Intercâmbio Lusófono

aquarela_papai reduzida e invertida horizontalmente
O autor em aquarela de seu filho Beto.

Convite à Participação

Aos amigos professores, treinadores, ou simplesmente interessados em dialogar para aprendermos juntos. Como muitos já disseram “Ensinar é uma Arte”, e como Arte não se ensina como proceder? Este artigo é voltado principalmente à participação de professoras e professores, especialmente aos lotados em escolas. Foi construído, inicialmente, com base em propostas e comentários no sítio português Sovolei, no qual sou um dos colaboradores com muita honra faz algum tempo.

Comentários & Fórum no Sovolei

Percebo que no Brasil as professoras declinam de se especializar em certas tarefas, p.ex., responsabilizarem-se pelo ensino do voleibol, basquete, futebol, handebol. E, inclusive, atêm-se somente ao setor feminino. Em colégios menores, há facilidades para a coeducação, pois as turmas são menores e não se justificariam dois professores. Então, “sem querer”, as aulas se desenvolvem com aspectos convenientes, ou seja, as meninas têm oportunidades similares aos meninos. Este é um crescimento e desenvolvimento social maior do que se imagina, mas infelizmente a direção pedagógica da escola não está preparada para enfrentar este desafio. E em Portugal, como se desenvolve essa atuação? Alguém poderia me esclarecer? Explico: vou pela segunda vez ao Colégio Paraíso, braço lusófono de Portugal no Brasil, para oferecer metodologia de ensino na Educação Física, especificamente no voleibol.

PNFT – O presente e o futuro

Comentário único de Roberto Pimentel publicado no Sovolei.

Em 10 de janeiro de 2006, em Lisboa, durante o Congresso do Desporto, o Sr. José Curado dissertou sobre a Reforma do Sistema Desportivo. Iniciou sua alocução com uma nota prévia que, em dado instante, expressou:  

Desejo que o Congresso, no seu espírito e nos seus vários momentos, não se deixe ‘enredar’ pelos ‘dramas’ e problemas da ‘velha ordem’ desportiva, uma vez que precisamos urgentemente de algo novo para nos preparar para um futuro melhor.

Quer me parecer que finalmente o futuro chegou para os treinadores portugueses. Parabéns a ele por sua clareza e excelente discernimento. Termina o seu discurso com um alerta aos treinadores portugueses:

Não há progresso significativo sem investigação. É preciso acabar com o clima de desconfiança há muito existentes entre os teóricos e os práticos, avançando para projectos de cooperação entre uma Academia verdadeiramente aberta à comunidade e a actividade desenvolvida pelos atletas e treinadores, contribuindo para a resolução dos problemas levantados por esta. 

“Tomara que agora seja bem compreendido. Parabéns ao Sovolei pela publicação tão  rica de ensinamentos e aos portugueses que a acatarem e colocarem em prática”.

Pensar dói! 

Parece que não estou só nessa cruzada. Nicholas Kristof, jornalista ganhador de dois prêmios Pulitzer, escreveu em uma coluna do New York Times, publicada em 15 de fevereiro: “Alguns dos pensadores mais inteligentes sobre questões domésticas ou ao redor do mundo são professores universitários, mas a maioria deles simplesmente não tem importância nos grandes debates de hoje”. O puxão de orelha veio de longe, mas a distância não reduz a pertinência, tampouco o efeito. O colunista explica que a opinião desses especialistas é frequentemente desconsiderada por ser “acadêmica”, o que em muitos ambientes equivale a uma acusação de irrelevância. O preconceito soma-se à conhecida pergunta, “o senhor trabalha ou só dá aulas?” e reflete o baixo prestígio das atividades de pesquisa e ensino na sociedade e o que Kristof denomina de anti-intelectualismo da vida americana. De fato, a ojeriza ou simples preguiça em relação à vida inteligente é um fenômeno também presente em muitas outras áreas do planeta. Nos tristes trópicos, grassa há tempos um verdadeiro culto do que é rasteiro, ligeiro, baixo e vulgar. O fenômeno afeta as falas, as letras, as telas e as paisagens. Está presente nas atitudes e comportamentos.

Afinal… “Você trabalha ou dá aula“?

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Contributo do Procrie a… PROFESSORAS

Em especial àquelas lotadas em Escolas, e com pouca experiência (ou nenhuma) em Voleibol. VOCÊ será capaz de realizar EXCELENTES aulas com seus alunos. E mais ainda, não só de Voleibol, mas de qualquer outro esporte. Lembrem-se, aprender a jogar e participar dele faz parte da Educação. Não é necessário descobrir talentos ou formar equipes para competições. O maior valor consiste em estimular o prazer pelas brincadeiras e que se divirtam a valer. Compartilhemos o conhecimento e as informações em favor de melhor ensino para os miúdos. SIGAM-NOS no Procrie e vejam nossas PROPOSTAS!

Busca de soluções

Vejam o comentário oportuno colhido no Sovolei, Facebook em 13 do corrente, relativo a um dos jogos do campeonato português feminino: 

Jorge Luz – Que jogão? Lá equilibrado foi, mas de jogão não teve nada. Infelizmente lá se foram os grandes anos do voleibol feminino português. O jogo foi equilibrado, mas pelo nível de baixo. Tenho muita pena que o nosso voleibol tenha perdido tanta qualidade.

Servindo-nos de um princípio de G. Pólya, muito oportuno para o momento: “Quando você não consegue resolver um problema, crie outro mais fácil que possa resolver.”

A partir dele, então, propomos construir uma linha de pesquisa que nos conduza às possíveis soluções, cuidando que cada caso é um caso. Mas se pudermos traçar um encadeamento consistente, cremos caminharmos com princípios pedagógicos. Pesquisemos, então!

Proposições referentes ao “Aprender a Ensinar”

Aos amigos professores, treinadores, ou simplesmente interessados em dialogar para aprendermos juntos. Como muitos já disseram Ensinar é uma Arte, e como Arte não se ensina como proceder? Temos grande interesse em dialogar com professores e professoras lotadas em escolas, além de treinadores que trabalham em clubes competitivos ou simplesmente de lazer. Explicamos: produzimos pesquisas a respeito no Brasil e há muito buscamos nos aculturar com as coisas, inclusive de outros países. Assim, enriquecemos nosso saber e a produção de artigos mais eficientes para a melhoria do Ensino. Esta a proposta do Procrie. Evidentemente, sem a SUA ajuda não teremos oportunidade de Aprender a Ensinar, uma vez que nos falta o convívio. Que sejam VOCÊS os nossos MESTRES na empreitada.

O que se pode depreender da afirmação do Senhor Jorge Luz?

  1. O voleibol feminino já não tem mais qualidade.
  2. As equipes a que se refere têm pouca técnica.
  3. Há desesperança quanto ao futuro.

Por que o voleibol feminino teria perdido tanta qualidade?

  1.  As meninas estariam desinteressadas pelo vólei?
  2. São orientadas somente por professoras?
  3. Má Formação/Iniciação em clubes e escolas?
  4. Existe um Programa de Formação? Quem e quantos participam na sua execução?

Ocorrem idênticas observações no setor masculino?

  1. Os meninos são mais interessados pelo vólei?
  2. Os meninos têm boa Formação/Iniciação em clubes e escolas?
  3. São orientados exclusivamente por professores (homens)?
  4. A que se propõe o Gira-Volei? Seria suficiente?

Que forças atraem/repelem o interesse pelo vólei?

  1. Os métodos e pedagogia aplicados em escolas e clubes?
  2. A exclusão por não fazer parte de algum time?
  3. O sentido de “competição” predominando sobre o “lazer”?
  4. Outras…

COMPARTILHESEUS comentários são deveras importantes para todos NÓS!

Importância de um Bom Ensino (I)

A liberdade de não aprender e o ato de ter ideias maravilhosas

Penso que a inteligência não pode desenvolver-se sem conteúdo. Fazer novas ligações depende de saber o suficiente sobre algo em primeiro lugar para ser capaz de pensar em outras coisas para fazer, em outras perguntas a formular que exigem as ligações mais complexas a fim de compreender tudo isso. Quanto mais ideias uma pessoa já tem à sua disposição, mais novas ideias ocorrem, e mais ela pode coordenar para construir esquemas ainda mais complicados”. (Eleanor Duckworth, The Having of Wonderful Ideas, 1972)

Esse texto ocorreu-me a partir da leitura da entrevista do treinador e Professor de Educação Física português, Arlindo Miranda, sob o título “A Nossa Missão” vinculada em www.sovolei.com/Zona7 em abril de 2010. A ele peço perdão por minha intromissão.

Motivação e interesse

O que o professor ensina nunca é melhor do que o professor é. Ensinar depende da personalidade do professor – existem tantos métodos bons como existem professores bons. É sabido por todos os maus professores como não interessar o aluno por qualquer atividade física. E o que faz, então, um bom professor para atrair e manter as crianças em qualquer atividade? Será que ensinar é ensinável? Ensinar é uma arte e uma arte é ensinável? Existe alguma coisa que se possa denominar de métodos de ensino?

Como despertar o interesse?

Esta me parece uma excelente indagação para incrementarmos um processo de aprendizagem. O desenvolvimento de uma teoria eficaz do “ponto onde o aprendiz está” e a construção de uma “psicologia do assunto” que seja operável representam desafios formidáveis: “Qual o próximo passo a dar” aparenta ser uma exigência impossível. Para uma aprendizagem eficiente, o aluno deverá estar interessado nos conteúdos a aprender e sentir prazer nesta atividade. Você saberia como fazer para despertar e manter esse interesse?

A arte de ensinar

Na formação esportiva, onde o ajustamento motor é dominante (ou indispensável), é grande o risco em proceder por adestramento para parecer ganhar tempo ou simplesmente por dificuldade de utilizar outra modalidade de aprendizagem. Tenho adotado algo como a interação, a negociação e a construção conjunta de vivências, que habilitem a criança (e adultos) a aprender a linguagem proposta. Para tal há sempre uma exigência de um elemento de interdependência e a capacidade de fazer descobertas acidentais. Hoje, tenho certeza que caminhei sempre por intuição nesse sentido especialmente quando me recordo das atividades motoras a que era chamado a participar nas brincadeiras de rua, tais como subir em árvores, lançar pedras, nadar e pescar (de mergulho), andar de bicicleta, jogar xadrez, pular carniça e uma gama variada de desportos aprendidos em terrenos baldios. Por isto, quando me iniciei propriamente dito no voleibol aos 18 anos, tive um aprendizado acelerado, derrubando mitos: “Quem não aprendeu antes, não aprende mais”. Todas aquelas vivências se somaram às novas atividades, com independência e descobertas acidentais, pois não foi tão necessário alguém dizer-me o que fazer ou como criar algo. Por exemplo, que melhor exercício existe para aprender a antecipar-se do que o jogo de xadrez, que aprendi a jogar aos 8-9 anos?

Profissionalismo vs. amadorismo

Inicialmente, as motivações dos personagens – atleta e treinador – que compõem o mundo do voleibol são distintas. Além disso, mais à frente, no alto nível, surge o inevitável “dirigente” com suas aspirações de poder e vaidades, e o “patrocinador”, com seus interesses mercantilistas.

Motivações do treinador  – Na prática, e podemos também deduzir das declarações de alguns treinadores, elas nos remetem sempre ao relacionamento com os atletas (ou futuros atletas). Isto pode ser observado quando se prospecta e acentua o potencial atual e o possível rendimento atlético do indivíduo. Neste momento, estão desprezados quase sempre os aspectos sócio-emocionais. Ou então, quando nos damos conta que num dado instante qualquer peça (indivíduo) pode ser trocada por outra em melhor estado, isto é, que apresente melhor rendimento. O que está em jogo sempre é a competência do treinador em constituir um grupo (equipe) vencedor. Sua motivação é a conquista, ser um campeão, tornar-se celebridade, ter o reconhecimento dos outros, e, certamente, afirmar-se profissionalmente com um ótimo salário. Quiçá, ser o treinador nacional, o ápice da carreira e de sua realização. Por isto o treinador ”da vez”, o que está em evidência mundialmente, torna-se referência. Atualmente, reproduzem-se citações encontradas em livro do Bernardo Rezende: “Perfeito: golpe forte, bola dentro, quase na linha (15-13). Éramos Campeões do Mundo”. E outras tantas formas ufanistas, em claro desabafo de endomarketing.

O jovem e suas motivações

Antes de ingressar nos treinamentos o indivíduo deve aconselhar-se primeiramente com seus pais/responsáveis, ou mesmo com um bom professor, de modo a que possa se balizar nas escolhas que terá pela frente em sua vida. Neste momento, ensinar a pensar é uma tarefa primacial. Por outro lado, se na sua fase infantil teve influência dos adultos pela forma com que se relacionavam com elas – autônoma ou heterônoma – essas formas se pronunciarão mais cedo ou mais tarde na vida adulta influenciando sua tomada de decisão e comportamento. Daí a responsabilidade dos adultos que lidam com crianças e adolescentes compreenderem e imaginarem o que a criança está pensando, pois se trata do aspecto mais desafiador de qualquer tipo de ensino. Nem sempre é possível saber, naturalmente, mas a observação cuidadosa e criteriosa pode levar o professor a educar seu poder de avaliação. Destaque neste processo para a teoria vigotskiana das “zonas de desenvolvimento proximal”.

Na prática, os clubes quase sempre têm suas divisões inferiores, obrigatórias em muitos lugares, favorecendo uma possível renovação e prospecção de talentos. Entretanto, daí decorre uma competição desenfreada entre os próprios atletas na escala de acesso às categorias superiores e uma consequente evasão de indivíduos não aproveitados nos escalões superiores. Aos mais renitentes resta a tentativa de “duelar” em outras agremiações numa tentativa desesperada de manter-se no ramo competitivo. De uma forma ou de outra, haverá sempre uma permanente substituição de peças nos escalões inferiores. Entre os adultos esta alternância é um pouco mais demorada exatamente pelo reduzido número de atletas em condições técnicas para substituí-los. Ao jovem não aproveitado resta retornar aos estudos e à vida tornando-se um praticante eventual do desporto. A motivação para se iniciar numa nova tarefa se manifesta por diversos fatores. Particularmente imagino que desde o imponderável, à pressão familiar. É evidente que o professor de Educação Física na escola funciona muitas vezes como fiel da balança: tanto pode ser o facilitador como o detonador de aspirações. Aliás, como qualquer outro das demais matérias. O jovem pode aspirar ser um grande jogador de voleibol ou de qualquer outra modalidade. Entretanto, nesse percurso há uma série de obstáculos a serem vencidos que, às vezes, independem de sua vontade, constituindo-se o maior deles a habilidade natural mínima para determinados movimentos. Ocorre que até certa idade pode valer-se de outros recursos que compensem, mas, na fase adulta, a competição torna-se mais restrita e, provavelmente, sucumbirá diante de um outro mais bem dotado nesta arte.

Componente psicológica

Invariavelmente, não se pode fugir à assertiva sobre as componentes que compõem o universo dos desportos: a técnica, a tática e fatores sócio-emocionais (ou psicológicos). Muito embora todas sejam expressivas no cômputo geral, há certa relevância na última delas, uma vez que a técnica e a tática são expressões basicamente relativas à forma de se exercitar, de adestramento, e, portanto, passíveis de serem copiadas e imitadas por todos, havendo ligeiras diferenças quanto à habilidade individual inata. É o que leva alguns entendidos a dizerem que uma equipe de ponta depende em muito da “safra”, isto é, do tempo em que se aglutinam indivíduos da alta qualidade técnica.  Nas competições de “ponta”, ou mesmo nos embates entre equipes do mesmo nível, o que pode fazer grande diferença é a componente emocional, especialmente dos seus treinadores. Já se dizia que para conhecer uma equipe basta conhecer-lhe o técnico. Ao contrário do que muitos afirmam, não é necessário estarmos numa final olímpica, ou mesmo de um mundial, para encontrarmos uma situação de tensão psíquica extrema. A equipe brasileira feminina passou por essa experiência no jogo contra a Rússia quando disputavam a medalha de bronze numa Olimpíada. Em fato anterior, em Barcelona (1992), os rapazes brasileiros levaram de vencida a equipe holandesa na final, sagrando-se campeões: não tínhamos qualquer responsabilidade de ganhar aquele jogo, enquanto que a Holanda, até mesmo por ter derrotado a temível Itália, tornou-se favorita ao troféu maior. Costumo dizer, sem menosprezo à conquista, que “ganhamos sem querer”, pois tenho consciência de como a equipe foi preparada e o que se esperava dela. Inclusive, os tempos pós-medalha viriam confirmar essa assertiva. Existe ainda uma consideração psicológica referente à participação brasileira em Olimpíadas que nos remete ao ano de 1984, em Los Angeles (EUA), quando nos sagramos vice-campeões. Sobre este episódio recorro à opinião de um especialista, o Dr. Victor Matsudo, à época diretor-geral do vanguardista Laboratório de Aptidão Física de São Caetano do Sul, em São Paulo, e assessor internacional do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte. Ele foi um dos 2.400 cientistas, médicos, psicólogos e pesquisadores de 140 países a participar do Congresso Olímpico de Los Angeles. Voltarei a falar deste assunto logo a seguir. Aguardem.

Final de jogo x final olímpica

(…) “Perfeito: golpe forte, bola dentro, quase na linha (15-13). Éramos Campeões do Mundo”; (…) “Os últimos 3 pontos foram dele”. Não me parece ter coerência com (…)”Giovane, entra e não perde o saque, pelo amor de Deus”. Todavia, deixemos de lado a coerência dos fatos e o apelo divino para examinarmos outro aspecto mais importante.

Recordo-me de fatos que envolvem a “entrada em jogo” de um atleta pelo saque, isto é, do banco de reservas para a realização imediata do serviço. Como técnico e como atleta já passei por esta experiência, felizmente também com sucesso. Claro que a tensão de uma final mundial (ou olímpica) traz uma carga emocional muito mais forte para ambos, treinador e atleta. Todavia, tentem considerar racionalmente ambos os fatos, não considerados os “aspectos exteriores”, isto é, simplesmente um jogo entre duas equipes. Concluiremos que é um fato corriqueiro no voleibol, tratando-se de mais uma estratégia de jogo. Os novatos na profissão logo se apercebem disto e, na medida do possível, usam com proficiência. O que difere preponderantemente são as circunstâncias, o quadro emocional que envolve a todos, inclusive os assistentes presentes e distantes (TV). E, claro, principalmente aos protagonistas. Do folclore criado pelos envolvidos – cada um percebe a realidade do seu jeito – pode-se tirar proveito e adquirirmos ensinamentos das lições concedidas. Creio ser muito difícil aos vitoriosos aprenderem algo; é tarefa para os derrotados, e aqui está a primeira lição de vida, muito evidenciada pelos japoneses: A importância dos erros não deve ser negligenciada, visto que um erro corrigido é frequentemente mais instrutivo que um sucesso imediato. Tive paciência em ouvir em duas oportunidades o relato do Giovane, ambas em Florianópolis (SC). As palestras foram complementadas por um vídeo muito bem produzido sobre o atleta.

Estratégia do saque

(…) “Vai lá e saca na linha; esclareço que não sou um estrategista tão poderoso”.

O Bernardo é um dos melhores estrategistas em ação, confirmado pelos resultados que vem obtendo em sua carreira de treinador, tanto em equipes femininas, quanto masculinas. Inclusive tem a fama de só “falar naquilo” (o vôlei). Quanto à estratégia de saque, quando criança – categorias mirim ou infantil – teve seu aprendizado no Fluminense F. C. (Rio de Janeiro) com o saudoso Benedito Silva, o querido Bené. Este atuara como levantador nas décadas de 40 e 50 e era o maior especialista em saques por baixo. Tornou-se técnico e passou para seus pupilos a arte de aproveitar a técnica do saque para proveito da equipe. Enquanto a maioria dos atletas punha a bola em jogo, alguns dos seus conseguiam levar o caos aos adversários. Eu, por exemplo, fui um deles, ainda que só tenha me iniciado aos 18 anos de idade. Recordo-me de treinos da seleção brasileira na Escola Naval, Rio, com vistas ao Mundial da Rússia em 1962. Num dos treinos coletivo, ao encaminhar-me para o saque imaginei o que poderia realizar sacando por baixo, pois conhecia a todos e suas deficiências na recepção. E, ainda, o desafio seria maior, pois estaria sacando contra a equipe titular. “Foram quatro pontos seguidos e um desastre para todos, inclusive provocou a intervenção abrupta do treinador (Sami) para as considerações raivosas do tipo: Como não conseguem passar a bola de um saque por baixo”? Esclareço aos mais novos que na época nenhum adulto, muito menos naquele nível, sacava daquele modo: todos usavam o tipo tênis, pois não queriam passar por retrógrados (e também porque não sabiam fazê-lo). Quando ainda dirigia a seleção feminina, víamos pela TV as imagens do Bernardo sentado no banco a orientar a sacadora quanto ao local da quadra adversária a ser atingido: exibia para ela uma plaqueta com o número correspondente à zona desejada por ele. As moças sacavam o tipo tênis nessa época. Ao passar a treinar a seleção masculina não usou tal recurso. Penso que deveria, pois à exceção de 2-3 atletas, os demais colocavam a bola em jogo e, acreditem, quase sempre sobre o líbero adversário, em princípio o melhor passador. Poder-se-ia alegar que não havia tempo durante os treinos para mudar a característica do jogador ou coisas do gênero. Dessa maneira, imagino que tanto em jogos no alto nível como em qualquer outra divisão ou competição, a atitude do treinador é capital: ele sabe (ou deveria saber) do que é capaz cada um de seus atletas e a responsabilidade que passa a eles. O dilema do treinador passa a ser: “Deixo o jogador decidir”? Ou, ao contrário, “Decido por ele”? Ou, então, “Não erre; ponha a bola em jogo”.

Vejam o texto a seguir, um ensaio sobre a obra piagetiana que trata da formação e o comportamento psicológico dos indivíduos desde a sua infância e a sua influência na fase adulta.

Comportamento psicológico

Como poderíamos caracterizar o comportamento psicológico nas equipes de alto nível do voleibol? Os indivíduos se comportariam como os novatos na aprendizagem guardadas as devidas proporções? Não seria possível atribuir-lhes a real importância desde os primeiros ensaios desportivos?

Para falarmos desse assunto faço um breve preâmbulo para entendermos a diferença entre autonomia e heteronomia. Heteronomia é definida como sendo governado por outros, enquanto autonomia significa ser governado por si mesmo. A moralidade da heteronomia é caracterizada por obediência e conformismo às regras externas e/ou aos desejos de outros, enquanto que a moralidade da autonomia é caracterizada pela convicção pessoal sobre valores e regras que são construídos por nós mesmos. Exemplificando: o aluno heterônomo obedece ao professor sem medo de punição ou desejo de ser recompensado de alguma forma. Quando o aluno mais autônomo obedece, não é por mera obediência, mas por uma disposição de cooperar com uma solicitação que ele considere razoável e sensível. Quando não vê qualquer razão para obedecer, o aluno mais autônomo resiste e pergunta: “Por que eu tenho que fazer isso?” Este é também um pensamento crítico, bastante cultuado pelos judeus.

Ensino crítico

“Os judeus são ensinados a reverenciar a rebeldia intelectual – rebeldia sintetizada em Abraão, ao destruir os deuses e inaugurar o monoteísmo. Nada mais é do que os educadores chamam de ensino crítico; contestar sempre as verdades estabelecidas, princípio básico da pedagogia moderna. É um treinamento decisivo para quem deseja mais do que reproduzir, mas inventar. O bom educador deve ensinar a seus alunos a olhar sempre com uma ponta de desconfiança aquilo em que todos acreditam e dar uma ponta de crédito a ideias ou projetos que todos desmerecem. Ninguém inventa nada se for servil ao conhecimento passado”. Na medida em que o adulto encoraja a criança a pensar por si mesma, suas possibilidades de tornar-se autônoma (“crescer”) são intensificadas na mesma proporção. Para mim, autonomia é o objetivo primeiro porque não pode haver autonomia moral sem autonomia intelectual, e vice-versa. Se a criança pequena aprende constantemente regras morais preestabelecidas e não lhe é permitido questionar o adulto, suas experiências não lhe proporcionarão oportunidades suficientes para desenvolver uma atitude de avaliação crítica do que o adulto lhe diz. A repressão sobre o comportamento moral, portanto, é uma repressão sobre o desenvolvimento intelectual. Concluindo, a moralidade também é construída por cada indivíduo de “dentro para fora”.

Uma decisão histórica – No dia 2.5.2010, na decisão do campeonato paulista de futebol, jogavam as equipes do Santos e do Santo André. Disputa muito acalorada que resultou na expulsão de três atletas do Santos e um do Santo André. Contudo, a categoria e habilidade de um atleta santista de 21 anos de idade foi o destaque nos últimos momentos, o que redundou na conquista do campeonato. E ele foi além. Faltando ainda alguns minutos para o término do jogo, o técnico do Santos resolveu realizar uma substituição e indicou-o para sair. Qual não foi a surpresa de todos: o jogador gritou que não sairia, indicou sua resolução por gestos, e não coube outra atitude ao treinador senão a de designar um outro atleta. O que acham da decisão do jogador?  

Objetivos sócio-emocionais e cognitivos – Cognição e emoção, na realidade, uma não existe sem a outra. Quer um exemplo? Observe-se o bloqueio emocional que a maioria dos adultos tem hoje com relação à Matemática. É o resultado de se forçar um conhecimento indigesto, preestabelecido, pela garganta abaixo do estudante; quando este tem um bloqueio emocional sobre alguma coisa, o resto da aprendizagem cessa. Essa visão indissociável entre emoção e cognição pode ser confirmada pela observação de cada professor. O interesse das crianças na aprendizagem é adversamente afetado por sentimentos como insegurança, frustração, raiva e medo. As dificuldades sócio-emocionais perseguem todas as crianças de tempos em tempos, e o professor nessas ocasiões deve preocupar-se primeiro com esses problemas. Conclui-se que se as crianças propõem ideias, problemas e questões sobre conteúdo específico, e se elas colocam em relação objetos e acontecimentos as operações estão destinadas a se desenvolver.

Conclusão

No voleibol competitivo há um afunilamento natural nos praticantes, pois nem todos que se iniciam nas categorias de base chegarão à idade adulta para prover as equipes principais. O limite de atletas por equipe (12 a 15) é o principal fator limitante. Como consequência, somente os mais aptos tecnicamente ascenderão para as divisões imediatamente superiores. Os não aproveitados, então, são dispensados peremptoriamente e o único caminho para continuarem atuando seria buscar seu lugar em outra agremiação, agora competindo com outros indivíduos que, a critério do treinador, terão o seu destino selado. Ou, ainda, praticar o esporte por lazer.

Ensinar é uma Arte

Visita da seleção feminina de vôlei, praia de Copacabana, 1995. Foto: Roberto Pimentel, Bené, Bernardo e Ricardo Tabach. Encantado, o técnico adquiriu o equipamento para o Rexona.

Este blog está colocado à sua disposição para trocarmos ideias. Minha intenção é compartilhar conhecimento e experiências com todos aqueles que se interessam pelo ensino dos desportos, especialmente o voleibol. Se necessitar indagar algo, tirar alguma dúvida ou mostrar suas atividades manifeste-se, entre em contato.

A divulgação da interpretação de fatos que vivenciei ao longo dos anos será tratada à luz da psicologia pedagógica e compartilhada com todos. Nesta ação espero diagnosticar as necessidades de cada aprendiz – professor ou aluno – e como atendê-las depois de descobertas. Em alguns momentos de reflexão fico a pensar se tais exigências podem ser consideradas realizáveis quando um único adulto tem a obrigação de atingir metas a serviço de vinte, trinta e, até mesmo milhares de crianças.

A ideia inicial recaiu após minha leitura do trabalho de alguns estudantes portugueses sobre G. Pólya. Ele nos leva a pensar no significado de certos conceitos e nos convida a ilustrá-los concretamente com base na nossa própria história. Como você neste momento também participa desta conversa, aguardarei sua opinião e assim, juntos, passarmos a compartilhar novos conhecimentos em auxílio à “arte de ensinar”.

George Pólya (1887-1985) foi um matemático húngaro. Não é sempre que um grande matemático se interessa pelos currículos e pelos métodos de ensino da matemática no ensino secundário. A esse respeito, Pólya é quase uma exceção. Daí o interesse das traduções de dois célebres textos sobre o ensino da matemática: How to solve it (1945) – em que nos diz como resolver problemas de todos os tipos, mesmo os que não são de matemática – e o capítulo XIV do livro Mathematical Discovery (1962-64). As traduções foram realizadas por Elisa Mosquito, Ricardo Incácio, Teresa Ferreira e Sara Cravo. A revisão, por Olga Pombo. Peço permissão aos pesquisadores portugueses que me proporcionaram conhecer parte do pensamento de Pólya para estabelecer um pretenso diálogo construtivo com professores brasileiros a respeito do ensino do desporto em geral e a prática escolar. Àqueles que me honram com a sua leitura, minhas desculpas por estar falando na primeira pessoa, a intenção é relatar experiências e, em contrapartida, “ouvir” o que têm a me contar.

Educar é contar histórias?

Nas páginas que se seguem realizo uma digressão pedagógica aplicável a qualquer desporto, especialmente o voleibol, minha praia. Para os que julgarem pertinente, sirva este diálogo com Pólya (e outros mestres) de transposição para um ensino mais eficiente, original e criativo. Assim, considerem essas histórias apenas e acerca da minha experiência e opinião. Estarei aguardando suas considerações.