivem. Só fui fazer um curso superior quando meus filhos estavam no ensino médio, portanto já vivi o outro lado, conheço o mundo deles. Não tem nada a ver com matemática. Não ensino matemática. Tem a ver com a VIDA. Cada dia deve ser encarado como um novo dia e, cada vez que acordamos, olhamos o céu que ganhamos de presente. Aí está o dia. O que faremos com ele?”

Apontar erros requer muito cuidado e percepção para não desestimular seu aluno. Tenham muita atenção nas palavras e gestos, pois suas indicações podem afetar negativamente o desempenho do instruendo. Corrigir é bem diferente de simplesmente indicar o erro. Vejam, por exemplo, um professor de matemática que, simplesmente, anula uma questão de um aluno por não ter a resposta correta naquele instante: e o raciocínio descrito ao longo das equações não conta? Assim, é bastante natural que haja tentativas e erros nas execuções dos ensaios. O importante é notar em que estágio está o aprendiz e o quanto ainda tem a percorrer. Além disso, cada indivíduo requer um acompanhamento que, se adequado a ele, poderá rapidamente transformá-lo.

Neste ponto, retomo a linha dos meus escritos para repetir o que já dissemos sobre a zona de desenvolvimento proximal, metáfora do andaime e ensino contingente, esboçados em “Pensar e Aprender – I” (fev./2010).

Pensar e Aprender (I)

Atividades Inteligentes e Criativas

O desconhecimento pedagógico pode transformar uma aula numa verdadeira tortura, levando ao trauma, à falta de estímulo, à frustração. É fundamental que se leve em conta ao se planejar um curso para crianças, a psicologia funcional – interação humana. É preciso saber, por exemplo, que necessidades a criança tenta satisfazer naquele momento da aula. Inicialmente, ela quer jogar ou brincar?

 

Limitar o aprendizado de um esporte por repetição de modelos, decorar gestos ou movimentos prontos, não determina proficiência em esporte algum. A lógica da criança não é a lógica do adulto. Construir os conceitos sobre um assunto compreendê-lo e agir sobre ele é, antes de tudo, anterior à etapa da verbalização. Ler e escrever, p.ex., são habilidades nas quais nos aperfeiçoamos bem depois da fluência oral. O princípio básico da metodologia desenvolvida centra-se em como propor uma atividade à criança de forma que ela se sinta estimulada e desafiada, em constante interação, fazendo do esporte uma ferramenta útil às suas necessidades e desejos. Construir o vôlei de forma eficaz, criativa e lúdica é, pois, a tarefa primordial do especialista ao se tratar de ensino do esporte. Entender como o pensamento se desenvolve desde o nascimento, entender que a criança fala porque pensa e não pensa porque fala, compreender para corresponder satisfatoriamente ao universo que realmente interessa à criança.

Metodologia

Na metodologia, a oralidade está em primeiro plano, mesmo que as crianças iniciem suas aulas já sabendo alguns movimentos básicos do esporte. Ao oferecer-lhes atividades nestas habilidades, dar-lhes também condições de se expressar espontaneamente com frases estruturadas corretamente. As atividades devem ser atraentes e instigantes a cada fase pela qual o aluno passa. Por isso os grupos são formados sob este pressuposto que, via de regra, tem a ver com a faixa etária. Portanto, não agrupamos os alunos por conhecimento do esporte enquanto não lidarmos com o jogo propriamente dito. A proficiência passa a fazer diferença então no momento que introduzimos tais habilidades, ferramentas a mais na comunicação dentro do esporte. O conteúdo concreto e significativo é aquele que faz parte da realidade social do aluno. Além de se trabalhar na escola com a criança os elementos que compõem seu meio social e cultural, é importante proporcionar-lhe instrumentos para que ela identifique o que existe, o que foi transformado como, porque e quais os determinantes que ocasionaram as transformações, tomando consciência de seu corpo e suas relações. Assim, a questão central da pedagogia é o problema das formas, dos processos, dos métodos, certamente não considerados em si mesmos, pois as formas só fazem sentido na medida em que viabilizam o domínio de determinados conteúdos.

“A criança pode fazer mais cedo com ajuda, o que mais tarde ela faria sozinha”.

São nos pressupostos interacionistas (interação professor x aluno x aluno) que vamos buscar os elementos de consolidação da aprendizagem, permitindo, através desta interação, a “criação de zonas de desenvolvimento proximal” no aluno. Neste método, o ponto de partida é a prática social, que é comum a professor e aluno (interação). É neste momento que o professor, através de uma atividade proposta com um conteúdo específico a ser trabalhado, interagirá com as crianças de tal forma que elas possam interiorizar a teoria através da prática. A partir desta prática social, o professor levantará junto aos alunos problemas detectados: problematização, tendo em vista a instrumentalização que ele fará logo em seguida. O professor poderá pedir aos alunos que pesquisem entrevistas, livros; poderá também transmitir o conhecimento através do vídeo e outros meios que possibilitem a assimilação dos conteúdos.

Instrução Contingente

Pode-se ensinar a criança valendo-se de demonstração, da fala ou, ainda, de um tipo de instrução que combina a demonstração e a fala num padrão específico. Contudo, as crianças que mais aprendem recebem sugestões ou fala-se à criança o que fazer em seguida; se ela, porém, não compreender o que for dito, oferece-se mais ajuda. Quando a criança conseguir seguir uma sugestão, deve-se deixar que ela assuma mais responsabilidade pelo passo seguinte. Este é o conceito de “ensino contingente”, isto é, condicionando toda ajuda à compreensão que a criança demonstrava ter dos níveis anteriores de instrução:

Ensino por Demonstração

Observam o que o professor faz e ficam cheias de vontade de experimentar: são incapazes de absorver grande parte do que lhes foi mostrado.

Ensino Contingente (gradual)

Aprendem a fazer a tarefa mediante ajuda e, com o prosseguimento das sessões, começam a compreender o que o professor “quer dizer”.  A instrução contingente ajuda as crianças a construir a perícia específica – a perícia vinculada àquela determinada tarefa ou grupo de tarefas –, concentrando a atenção delas nos aspectos pertinentes e oportunos da tarefa e realçando as coisas que elas devem levar em conta. Além disso, ela decompõe a tarefa numa sequência de tarefas menores que as crianças são capazes de desempenhar e orquestrar de modo que elas por fim consigam construir o modelo completo. Consiste em dosar a quantidade de ajuda que as crianças recebem de acordo com sua compreensão, de momento a momento. Se elas não compreendem uma instrução dada num determinado nível, mais ajuda é necessária. Quando elas compreendem, o professor se retrai e dá mais espaço à iniciativa da criança. Desse modo a criança nunca fica sozinha quando está em dificuldades nem tampouco é “contida” por um ensino demasiado diretivo ou intrusivo. A compreensão das “regras” da contingência e o ensino de acordo com tais regras são duas coisas muito diferentes.

Metáfora do andaime

“Quando bem construídos, os andaimes ajudam a criança a aprender a ganhar alturas que elas seriam incapazes de escalar sozinhas”.

Esta fórmula que parece simples, até banal, não é nada fácil colocar em prática. Mesmo em tarefas relativamente simples, a pessoa treinada para ensinar contingentemente frequentemente “viola” as regras. Às vezes repete-se uma instrução no mesmo nível quando deveria oferecer mais ajuda. Em outras ocasiões, oferece-se ajuda quando esta não é mais necessária.

Por exemplo, ao ensinar a técnica do toque com ambas as mãos ou mesmo a manchete, quase sempre o professor não atenta para a posição básica das pernas anterior ao próprio toque. Quando o faz, é sempre com instruções verbais repetitivas que a criança não fixa. Neste caso, recomendo a aplicação de “brincadeiras ou pequenos jogos” em que, obrigatoriamente, o aluno terá que flexionar as pernas para ter sucesso nas suas participações.