Aspectos Legais – I

Erro de Direito e Erro de Fato – I

Assunto palpitante há algum tempo, as análises e julgamentos a respeito do que seria erro de direito e erro de fato nunca foram suficientemente explicadas. Mesmo para treinadores e atletas mais esclarecidos o assunto era deixado de lado, cabendo tão somente ao Departamento Jurídico do filiado se pronunciar a respeito. Tão logo fosse julgada a questão, seria fato passado. Todavia, conforme o Relator que expôs o Acórdão a seguir, presume-se que o árbitro de uma partida desportiva saiba discernir e interpretar a lei constante das Regras e Regulamentos. O caso que se apresenta ocorreu numa partida pelo campeonato da FMV entre dois filiados. Ocorre que por algum motivo o árbitro só deu início ao jogo após alguns minutos além do tempo regulamentar. Terminada a partida, a equipe perdedora fez consignar na súmula protesto pela validade daquele resultado. O caso, então, foi encaminhado ao Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Metropolitana de Volley-Ball (FMV) que, em reunião de 11 de maio de 1960, analisou e julgou matéria analisada no Processo nº 12, em que o filiado América F. C. protestou contra a validade do jogo realizado em 27 de abril de 1960 com o Botafogo de Futebol e Regatas, 1ºs Quadros Femininos.

Em Nota Oficial nº 55, de 14/5/1960, a FMV dá conhecimento do resultado da decisão do Tribunal de Justiça.

Acórdão. Proc. Nº 12, de 1960.

Ementa: A realização de uma competição desportiva fora da hora regulamentar não constitui erro de direito, capaz de invalidá-la. O próprio erro de fato, para efeitos de direito penal, só é de ser tomado em consideração, como argumento, quando relevante. O hecho desnudo, como advertem os tratadistas, é sempre irrelevante, até mesmo para o Direito Penal Disciplinar, ou Desportivo.

Vistos etc.

Acórda, por maioria de votos, o Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Metropolitana de Volley-Ball em negar provimento ao recurso manifestado a fls., por falta de fundamento legal. Alega o Recorrente que o fato de um árbitro dar início a uma partida depois da hora regulamentar constitui erro de direito, que anula o resultado daquela, tal como se ela não tivesse sido realizada. Nada mais inexato em matéria de direito.

De erro de direito dá-nos perfeito exemplo, em acórdão memorável, o Supremo Tribunal Federal, através do voto proferido pelo saudoso Ministro Hermenegildo de Barros: – “Dá-se o erro de direito, por exemplo, quando a lei proíbe que um menor de 18 anos faça testamento e, apesar disto, o testamento é feito”. No caso dos autos, se se pudesse falar em erro de fato, tal erro, na verdade, seria até irrelevante. Nem, portanto, como erro de fato a matéria, para os fins previstos, poderia ser levada em consideração, dada a sua irrelevância evidente. Se se pudesse anular uma partida realizada simplesmente porque um árbitro determinou que ela se iniciasse fora do horário pré-estabelecido, então chegaríamos por via de consequência, a anular os julgamentos do Tribunal, todas as vezes que estes não fossem realizados no dia marcado. A lei, realmente, prevê que, com o pedido de vista de um processo, por um juiz, o julgamento se realizará na sessão imediata. Haveria, porventura, erro de direito se o tal julgamento não se efetuasse como manda a lei? Não se leve ao exagero a teoria do erro de direito. Há muita diferença entre ignorância da lei e má ou errônea interpretação da lei. No caso, ocorre até que o juiz tem o “arbítrio de apreciar outras causas” não previstas em lei, para a apreciação da possibilidade ou não da realização dos jogos. Houve no caso, um corriqueiro erro irrelevante, que NÃO PODE, DATA VENIA, TORNAR SEM EFEITO UMA PARTIDA REGULAR, COM RESULTADO REGULAR. Se o Recorrente saísse vitorioso do campo, alegaria ERRO DE DIREITO, para anular sua vitória? Parece-nos que não.

Erro de direito, para que se fixe uma noção norteadora, no campo desportivo, é, por exemplo, o seguinte: – Um jogador, dentro das regras do futebol, bate um penalte e consegue fazer o tento. Mas vem o juiz e o anula, porque o jogador chutou com o pé esquerdo. Aí está o erro de direito. O juiz desconhecia, por completo, a lei e anulou, por ignorância, um gol legítimo. Mas, quando o juiz não ignora a lei, mas APENAS A INTERPRETA, mal ou bem, não se pode falar em erro de direito, mas apenas, em erro de fato. E, no caso, esse fato seria até irrelevante. Mas é sabido que “un error com relevância para el derecho solo puede estribar en un hecho de transcendência jurídica”. “El error sobre los hechos desnudos es un error que juridicamente no tiene importancia alguna”. – sustenta Jimenez de Asua, com remissão a Savinghy, Franz Von Liszt e Binding.

Por estes motivos, negando provimento ao recurso, para proclamar a validade da partida impugnada, o Tribunal resolve ainda determinar que nova vista do processo seja aberta ao Dr. Auditor, face ao seu requerimento final, no parecer de fls.

Rio de Janeiro, 12 de maio de 1960.

a) SERRANO NEVES – Relator.

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