Evolução do Jogo e Linguagem (II)

Terminologia (no Brasil)

A arbitragem passou a ser definida pela FIVB a partir de 1953 e constantemente é revisada. Em 1980, no seu 17º Congresso, ficou estabelecido que as Regras do jogo fossem traduzidas para três linguagens: francês, inglês e espanhol. A FIVB também decidiu que o Congresso Técnico realizado por ocasião das Olimpíadas é o fórum ideal para qualquer alteração das Regras. 

A TV Entra em Cena. Atualmente está também disponível na Internet. Para se comunicar com os jogadores os árbitros utilizam preponderantemente sinais convencionais incluídos no livro das Regras. Entretanto, entre os próprios atletas, técnicos, aficionados e público em geral, existe uma linguagem bem específica, dominante, que determina e qualifica as ações e seus intérpretes durante uma partida de voleibol. Reforçando este pensamento, recordo-me de que o locutor Luciano do Valle, tão logo negociou com a CBV as transmissões das partidas de voleibol a partir da campanha do Sul-Americano no Brasil (Sto André- SP, 1981), apressou-se em conhecer o jargão voleibolístico para evitar gafes. Foi uma preocupação louvável de sua parte e bastante profissional. A firma de Luciano era a Novo Ciclo, ele ainda locutor esportivo da TV Globo e este foi o início de uma nova era do voleibol no país com a entrada da TV na transmissão dos jogos.

Acompanhem a partir desse momento o Glossário que lhes preparei: 

ATAQUE: Toda ação de enviar a bola para a quadra adversária, exceto saque e bloqueio.

  1. Aquela (between) – Jogador do meio da rede salta para bater bola chutada, mas o ataque é executado pelo jogador da entrada, que bate entre o levantador e aquele.
  2. Balanceada (de gancho) – Usada na década de 50 (ver Ataque de gancho).
  3. Batida de mão fechada – Com o punho cerrado; mão fechada.
  4. Batida – Toque com uma das mãos na bola com violência; principal meio de ataque.
  5. Bola alta – Com levantamento alto.
  6. Bola carregada – Conduzida, puxada.
  7. Bola chutada na ponta – Após levantamento de bola rápida na extremidade da rede.
  8. Bola chutada no meio – Após levantamento de bola rápida no centro da rede; pelo meio.
  9. Bola chutada – Após levantamento com bola rápida e trajetória baixa.
  10. Bola de 2 tempos – Finta do cortador: finge saltar para bola de tempo e salta num segundo tempo.
  11. Bola de fundo – Realizado atrás da linha de ataque pelo jogador de fundo (de defesa).
  12. Bola de prima – Ver Bola de primeira.
  13. Bola de primeira – Primeiro passe proporciona um ataque; levantada direta para um dos atacantes, sem passar pelo levantador.
  14. Bola de saída – Ataque na saída de rede.
  15. Bola de segurança – Com levantamento alto na extremidade da rede.
  16. Bola de tempo – Com levantamento baixo e rápido e junto ao levantador; mexicana; tempo na frente e tempo atrás.
  17. China – Realizado com corrida e salto numa só perna, quase sempre com levantamento atrás do levantador.
  18. Com força – Potente, forte.
  19. Combinado – Série de combinações de uma equipe.
  20. Conduzida – A bola permanece tempo demasiado na mão; é retida.
  21. Cortada – Batida (saltando) com uma das mãos na bola em direção à quadra contrária.
  22. Cortada com corrida – Ver China.
  23. Cortada de soco – Batida na bola com a mão fechada (ver Cortada).
  24. Cravar (cravada) – A bola toca o solo adversário próximo à rede; violenta.
  25. De fundo – Executado por um jogador de defesa, com salto atrás da linha dos 3m.
  26. Degrau – Rápido; 2 jogadores saltam quase simultaneamente.
  27. Deixadinha – Leve toque na bola, buscando espaço vazio próximo à rede; largada.
  28. De segurança – Com levantamento alto numa das extremidades da rede.
  29. Diagonal – Indica a direção da bola em relação à linha lateral.
  30. Dismico – Finta na bola de tempo (meio); 2º jogador (saída) ataca por trás daquele (no meio da rede).
  31. Dismico da chutada – Levantamento da dismico (2º) é rápido.
  32. Do saque – Saques lentos, com trajetória próxima à rede, podiam ser bloqueados ou atacados (até 1984).
  33. Enfiada – Mão espalmada, com leve retenção da bola (ver Puxada).
  34. Entrada (de rede) – Na posição IV; quase sempre “De segurança”.
  35. Explorar (o bloqueio) – Intencionalmente, lançar a bola para que toque o bloqueio e caia fora do campo.
  36. Finta – Movimento para iludir o adversário.
  37. Gancho (de) – Executado com movimento giratório do braço.
  38. Largada – Ver Deixadinha.
  39. Manivela – Ver Ataque de gancho.
  40. Mão espalmada – Usada inicialmente para puxadas; a mão aberta é empregada para todos os ataques.
  41. Meia batida – Ver Sem força.
  42. Meia bola – Próxima ao atacante, nem alta nem baixa.
  43. Mexicana – Cortada rápida junto à rede, pelo meio da quadra; bola de tempo.
  44. Paralela – Indica direção da trajetória da bola no ataque em relação à linha lateral. 
  45. Ponta – Executado numa das extremidades da rede (entrada ou saída).
  46. Prima (de) – Ver Bola de primeira; nomenclatura abreviada. 
  47. Primeira (bola) – Simulação de cortada para ludibriar bloqueio; um segundo jogador realiza o ataque.
  48. Primeira (de) – Ver Bola de primeira.
  49. Puxada – Mão espalmada, com leve retenção da bola (ver Enfiada).
  50. Rápido combinado – Combinações de ataque da equipe com jogadas rápidas.
  51. Saída (de rede) – Lateral direita da rede; posição em que o jogador sairá da rede para o saque (posição II).
  52. Sem força – Executado sem emprego de força; utilizada por jogadores muito técnicos.
  53. Socada – De soco; cortada com a mão fechada.
  54. Tempo (de) – Ver Bola de tempo.
  55. Tempo de bola – Conjugar a aproximação, o salto e o toque na bola.
  56. Xeque – Bola que ultrapassa a rede e propicia ataque imediato do adversário.

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(continua)

 

Evolução do Jogo e Linguagem (I)

Praxiologia

A Praxiologia é “uma ciência ou teoria epistemológica que estuda as ações humanas, o comportamento e suas leis, induzindo conclusões operacionais”. Neste instante ela nos propõe a realização de uma verdadeira radiografia do jogo de voleibol quando buscamos desvendar seus segredos e sua riqueza gestual. Como participante e observador privilegiado, mostro aos leitores as ações motrizes, os relacionamentos e o íntimo dessa atividade.

Expressão corporal. Para tanto, sirvo-me da contribuição de Jean Le Boulch que nos ensina que o ato de se expressar consiste em exteriorizar uma ideia e um sentimento por uma reação corporal inconsciente, mas controlada, possuindo um caráter de evidência para o interlocutor. Apesar das possibilidades de inibição e de controle que se podem exercer sobre a mímica e a gestualidade, apesar das possibilidades de simulação e de dissimulação, a expressão do corpo revela mais sobre a pessoa do que a expressão oral. A atitude positiva ou negativa para com outrem se manifesta necessariamente por reações tônicas que se inscrevem nos músculos do rosto: “Olha a cara que ele fez!”. Concluindo ele nos fala:  

 “(…) A expressão somática e, particularmente, as variações tônicas traduzem fielmente as reações afetivas e são, portanto, significativas do modo como é vivida a relação consigo mesmo e com outrem. O homem é inseparável da expressão pela qual ele se revela a outrem”.

Realizando certos gestos, os indivíduos fornecem indícios a outros indivíduos que lhes respondem. É desse modo que o comportamento não verbal aparece como um elemento importante da comunicação e da percepção de outrem. Nessa troca de pessoa a pessoa, a linguagem oral e a linguagem gestual estão intricadas; a linguagem por gesto reforça na maioria das vezes a linguagem falada e acentua-lhe o lado expressivo. Esta associação da palavra e da mímica decuplica as possibilidades de projetar-se e de expressar-se. Mas, inversamente, a existência destas duas linguagens complementares pode acarretar discordâncias voluntárias ou inconscientes: às vezes a mímica trai sentimentos desmentidos pelas palavras.

Evolução do Jogo. Faço um alerta aos leitores mais jovens para que estejam atentos à terminologia que encontrarão nos textos a seguir. Muitos termos traduzem a concepção, a forma e até a técnica empregada no voleibol desde longa data. É evidente e praticamente impossível realizar um glossário completo, mas como base para um trabalho mais exaustivo de mestrandos – voleibol ou linguística – creio que já é um bom começo. Peço desculpas aos meus leitores de outras regiões deste nosso imenso Brasil por só ter contemplado termos utilizados no Rio de Janeiro, mas como sabem, é aqui a “minha praia”. Assim sendo, acompanhem-me nesse périplo e ajudem-me na recordação dos fatos. 

Comunicação em Voleibol. No glossário procuro traduzir diversos aspectos de comunicação nesse relacionamento entre os personagens, pois para entendermos a fala de alguém não é suficiente que entendamos suas palavras, mas temos que compreender o seu pensamento e, mais ainda, precisamos conhecer a sua motivação: “entre a palavra e a intenção existe um grande abismo”.  Há uma estreita relação entre o pensamento e a palavra num processo vivo, uma vez que o pensamento nasce através das palavras. Porém, esta relação não é algo já formado e permanente; surge ao longo do desenvolvimento do indivíduo e também se modifica.

Entendimento. O entendimento mútuo pode ser obtido por meio de uma fala completamente abreviada quando duas mentes se ocupam do mesmo sujeito. Ao contrário, mesmo com a fala integral, pode ocorrer a falta total de entendimento, uma vez que os pensamentos das pessoas seguem trajetórias diferentes. Quaisquer pessoas que atribuem significado diferente à mesma palavra ou que sustentam pontos de vista diferentes não conseguem se entender. Como Tolstoi notou, “aqueles que estão acostumados ao pensamento solitário e independente não aprendem com facilidade os pensamentos alheios e são muito parciais quanto aos seus próprios; mas as pessoas que mantêm um contato mais estreito aprendem os complexos significados que transmitem uma à outra, por meio de uma comunicação lacônica e clara, que faz uso de um mínimo de palavras”. (Vigotski)

Sentido da palavra. As palavras têm um significado definido e constante, mas num determinado contexto podem adquirir um sentido intelectual e afetivo muito mais amplo; esse enriquecimento que o sentido lhes confere a partir do contexto é a lei fundamental da dinâmica do significado das palavras. Dependendo do contexto, uma palavra pode significar mais ou menos do que significaria se considerada isoladamente: a) mais, porque adquire um novo conteúdo; b) menos, porque o contexto limita e restringe o seu significado. Além disso, a inflexão revela o contexto psicológico dentro do qual uma palavra deve ser compreendida. Quando o contexto é claro fica possível transmitir todos os pensamentos, sentimentos e até mesmo toda uma sequência de raciocínios em uma só palavra. (Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem, Vygotsky, Luria, Leontiev, 1988)

(continua)