
Importância da Dúvida
No ensaio “A Dúvida” (Relume Dumará), o filósofo tcheco Vilém Flusser diz que “duvidar é um estado de espírito que pode significar o fim de uma fé ou o começo de outra. Em dose moderada, estimula o pensamento. Em dose excessiva, paralisa toda atividade mental”.
Mini Voleibol. Bisbilhotando o site da Fivb por esses dias deparei-me com uma notícia que me chamou a atenção e fez por merecer este texto uma vez que me relembra experiências vividas em várias partes do mundo, especialmente em Congresso na Argentina (1984) e um Simpósio Mundial (1975) na Suécia. Em ambos os casos o assunto era idêntico: o ensino para crianças, isto é, o Mini Voleibol. Como tenho larga experiência no Brasil sobre o assunto, atrevo-me a expressar a minha opinião a respeito da Metodologia a empregar. Antecipo que sou totalmente CONTRA ao que apregoa a Fivb, leia-se H. Baacke, emérito presidente da Comissão de Treinadores, velho conhecido desde 1975, no 1º Simpósio. O texto é um press release que vem da Argentina. Como lá estive em 84, passarei a analisar alguns fatos interessantes para nosso aprendizado no que se refere à Metodologia a empregar na tarefa de ensino para crianças.
Argentina. Vejam o resumo e perdoem-me a tradução: “Nova iniciativa começa na Argentina – O evento é o primeiro de muitos na Argentina – San Juan, Argentina, 18 junho de 2010. A primeira Clínica de Voleibol para as crianças na Argentina visitas escolares Volley teve lugar na quinta-feira no Centro de Desenvolvimento de Voleibol em San Juan. O evento foi aberto pelo presidente da Federação Argentina de Voleibol Alejandro Bolgeri e Gabriel Tesoureiro Salvia. O projeto visa aumentar o conhecimento do esporte no país sul-americano que também irá sediar a fase final deste ano da Liga Mundial de Voleibol em poucas semanas. No fim de semana seguinte, com a duração de dois dias, a realização do FIVB Weekend, também em colaboração com a FeVA, reunindo crianças de 4 a 12 anos para jogos alegres de voleibol: 17 clubes atenderam ao chamado, formando 146 equipes e um total de aproximadamente 600 alunos, além de familiares e amigos compondo os 1.200 espectadores”.
Os argentinos “descobriram” o mini voleibol a partir de 1981, como se depreende dos anais da Confederación Sudamericana de Voleibol (CSV). Naquele ano o secretário da Comissão Sul-Americana de Treinadores, Miguel Salvemini, participou com outros cinco professores argentinos de uma reunião de quatro dias (30/6 a 3/7) em Roma sob os auspícios da Subcomissão Internacional de Minivoleibol (SCMVB), um ramo da Comissão Internacional de Treinadores (CIT) da FIVB. Os membros eram Gianfranco Briani* e Beniamino Pagano (Itália), Peter Duyff (Holanda), Gerhard Dürrwächter* (Alemanha), Lorne Sawla (Canadá), Jorgen Hyllander* (Suécia), assistidos por Horst Baacke* (alemão), presidente da CIT. A reunião foi presidida pelo professor Briani, presidente da SCMVB. Como saldo desse evento, ficou decidido entre outras coisas o estabelecimento de diferenças entre Curso e Simpósio, e que os Simpósios Internacionais seriam realizados a cada três anos. Naquela oportunidade foi solicitado à Confederação Sul-Americana um curso internacional de mini voleibol a ser realizado antes de 30 de setembro de 1983. Além disso, como previsto, construíram uma “Cartilha” de procedimentos para as filiadas. Em dezembro de 1981 os argentinos realizaram o I Encontro Nacional de Mini Voleibol na cidade de Córdoba durante quatro dias em que, predominantemente, só constou de competições entre 37 equipes e 185 jogadores. Além de estatísticas do evento, nada mais constou do relatório. Pura e simplesmente os jogos entre crianças. Somente em 1984 (20/23 de setembro), realizaram o I Simpósio Nacional da modalidade em Buenos Aires para professores das diversas Províncias do país.
(*) Os quatro presentes ao 1º Simpósio Mundial de Mini Voleibol na Suécia, 1975. Além, é claro, do autor. O leitor poderá conhecer detalhes dos trabalhos realizados em diversos países nos Anais desse Simpósio publicado neste site em “História do Mini Vôlei” (vários).
Congresso Argentino de Mini Vôlei, 1984. Com duração de quatro dias e contando com grande participação de professores de todo o país, embora predominantemente portenhos. O local escolhido foi o Centro Deportivo Nacional que contribuiu para acomodação dos visitantes, inclusive eu, convidado único enviado pela CBV. Dividir um alojamento com professores de diversas Províncias viria a se tornar num detalhe importante como verão mais adiante no relato, pois me proporcionou um contato mais estreito com professores do interior, com realidades distintas da capital. Um dos professores palestrantes era o técnico italiano Pitera. Ao que me lembre, só ele. Os demais, todos nacionais. Foram abordados diversos temas, até mesmo em consonância com a reunião de Roma. E, orientados pelos seus treinadores, um grupo de crianças constituído de atletas de clubes promovia a demonstração de ensino nas práticas. E aí é que chamo a atenção do leitor para o grande detalhe que poucos se preocupam: “A Passagem da Teoria para a Prática”.
Aguardávamos todos, éramos quase uma centena de professores, as aulas práticas com grande interesse. Dois professores se encarregaram de enunciar os exercícios aos jovens alunos e, portanto, já iniciados no esporte. Enquanto um terceiro explanava as reais qualidades e importância de tais e tais exercícios que iam se sucedendo rapidamente. Não me lembro quantas foram as práticas, mas o que me restou na mente é suficiente para convencê-los da inutilidade daqueles procedimentos. E o pior é que quebrou de forma insofismável qualquer esperança de aprendizado dos professores provinciais. Não sei se também à grande maioria de portenhos ali presentes. No alojamento consegui trocar palavras a respeito com três companheiros que, perplexos, diziam: “Como chegaremos a realizar tal façanha com nossos muchachos, tão pequeninos e frágeis? Nada do que vimos poderá ser colocado para nossas crianças”. No que concordei em tudo, pois os professores se aprimoraram tanto na complexidade dos exercícios, que se esqueceram que estavam tratando da metodologia da iniciação desportiva, isto é, como levar um indivíduo a aprender algum movimento e atuar junto com outros companheiros. Eles simplesmente se esmeraram em colocar exercícios os mais complexos possivelmente para impressionar a plateia. Puro exibicionismo de ADESTRAMENTO.
Influência Desfavorável. Nisto reside o que já tinha visto no 1º Simpósio, inclusive com diversos treinadores, o japonês Toyoda e o alemão Baacke. Felizmente, lá estava o melhor de todos, o também alemão G. Dürrwächter, a quem me associei na sua doutrina de “Aprender Brincando e Jogando”, título de um de seus livros publicados no Brasil.
FeVA – Federación del Voleibol Argentino (ex- Federación Argentina de Voleibol). Muito tempo depois, em 2003, a Federação passou por sérios problemas que, inclusive, ocuparam o noticiário internacional, culminando com a intervenção da Fivb. Eis um resumo que consta do site da Federação argentina: “En agosto de 2003 la Federación Internacional de VolleyBall (FIVB) designó, para administrar de manera transitoria el voleibol argentino, a un denominado ‘Grupo de Trabajo’, formado entonces por Juan Ángel Pereyra, Eduardo Fernández, Miguel Marziotti y el Alejandro Bolgeri. A fines del mes de enero en la ciudad de Acapulco, México, el Consejo Directivo de la FIVB reconoció – ad referéndum del congreso de Porto, Portugal, en mayo -, a la Federación del Voleibol Argentino (FeVA) como único ente representativo del voleibol en la Argentina, hecho que fue rubricado por la Confederación Sudamericana de Voleibol reunión de febrero en Sacquarema, Brasil”.

