Defesa: Vale a Pena Treinar?

Jogo Brasil e Alemanha, fase de aquecimento. Foto: Fivb/Divulgação.

Treinamento de Defesa – II

Brasil e Alemanha. Na recente partida entre as seleções dos dois países (6.10), observei um lance que reputo como um daqueles já comentado em textos sobre a Iniciação e Formação de jogadores. Creio que se desenrolava o 3º e último set da partida que seria ganha pelo Brasil (3×0). Um jogador alemão salta na saída da rede (II) para o ataque e, tendo percebido a chegada do bloqueio duplo, evita o ataque por cortada e, simplesmente, lança a bola com uma das mãos em direção ao fundo da quadra adversária (em V), encobrindo o defesa-esquerda brasileiro que se aproximara para a cobertura do bloqueio. Contava ele, com toda certeza, que o defesa-centro – creio que o Dante – estaria pronto para realizar a sua própria cobertura, isto é, não havendo o impacto violento, estaria disponível para o respectivo deslocamento lateral até V, o que não aconteceu. O atleta brasileiro ficou “pregado” ao chão, sem qualquer reação. Considerando que a bola foi lançada sem força a uma distância razoavelmente grande – da rede ao fundo de quadra, entre 8m e 9m, por que será que o jogador não esboçou qualquer reação para realizar a defesa? Notei, inclusive, que o líbero voltou seu olhar como se o interpelasse: “Por que não foi na bola, estava tão fácil”? Desatenção? Despreparo? Não conseguiria chegar lá? Cansaço?

Não entendo bem como são realizadas as estatísticas do treinador, mas certamente a filmagem espiã poderá revelar o lance para uma análise e, se houver tempo, treinar o atleta para jamais reproduzir o erro. Entretanto, o desconhecimento de alguns treinadores sobre noções psicopedagógicas pode contribuir para a sua permanência como pode ser observado, principalmente no alto nível. Além disso, ao ultrapassar a idade de 30 anos, olhar para o futuro e não enxergar muito tempo de vida útil no esporte, e ainda mais com a bagagem de títulos que ostenta certamente que nenhum atleta vai se arriscar a se atirar no chão para tocar uma bola. É preferível deixar para lá, uma vez que o jogo estava fácil. É coisa de brasileiro, não sei se de outros. Mas nunca vi em equipes japonesas, já que têm uma disciplina rígida quanto aos propósitos a conquistar, inclusive a preservação de sua imagem. Até o fato de o treinador principal alegar que “não tem tempo” para treinar é bastante significativo do ponto de vista do nível de exigência. E no caso brasileiro um grande paradoxo.

Primeiro movimento. Para entendermos como se processa aquele movimento de defesa, peço auxílio à Psicologia Pedagógica através de D. Wood.

Quando penso em apanhar uma bola o estágio conclusivo depende do primeiro passo: de preparar-me em expectativa. A execução do primeiro movimento determina se toda a ação será executada. Logo, na minha consciência deve haver a noção sobre o primeiro movimento como réplica efetiva para todo o processo. Essa concepção do primeiro movimento que antecede o próprio movimento é o que constitui o conteúdo daquilo que costumamos denominar sentimento do impulso.

Foto: Fivb/Divulgação.

Sentimento do impulso é uma modalidade de concepção antecedente sobre os resultados do primeiro movimento físico que deve ser executado. Noutros termos, toda a vivência consciente e o desejo, incluindo o sentimento de decisão e de impulso, são constituídos pela comparação das concepções sobre os objetivos que competem entre si. Uma dessas concepções chega a dominar, associa-se à concepção sobre o primeiro movimento que deve ser executado. E esse estado de espírito passa ao movimento. Temos a sensação de que esse movimento foi suscitado pela nossa própria vontade, porque o resultado final obtido corresponde à concepção anterior sobre o objetivo.

A atenção

  1. A atenção consiste em reações adaptativas de atitudes do nosso organismo, que se desenvolve graças a um exercício sistemático e minucioso.
  2. A chamada atenção arbitrária surge através de uma reação interior de pensamento. Logo, ela irá manifestar-se com tanto mais frequência quanto maior for o número de estímulos interiores a que esteja ligada. Noutros termos, para surgir ela necessita de uma grande reserva de estímulos interiores.
  3. Exercitar a atenção significa suscitá-la sempre por meio desse tipo de reação interior. Naturalmente, quanto mais fizermos isto, quanto mais casos semelhantes suscitarmos tanto mais intensamente reforçaremos a relação entre o estímulo interior e as reações de atenção.
  4. Por isso que não existe meio mais decidido de regular as ações externas que reprimir os movimentos absurdos e reforçar os racionais.
  5. O comportamento consciente pressupõe atenção, e atenção se estabelece graças ao exercício, ou seja, graças à repetição de certos movimentos que são reforçados com base no método dos reflexos condicionados como uma concepção desses movimentos.

Pode-se ler e reler este e outros textos sobre o assunto, entender o que está escrito, mas não conseguir traduzir em ensaios frutíferos. Gostaria  de tentar produzir algo a respeito com os seus alunos, não importa a idade que têm? Vamos começar desde cedo a produzir indivíduos mais técnicos? Que tal os nossos atletas aprenderem corretamente desde crianças? Estes são alguns detalhes a que venho me referindo e que podem ser sanados a partir da Iniciação. É o ensino com Qualidade e que treinadores competentes não têm tempo de corrigir, pois as competições se sucedem ano a ano. Enfim, é como aprender a andar de bicicleta; depois que aprende, não esquece jamais!

+ Detalhe: chamo a atenção dos treinadores e professores para o denominado “bate-bola” de aquecimento dos jogadores. Considero, independente se antes de uma partida ou treino, como treinamento. Assim, algumas atitudes errôneas certamente vão comprometer o rendimento técnico dos envolvidos. Releia, por favor, o item 4 acima.

Exercícios (III) – Atenção e Hábito

Atenção

A atenção consiste em reações adaptativas de atitudes do nosso organismo, que se desenvolvem graças a um exercício sistemático e minucioso. A chamada atenção arbitrária surge através de uma reação interior de pensamento. Logo, ela irá manifestar-se com tanto mais frequência quanto maior for o número de estímulos interiores a que esteja ligada. Noutros termos, para surgir ela necessita de uma grande reserva de estímulos interiores.

Exercitar a atenção significa suscitá-la sempre por meio desse tipo de reação interior. Naturalmente, quanto mais fizermos isto, quanto mais casos semelhantes suscitarmos tanto mais intensamente reforçaremos a relação entre o estímulo interior e as reações de atenção. Por isso que não existe meio mais decidido de regular as ações externas que reprimir os movimentos absurdos e reforçar os racionais. O comportamento consciente pressupõe atenção e atenção se estabelece graças ao exercício, ou seja, graças à repetição de certos movimentos que são reforçados com base no método dos reflexos condicionados como uma concepção desses movimentos.

Prática

Observem os movimentos das pernas de qualquer indivíduo quando lhe solicitam reter uma bola com as mãos quando é atirada em sua direção. Se alterarmos a direção do arremesso provocaremos um consequente deslocamento do receptor. Invariavelmente, este realizará um sobrepasso para só depois deslocar-se. Um outro exemplo trata-se da recuperação de bolas que são atiradas contra a rede. Pouquíssimos atletas se dão conta de que a bola deve ser tocada rente ao chão, com movimento singelo de uma das mãos, de baixo para cima.

Outro aspecto da questão consiste no problema do hábito.

Hábito

— O que o hábito introduz de novo no comportamento consciente?

Ele alonga a previsão em nosso comportamento, permite que as ideias se disponham em grupos cada vez maiores de movimentos relacionados entre si e que transcorrem sem qualquer esforço de nossa parte. Basta apenas comparar alguma ação usual com uma inusual para perceber que imensa economia de esforços se obtém graças à automatização. Como é fácil contar de um a cem e como esse processo de contagem se complexifica quando o fazemos em ordem inversa de cem a um. Como é fácil ler na ordem habitual da esquerda para a direita e o quanto o mesmo processo se complexifica quando começamos a ler do final das palavras para o início, embora façamos a mesma adição de letras. É essa economia, que obtemos quando lemos a mesma frase na ordem comum em comparação com o caso em que a lemos em ordem inversa, que deve ser atribuída inteiramente à economia do exercício.

Ação do hábito

Consiste no fato de que ela liga automaticamente entre si uma série de reações e assim libera a nossa consciência da necessidade de preocupar-se com elas. Quanto maior é o número de relações em que se esgarça o hábito, tanto mais distante a nossa consciência pode colocar e fixar o objetivo. Exemplo: a) ato de levantar da cama, se vestir, tomar café; b) se abrange a ida ao trabalho, a atitude básica pode estender-se por uma série mais longa de ações. A economia do hábito consiste em que não nos damos conta de como precisamente se realizam os nossos movimentos: a) não sei de que músculos preciso para retirar um livro da estante; b) de que modo um movimento leva a outro é coisa que não diz respeito à minha vontade consciente; minha vontade conta com a ação correta desse movimento. Não se tem consciência da maneira pela qual a concepção do objetivo leva a esse processo que a realiza de maneira fluente: 1. A formação dos hábitos põe à disposição da nossa vontade mecanismos cada vez mais potentes e lhe permite propor-se objetivos cada vez mais distantes. 2. Os hábitos descarregam a vontade e, assim, dão-lhe a possibilidade de recorrer a objetivos mais elevados. 3. Quanto mais amplo é o círculo de atividade que o hábito abrange, tanto menor é a energia volitiva que devemos revelar para atingir os objetivos traçados.

Caráter bilateral

O caráter bilateral dos hábitos se manifesta muito claramente se lembrarmos a relação discutível que existe entre os processos de exercício e memória. A memória funciona de um modo puramente reflexo, automático: “Nada é lembrado sem réplica”. A réplica, que põe em ação o reflexo da memória pode ser de dupla espécie: a) se pertence ao número de estímulos que são mais ou menos permanentes e agem de modo estereotipado, exigindo a mesma resposta padrão, a ação costumeira é uma reação correspondente às condições, uma resposta dupla e correta a uma réplica; b) se pertence a circunstâncias novas, inesperadas e inusuais, se ela ainda por cima encerra algum obstáculo para o desenrolar normal das reações estereotipadas, a ação costumeira é a pior resposta a ela e serve apenas como obstáculo ao pensamento.

O hábito sempre significa um modo mecânico de comportamento; pode ser útil apenas quando estamos diante de uma uniformidade de condições:

  1. Os hábitos tanto nos enriquecem e nos libertam quanto nos escravizam e se contrapõem aos nossos esforços.
  2. O comportamento habitual pode ser nocivo naqueles casos em que se exige uma adaptação prévia e nova.
  3. No processo de educação é preciso ter em vista ambos os aspectos de formação dos hábitos.