Memória e História

Foto: Fivb/Divulgação.

Valor da História… quando a história de um se soma a de tantos outros!

Uma notícia no site do Terra despertou-me a atenção para o tema à epigrafe. A reportagem tinha como título “Octacampeão sul-americano, Giba lembra primeira edição” e a foto reproduzida ao lado.

Recordo-me ter estado com o Giba – foi a primeira vez que nos falamos – em um jantar no salão do Hotel Evereste, em Ipanema, Rio, onde estava hospedada a delegação nacional. Era véspera dos jogos contra a Polônia pela Liga Mundial deste ano. Na ocasião apresentei ao Bernardo e a ele, Giba, um dos exemplares do livro que compus, “História do Voleibol no Brasil”. De ambos colhi palavras elogiosas e de incentivo e mais não poderia esperar, uma vez que o momento não comportava análises mais detalhadas. Como se diz, “dei o meu recado” e, agora, mais gente já sabe que o voleibol no Brasil transcende 1984, 1964 e recua pelo menos até 1939, por coincidência, o ano em que nasci. Estaria eu predestinado a escrever tais histórias? Devo confessar que quando adolescente, tive brigas com as professoras de História, pois não encontrava sentido prático no seu ensino.

Da reportagem, saliento o tópico que motivou tal crônica: “Capitão da Seleção Brasileira, o ponta Giba nem sempre teve tanta moral no time nacional. Em 1995, ele era apenas um jovem ao lado de ídolos como Marcelo Negrão, Giovane, Maurício, Tande, Carlão e Nalbert na disputa de seu primeiro Campeonato Sul-Americano. Nesta segunda-feira, aos 34 anos, ele começa a sua nona participação no torneio, em Cuiabá, já com oito títulos na bagagem. E diz ele: Ainda me lembro do primeiro, novinho, com 18 anos, jogando ao lado de grandes ídolos da geração de 92. Foi especial. Com certeza nunca vou esquecer deste Sul-americano. Lembro tudo, as pessoas, o ginásio em Porto Alegre, foi tudo muito bom”, declarou. Giba foi campeão no Rio Grande do Sul, da mesma forma como foi em 1997, na Venezuela, e a cada dois anos, na Argentina, Colômbia, Rio de Janeiro, Lages, Chile e novamente em solo colombiano. Nesse tempo todo, a forma como encaramos o Sul-Americano muda um pouco. No primeiro, lembro que era uma ansiedade enorme por estar ao lado dos meus ídolos e, com o nome já feito, depois de tantos anos, é natural que isso mude”.

Giba e Roberto Pimentel conversam sobre a História do Voleibol.

Decorridos muitos anos, revejo minha posição ao ter concluído duas obras de caráter histórico. A primeira, editada em 2008, conta como era a “Villa Pereira Carneiro”, seus costumes e detalhes das numerosas famílias da primeira metade do século passado. Foi ali que nasci e iniciei-me em vários esportes. Narro, inclusive, meu primeiro encontro com o Bené, que já realizava treinos aos sábados numa pequena quadra improvisada. E, já agora, esta verdadeira obra em dois volumes sobre a História do Voleibol no Brasil,  com pouco mais de mil páginas, fartamente ilustrada com fotos. Arlindo Lopes Correa, que me brindou com a sua apresentação, adjetiva a obra como enciclopédica e memorialista.

Por que teria eu mudado o meu modo de pensar a História?  Qual a relação entre História e Memória? Possivelmente o alcance da História seja muito superior ao da Memória. Por isto, quase sempre tenhamos todos a pretensão de construir nossa própria história através da memória e concluirmos que é a verdadeira. Ocorre que à história de cada um acrescentam-se muitas outras, e aí vamos unindo os retalhos, os fragmentos e compondo a História. Para entender um pouco mais fui buscar subsídios no historiador italiano Carlo Ginzburg, que transcrevo a seguir, e deixo a critério de cada um se devem se aprofundar no assunto. Enquanto isto estarei tentando fazer um elo entre passado e futuro, entre o indivíduo e o seu grupo social.

História, memória da humanidade?

Existe uma tendência entre confundir memória com história. Todas as sociedades possuem uma forma de relação com o passado e, por sua vez, possuem suas regras e técnicas. E estas precisam ser colocadas à prova de quando em quando para que se possa sempre distinguir o verdadeiro do falso. Esta é uma conquista da qual não devemos abrir mão. Um dos desafios da história é acertar sua relação com a literatura? A relação entre ambas é muito próxima. Os historiadores também são contadores de histórias, mas tentam contar histórias verdadeiras. É a relação entre o verdadeiro e o falso.

  • A escrita serve como suporte para a memória coletiva. O que fazer, quando a memória erra, confundindo pensamentos e gerando a contradição?
  • Na memória podem ser insinuados erros e o mesmo pode acontecer na história. É importante procurar corrigir esses erros, mas é importante também entender por que eles ocorrem. É preciso aprender a decifrar o erro e a verdade mais profunda que pode estar por trás desse erro.

Em que ponto podemos dizer que uma afirmação histórica está refutada? E o que significa dizer que algo está historicamente provado? Qualquer afirmação sobre a realidade histórica – mesmo a que diz que Napoleão Bonaparte existiu – vale até que alguém prove o contrário. Se aquelas afirmações não fossem sujeitas a falsificações (em linha de princípio teórico), seriam dogmas. Como considerar hoje essa ambição de retratar os indivíduos esquecidos pela história? Hoje eu insistiria ainda mais no estudo da relação entre o indivíduo e o grupo social ao qual ele pertence; uma relação que deve ser explorada concretamente na medida em que os documentos assim o permitem. Por que história é tão aborrecida? O questionamento continua com a lembrança de uma afirmação de Henry James, datada do fim do século XIX: “Representar e ilustrar o passado, as ações do homem são tarefas tanto de historiador como do romancista; a única diferença que posso ver é totalmente favorável a esse último (à proporção, é claro, do seu êxito) e consiste na maior dificuldade que ele encontra para reunir as provas que estão longe de ser puramente literárias”.  O melhor caminho seria unir com ponderação provas e possibilidades, erudição e imaginação.

Animou-me o desejo de retratar os indivíduos esquecidos pela história e o seu grupo social. Nessas histórias que a própria vida me contou sobressai uma relação que deve ser explorada na medida em que os documentos e relatos assim o permitam. Parece-me que o melhor caminho seria unir com ponderação provas e possibilidades, além é claro, de imaginação. Por fim, hoje vejo que encontrei resposta à indagação: “Por que estudar História”? Esclareço que não sou escritor e muito menos historiador. Apenas conto histórias…

Recomendo de forma carinhosa aos internautas e, particularmente ao Giba, retribuindo a gentileza que prestou à minha neta (foto), que façam uma visita neste Procrie à Categoria de História do Voleibol – “Primeira Participação Internacional”, “Origem do Voleibol na América do Sul”, “Intercâmbio na América do Sul” –  e percebam como teve início esse intercâmbio e os campeonatos sul-americanos. Não é muito, mas foi o que pude apurar para deixar registrado na memória e na história. Tomara que a CBV leve avante o projeto de criação de um Museu do Voleibol, a exemplo de alguns outros países.

Giba conduz a menina nos seus primeiros passos. Brasil e Coreia, 2010.

No futuro a menina da foto, então com 4 anos de idade, haverá de se lembrar desse momento. Assim, presto uma homenagem aos novos e aos antigos atletas que construíram o voleibol brasileiro, medalhistas ou não.

2 comentários em “Memória e História

    1. Olá Luís, estou honrado e encantado. Este gesto demonstra a importância da conectividade para a Educação das pessoas. É o que podemos qualificar como um verdadeiro intercâmbio cultural. Todos vocês me enriquecem mais do que lhes possa dar. Continuarei a me esforçar para agradá-los a todos.

      Curtir

Deixe um comentário