Caça Talento ou Educação? (parte II)

Despertar o interesse conduz às descobertas. Fig.: Beto Pimentel.

Psicocinética na Escola

Lembram-se do texto Teoria vs. Prática (Vôlei vs. Vôlei), postado em 27.11.2009, em que converso com o Professor João Crisóstomo Marcondes Bojikian sobre a conveniência de a criança receber estímulos variados os mais naturais possíveis?

 

 

Agora retornamos para nos manifestarmos, igualmente acompanhado de vários mestres, como Jean Le Boulch e Célestin Freinet, ambos pedagogos franceses. Mas por que isto? Trata-se de um momento em que o governo brasileiro e instituições desportivas se desdobram em múltiplas facetas para verem aplicados os milhões de reais injetados para projetos a serem desenvolvidos para que o País se destaque em número de medalhas olímpicas e se torne, então, uma potência esportiva. Por serem imediatistas e pouca intimidade com a ciência do treinamento, esforçam-se por acreditar que quatro anos seriam suficientes para uma plena realização e que basta que os possíveis talentos já existentes tenham um reforço de caixa e treinem exaustivamente até lá. O resto é torcer para que se dêem bem e justifiquem os encaixes realizados. Mas esta não é nossa ideia e procuraremos mostrar a professores e agentes educadores como proceder de forma pedagógica adequada. É bem possível que, quando as crianças se tornarem adultas – e talvez atletas – não venham os seus treinadores se queixarem de que não aprenderam na Formação os gestos e atitudes atléticas mais adequadas. E muito menos, especializadas somente em alguns poucos fundamentos.

Projeto pedagógico vs. esporte na escola

Uma segunda discussão (é antiga) se refere à prática desportiva nas escolas. Professores de educação física reivindicam que a matéria a ser lecionada em classe deveria restringir-se tão somente à prática de jogos e exercícios não competitivos, com regras específicas, formulando projetos pedagógicos nesse sentido. Enquanto isto, outros, crêem que a educação esportiva está no cerne da sociedade moderna e seria impossível não atender a tais exigências. O assunto parece complicado à primeira vista, mas achamos que algumas reflexões podem nos conduzir a um porto seguro. Estaremos reproduzindo alguns ensinamentos que buscamos no livro de Jean Le Boulch, “A educação pelo movimento” em que trata sobre a psicocinética na idade escolar. Desenvolve breve discussão da pedagogia Freinet e de suas concepções sobre a utilização do movimento na formação a partir do enfoque de uma pedagogia do “ser global” que é a criança. Em outros instantes, igualmente, recorrendo a Vygotsky (Psicologia pedagógica) e, se necessário, a outros pedagogos.

Zonas de desenvolvimento proximal (Vygotsky)

Assim, em primeiro lugar precisamos entender como se comportam as crianças em determinadas idades, o que elas pensam, anseiam e como se exprimem diante da vida. E aqui o psicólogo russo nos esclarece sobre a dinâmica do desenvolvimento do aluno escolar ao afirmar: “A zona de desenvolvimento imediato da criança é a distância entre o nível de seu desenvolvimento atual, determinado com o auxílio de tarefas que a própria criança resolve com independência, e o nível de possível desenvolvimento, determinado com o auxílio de tarefas resolvidas sob a orientação de adultos e em colaboração com colegas mais inteligentes”. Em outras palavras, cada indivíduo tem o seu nível de desenvolvimento e cabe ao professor avaliar o quanto de ajuda ele precisa para passar a um estágio mais avançado. Essa ajuda pode vir do próprio professor ou de um colega mais experiente.

Em termos práticos, vivenciei essa experiência ao me aconselhar em estudos de matemática com um irmão mais adiantado e, logo em seguida eu mesmo ser o conselheiro de alguns colegas em classe. Foram momentos incríveis! E se podemos realizar na matemática, por que não em qualquer atividade humana? Cremos que aqui está a natureza de “como ensinar”. E, então, trata-se de o professor se esmerar em “aprender a ensinar”.

 (continua…)

O Sentido Pedagógico da Atitude (parte III)

Ilustração: Beto Pimentel.

 Como despertar a atenção e o interesse nas crianças

 (com base em A Educação pelo Movimento, J. Le Boulch)

“O sentido biológico da atitude se revela melhor quando se leva em conta as necessidades que lhe deram origem. Quanto mais complexo é o organismo tanto mais diversa e sutil é a forma das suas relações recíprocas com o meio, tanto mais elevadas são as formas que assumem o seu comportamento. E a principal complexidade que difere o comportamento dos animais superiores é a superposição da chamada experiência individual ou dos reflexos condicionados à experiência inata ou hereditária.

Na composição do comportamento do homem é difícil que 0,01% de todas as reações pertença ao número de reações inatas não afetadas por quaisquer influências individuais da experiência pessoal. O sentido biológico dessa superposição consiste na chamada adaptação prévia ou por sinais do organismo à ocorrência de acontecimentos que ainda não existem mais por determinados indícios devem forçosamente ocorrer. A forma por sinais ou prévia de adaptação a futuras mudanças do meio em suas modalidades superiores transforma-se em reações da atenção ou da atitude, ou seja, está relacionada por via reflexa a impulsos de reações que levam o organismo a um estado preparatório mais aperfeiçoado. Do ponto de vista psicológico a atitude pode ser definida como expectativa do futuro, como meio que permite ao organismo reagir com os movimentos adequados não no próprio momento da chegada do perigo, mas em sua aproximação distante, na luta do corpo pela sobrevivência.

Pode-se dizer que a atitude é a primeira condição graças à qual se cria a possibilidade para influenciar pedagogicamente a criança. Alguns pedagogos reduzem o processo da educação à elaboração de certas formas de atitude, por considerarem que toda educação é antes de tudo a educação da atenção e distinguirem as diferentes modalidades de educação apenas pela natureza daquelas atitudes que devem ser elaboradas. Assinalamos que no processo de educação não operamos com movimentos e atos, mas com a elaboração de habilidade e hábitos para uma futura ação sobre a realidade. Sendo assim, nossa tarefa não é provocar essas ou aquelas reações em si, mas apenas educar as devidas atitudes”.

Isto nada mais é do que propor à criança alguma tarefa e deixá-la livremente tatear na busca de soluções. Ao mestre, acompanhar este desenvolvimento e estar sempre próximo em sua assistência, sem jamais indicar-lhe as soluções.