Defesa em Voleibol – Lição I

Roger Federer BiomecânicaTreinar, treinar, treinar… Será mesmo que resolve?

Muitas vezes ainda vamos ouvir a expressão acima como condicionante para o apuramento da técnica do atleta. Todavia, tenho minhas dúvidas. É bem possível que a maioria dos profissionais do ramo em que atuam tenha plena consciência do que realizam e, de forma consciente, pratiquem os seus saberes no desenvolvimento de suas equipes. Contudo, observando com olhos mais argutos o desenrolar da partida final da superliga brasileira feminina realizada neste domingo, considero que meus argumentos em prol da relevância de treinos profundos de Defesa devem ser urgentemente elaborados e intensificados no alto nível. Daí a série sobre o tema que estamos desenvolvendo e colocando-nos à crítica. Alguns equipamentos modernos poderão contribuir para revermos a metodologia de ensino em muitos aspectos e para que se tenha um olhar pedagógico mais penetrante e conclusivo no que ocorre à sua volta. 

Nota:

  1. Como os artigos foram surgindo ao acaso, decidimos refazer os títulos de modo a facilitar a leitura e compreensão dos leitores. Assim, acrescentamos aos respectivos títulos a notação indicativa da sequência:  “Lição I, II, III…”  
  2. Com base no artigo Lição de Biomecânica, de Alexandre Salvador, em Veja, 3/4/2013). A “Lição” teve como fonte Ludgero Braga Neto, doutor em biomecânica pela Universidade de São Paulo.

————————————————————— 

Feitas as ressalvas acima, passemos a discutir e a tentar a responder a algumas questões, analisando suas nuances:  

– De que adianta repetir um mesmo exercício por horas a fio se não há olhos de ver o que pode ser corrigido?

– Alguém pode aprender a realizar um movimento em frente à TV?

Dando continuidade ao estudo de como treinar DEFESA, e como já afirmamos neste Procrie, não percebemos avanços ou qualquer melhora nesse deserto de ideias. Para atenuar o quadro, além das postagens sobre a metodologia que Daniel Coyle (O Código do Talento) nos propõe, agora se somam as lições da biodinâmica em breve artigo assinado pelo douto professor Ludgero Braga Neto.  

Repetir, porém de forma correta

O artigo publicado em Veja  se refere à análise em ultra câmera lenta dos movimentos de grandes tenistas – no caso Roger Federer – e como é possível entender por que não adianta na maioria das vezes repetir um mesmo movimento com a postura equivocada. Isto é válido para qualquer desporto e explica abandonos precoces ocasionados por uma prática mal conduzida. Ensina o Doutor Ludgero: “Tanto para cientistas quanto para amadores, nenhuma arma foi mais decisiva para escrutar as artes de Federer que os avanços tecnológicos nas transmissões esportivas pela televisão”. E conclui: “É preciso aprender uma nova linguagem, descobrir os movimentos corretos, e as imagens detalhadas em vídeo são o atalho ideal para identificar essas nuances”.

Estatísticas vs. câmeras modernas?

Nem sempre estou atualizado, mas penso que estatísticas em voleibol (como na vida) têm valor relativo e na maioria das vezes sua interpretação requer muito bom senso. Em voleibol, foram possivelmente criadas pelo alemão (oriental) Horst Baacke e até hoje se encontra em uso. Creio que pretende dimensionar erros e acertos dos atletas em suas respectivas intervenções durante uma partida. Para observar a equipe adversária, criaram os espiões oficiais, com cadeira cativa nos ginásios, sempre atrás das quadras, que com suas câmeras de vídeos permitem ângulos estratégicos para os treinadores.

Todavia, não se podiam revelar com extrema precisão e minúcias o que as câmeras lentas de hoje nos apresentam ao paralisar instantes velocíssimos. “As câmeras modernas permitem a jogadores e técnicos ver a realidade sobre seus golpes, e não mais seguir cegamente regras baseadas em impressões” disse a Veja John Yandell, americano fundador do site Tennisplayer.net, com um banco de dados de 65 mil vídeos dos melhores tenistas do mundo. O efeito produtivo dessa tecnologia verdadeira revolução no ensino e esmero técnico individual, reflete-se na possibilidade de uma redescoberta visual de qualquer esporte ao evidenciar as jogadas mais repetidas dos grandes craques – os fundamentos -, uma espécie de repertório da perfeição em seus movimentos. Considere-se, ainda, que “estudos recentes de neurolinguística já comprovaram que a grande maioria das pessoas aprende por estímulos visuais. Daí a relevância da análise em vídeo”, concluiu o doutor Ludgero Braga Neto.

Assimile bem

Diz um provérbio alemão: “Você se torna inteligente graças a seus erros”. Daniel Coyle resgata outro pensamento em suas propostas de treinamento profundo, ou de qualidade: “Tente de novo. Erre de novo. Erre melhor”. Isto deve estar arraigado na sabedoria oriental muito propalada pelos japoneses quando afirmam: “Nas derrotas é quando mais se aprende”.

Para uma boa assimilação de movimentos, especialmente para os mais jovens indivíduos, a imitação não precisa ser consciente. Na verdade, na maioria das vezes não o é. Vejam a história contada por Doyle em O código do talento: Na Califórnia, conheci uma tenista de oito anos de idade chamada Carolyn Xie, uma das mais bem-classificadas no ranking de sua faixa etária em todo o país. Xie tinha o estilo típico dos prodígios no tênis, a não ser por uma coisa. Em vez do habitual revés com as duas mãos, próprio da idade, ela executava backhands empunhando a raquete com uma só mão, exatamente como Roger Federer. Não de um jeito que lembrava um pouco o de Federer, mas do mesmo jeito que ele, incluindo o abaixar da cabeça como um toureiro no fim, marca registrada do campeão suíço. Perguntei como ela tinha aprendido a rebater daquela maneira. “Não sei, só faço e pronto”, respondeu-me. Perguntei ao técnico dela, ele também não sabia. Depois, enquanto conversava sobre o que fariam à noite, a mãe de Carolyn, Li Ping, mencionou que assistiriam a uma fita na qual tinham gravado a partida de Federer. Aliás, todos na família eram fãs antigos de Federer, tinham visto e gravado quase todos os jogos televisionados do tenista. Carolyn, é claro, via as fitas sempre que podia. Ou seja, em sua curta existência, tinha visto Roger Federer bater de revés dezenas de milhares de vezes. Tinha observado o backhand e, sem saber, simplesmente assimilou a essência desse golpe.