Levantador Sinistro

O Sporting Clube Espinho, campeão de voleibol de Portugal em seu jogo contra a AABB, no Rio de Janeiro (27.3.1962). Na foto Roberto Pimentel aplica com sucesso mais uma de suas famosas cortadas de esquerda. Foto: Diário Esportivo.

Ensinar é contar histórias: “Um canhoto na equipe atrapalha? E se ele for o levantador”?

Hoje falarei sobre uma das funções que exerci quando jovem atuando na equipe do Botafogo F. R., do Rio de Janeiro, especialmente nos anos de 1963 e depois, em 73, quando a equipe foi eneacampeã carioca.

Taticamente, sempre considerei oportuna uma equipe ter em quadra um indivíduo sinistro (canhoto). Seria porque eu era um deles? Entretanto, devo um esclarecimento: não sou canhoto em toda a extensão, posto que realizo os movimentos de lançar (sobre a linha dos ombros) com a mão e braço esquerdos. Por este motivo vários companheiros apelidaram-me “Roberto canhoto”. Nunca soube o motivo, mas minha evolução me levou a aprender também a efetuar ataques em voleibol com o braço direito. Após poucos meses de treinamento tornei-me ambidestro e, sem dúvida, um dos atletas mais técnicos de minha época, reconhecimento este confirmado por meus contemporâneos, o que muito me envaideceu e acalentou meus esforços no apuro de uma técnica de excelência. Sem dúvida, desde que me iniciei no esporte, os objetivos no aprendizado sempre convergiram para a excelência dos gestos e uma interpretação global dos movimentos, tecnica e taticamente. Nesta visão, aprimorei-me não só na arte dos ataques, como nos demais fundamentos, em especial a recepção e o levantamento. Um lembrete: à época, recepcionava-se o saque “de toque”; a manchete só seria introduzida no Brasil “oficialmente” a partir de 1964, logo após as Olimpíadas de Tóquio, no Japão.

Em 1988, antes dos Jogos Olímpicos de Seul, Coreia do Sul, encontrei-me com o então presidente da Confederação Brasileira de Volley-Ball (CBV) Carlos Nuzman e o técnico da seleção masculina, Paulo Roberto (Bebeto) de Freitas. Estavam saindo  de uma reunião sobre a constituição da equipe que iria aos jogos e, de pronto, disse o presidente: “Olha ele aí, já temos o que queríamos”! Sem entender o que ocorria, defendi-me ainda perplexo: “Confesso que nada fiz e juro inocência”! E entre sorrisos explicou: “Estamos à procura de um levantador alto, experiente e canhoto”. Não encontraram outro, pois fui talvez único no país (1,92m). Evidentemente que por trás da brincadeira, já revelavam um saber tático a ser buscado nos níveis da Formação de atletas. Pena que nesta época ainda não dispuséssemos de uma possível ingerência nos treinamentos dos clubes/empresas. Mas eu percebia um outro obstáculo: “Alguém (na Formação) saberia forjar um indivíduo com tais características e aproveitá-lo taticamente na sua equipe”?

Sobre este assunto estaremos comentando nas próximas postagens, lembrando aos leitores que conheci poucos atletas nessas condições: Celso Kalache, brasileiro, um francês que não me recordo seu nome (creio que atuou na seleção de seu país na década de 80), e agora o americano Lloy Ball, com altura aproximada de 2m, campeão olímpico em 2008, em Pequim e recentemente da Liga Mundial.